Capítulo 32: Navio Fantasma

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Enquanto cruzava o Mar Vermelho em direção ao norte, Elena Treagus não podia lembrar a razão de aquele mar ser chamado assim. Talvez nunca soubesse, ou melhor, nunca importara. Nunca imaginou que um dia iria chegar perto daquele mar, ainda mais em um barco fantasma.

Sim, era exatamente em que eles, Anúbis e Elena, navegavam naquele momento.

Um navio trazido do fundo do mar feito de madeiras podres cobertas de musgos e pilotado por vários esqueletos vestidos com vestígios de roupas que para ela pareciam ser de antigos navegadores romanos ou gregos, ela nunca soube dizer qual era qual. Os esqueletos tinham movimentos duros, como de marionetes. Andavam... Não, arrastavam-se de um lado para o outro levantando velas – panos compridos, sujos, rasgados e podres nos mastros semidestruídos. Outros "limpavam" o convés, levantavam a âncora, enfim, faziam todo o trabalho que era necessário em um navio a vela como aquele.

– Achei que você não podia ressuscitar pessoas que não foram mumificadas. – Ela disso ao deus da morte.

– E não posso. Não os ressuscitei, estou apenas controlando os seus corpos. Assim como o navio.

– Como assim controlando o navio?

– Eu tenho o poder de controlar qualquer coisa morta, ou seja, qualquer coisa que um dia foi viva. Como você sabe, a madeira é um ser vivo, apesar de muito limitado, mas ainda assim, vivo. E aquele barco é, entre aspas, "um ser morto". Então, posso controlá-lo a meu favor. – Ele explicou. – Vamos subir a bordo?

Elena relutou por um momento. Aquele barco fedia e não parecia nem um pouco navegável, mas teve que entrar. Não havia outra opção. Com nojo, ela subiu a rampa escorregadia.

– Por que temos que ir para Israel?

– Por que precisamos encontrar um dragão.

– Um dragão? Você quer mesmo que eu acredite que dragões existam?

– Existem sim. São apenas seis, mas existem. Eles são as únicas criaturas na Terra que podem entender Sr̥ṣṭi, a língua da criação.

– E esse dragão está em Israel? – Ela perguntou.

– Não. Na verdade,, eu não sei onde está nenhum dos dragões.

– Então por que Israel? E por que não podemos ir por terra?

– Por que apenas lá nós vamos conseguir achar algo que indique a localização de algum dragão. E não vamos por terra, porque seria óbvio aos nossos perseguidores que escolheríamos viajar desse modo, é mais rápido. Justamente por isso vamos de barco, para despistá-los.

– Você sabe que Israel é um país bem grande. Em que lugar nós temos que ir especificamente?

– Para um templo, é claro. Os sacerdotes sabem tudo sobre os dragões. Pelo menos, quando os hebreus foram escravos do Egito, o sacerdote costumava saber.

Enquanto o barco batia contra as ondas, Elena Treagus não conseguia tirar Leonard da cabeça. Não parava de pensar no reencontro dele com Lana, sua antiga namorada. Não sabia que tipo de mudanças isso poderia provocar nele, ou na relação deles, que provavelmente não existia mais. Não sabia o que o futuro lhe guardava ou onde sua jornada iria levá-la. Será que Leonard estava no fim do seu caminho? Ela esperava que sim, esperava tê-lo de volta. Era o que mais queria.

– Nos acharam. – Anúbis disse de repente, tirando-a dos seus devaneios.

Ela olhou para o céu, na direção de onde tinham vindo. Anúbis disse algo que ela não entendeu e os braços feitos de ossos saindo do antebraço dele saíram atacando o homem voador e o anjo. Eles desviaram com facilidade, porém Anúbis continuou atacando. O homem fez um movimento com os braços, e o mar se agitou, desequilibrando-os.

O momento de distração permitiu que o anjo pousasse no barco, Elena pensou rápido e usou o feitiço Bán kính antes que o anjo pudesse fazer algo, porém dessa vez o feitiço falhou e a descarga elétrica chegou a poucos centímetros de sua mão.

– O que? – Ela estranhou.

Percebeu que o anjo também estranhara.

– Onde está o seu poder, Elena?

– Como sabe meu nome? – Ela perguntou. – De onde me conhece?

Ela notou o anjo pensativo por um momento, como se decidisse qual seria a melhor resposta para ela.

– Eu estive no Colégio Católico Padre Andersen e também pertenci a Ordem dos Cavaleiros da Rosa Cruz.

****

Sephiroth, Aquele Que Está Entre o Bem e o Mal, tentou uma última vez fazer Melanie Craymer, agora deitada em sua mesa de alumínio de tortura, responder suas perguntas com magia, em vão. Havia algo novo nela, algo diferente, algo que a deixava imune à magia, ou melhor, a magia dele. Será que era um feitiço? Mas de quem? Quem, além dele mesmo, detinha conhecimento de magia o suficiente para um feitiço dessa magnitude? Não era Melanie, ela não podia usar outros tipos de magia além da Arte, e esse bloqueio era para todos os tipos de magia. Novaselik? Não, aquele velho não tinha condições de fazer magia, e Sephiroth não conseguiu pensar em nenhuma magia nórdica capaz daquele bloqueio. Um anjo? Não havia nenhum anjo na terra nem mesmo os Caídos e estes, mesmo que estivessem, não podiam usar magia celestial, apenas a Arte. E Melanie não sabia como ir ao Paraíso.

Então, quem?

– Você nunca vai saber. – Melanie retrucou aos pensamentos dele, para a surpresa de Sephiroth. – É algo que está além da sua compreensão.

– Eu sei de tudo sobre esse mundo! Sei todos os feitiços que foram criados em todos os lugares. Nunca me esqueço!

Ele levantou a faca a alguns centímetros do braço dela e, um movimento bruto, cravou a faca no bíceps. Melanie urrou de dor.

– Sabe... Eu não sou muito bom com torturas físicas, não sei os pontos certos. Mas o que importa? Qualquer lugar em que eu cortar você vai sangrar. – Informou-a. – Por que você quer ir ao Paraíso?

Du-te dracului. – Xingou-o em romeno.

Ele fez outro corte no braço dela, tão profundo quanto o primeiro.

– Como você sempre me encontra?

Chod' do riti. – Dessa vez em eslovaco.

Sephiroth levantou a faca novamente, porém antes que ele cravasse novamente a faca, ouviu barulho de passos do lado de fora.

– Do mesmo jeito que ele sempre me encontra. – Ela disse ofegante, mas com um sorriso sarcástico no rosto.

– Quem está lá... – Antes que ele pudesse terminar a frase, um cilindro preto cruzou a janela, quebrando o vidro.

Cinco segundos depois, a sala estava recheada com fumaça. Porém naquela cortina de fumaça havia uma propriedade especial: ela bloqueava a magia de qualquer um que a inalasse mesmo que apenas um pouco. O tempo para que a pessoa recuperasse seus poderes variava de pessoa para pessoa, era impossível dizer.

Sephiroth notou isso um pouco tarde demais. Seus braços estavam inúteis. Seu poder não estava maior do que o de um humano qualquer que não sabe usar magia.

Antes que pudesse fazer qualquer coisa, ele sentiu um soco impossivelmente forte, justamente por causa daquela fumaça. A não ser, é claro, que aquela força fosse genética e não mágica.

Do chão, através da fumaça espessa, viu um vulto soltando Melanie da mesa. O vulto tinha pelo menos dois metros e quinze de altura. Além de braços brutalmente fortes e costas largas.

Elenão pôde ver com clareza, mas soube que aquele vulto era um lobisomem.

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