35 - Aquele em que é seguro

4K 481 108
                                    

Meu cérebro leva alguns segundos para processar aonde estou e o que aconteceu, olho ao meu redor, a aeronave ainda está no ar, ainda estou aqui. Olho para meu lado e lá está ela, linda e perfeita com seus olhos fechados, suas bochechas levemente coradas, sem maquiagem alguma, denunciando suas sardas sob os olhos.

Não tinha notado ainda que meu rosto já estava úmido quando sinto lágrimas quentes escorrerem sem controle, da mesma forma descontrolada, eu me atiro nela, que acorda assustada.

– Bec – Ela diz ainda recobrando a consciência.

Meus braços estão presos firmemente ao redor de seu pescoço, escondo meu rosto sob seus cabelos sentindo seu cheiro ali. Ela me abraça de volta ainda tentando entender o que aconteceu.

– Por está chorando? – Freen questiona alisando meus cabelos.

– Tive um pesadelo – Confesso.

Ela me embala e me balança como se fosse uma criança, enquanto continua acariciando meus cabelos até que eu consiga me acalmar. Já havíamos pousado e taxiávamos pela pista quando eu consegui finalmente parar de chorar. A sensação de desespero e alívio se misturavam e viraram uma coisa que eu não conhecia e era incapaz de nomear, um aperto no peito. Talvez eu devesse ver um cardiologista.

Afasto-me dela por um momento e começo a limpar meu rosto com as mãos, meu estado deve ser lastimável agora, ela me encara com as sobrancelhas franzidas e olhos preocupados. Cada vez que eu olho para seu rosto, sinto ainda mais vontade de voltar a chorar, não poderia suportar algo assim.

– Quer me contar? – Me pergunta com seus olhos aflitos.

Apenas nego com a cabeça, não quero que essa situação sequer passe por sua mente, então escolho não dizer.

Ela assente e beija meu rosto delicadamente, de repente quero chorar novamente.

Desembarcamos com nossas malas, me sinto fraca e arrasada, Freen nunca precisa que eu diga nada a ela. Empilha toda a nossa bagagem num carrinho e o empurra sem dificuldade enquanto eu caminho ao seu lado segurando seu braço como apoio. Usamos bonés e óculos escuros, Freen ainda usa uma máscara descartável além disso.

Meu coração bate acelerado durante todo o caminho até a casa dela, sei que agora tudo é diferente. Mas ainda me lembro das vezes que voltei lá e a casa estava vazia, esse fantasma ainda me assombra.

Assim que entramos, assim que colocamos nossos pés para dentro da casa e a porta com tranca automática é fechada, eu sinto.

É seguro.

Eu a abraço com força, porque eu preciso disso, eu preciso sentir que ela ainda está aqui. É como se parte de mim ainda não tivesse acordado daquele pesadelo, como se em alguma realidade paralela ela não tivesse voltado daquela ilha alguns dias atrás, e essas duas realidades alternativas se entrelaçassem agora e me confundisse. Mas eu não consigo sequer imaginar viver nessa realidade onde ela não está mais.

– Você quer conversar? – Ela questiona num tom baixo, próximo ao meu ouvido.

Nego com a cabeça.

O que eu menos quero agora é conversar.

Me afasto dela só o suficiente para alcançar seus lábios com os meus, sua boca é quente, sua pele é quente. Nesses dias que passamos juntas e eu me encarreguei de fiscalizar sua alimentação, já dava para notar algumas mudanças sutis em seu corpo, suas bochechas pareciam voltar. Ainda não era o ideal, mas já não era como no primeiro dia.

Ainda sinto meu abraço frouxo ao seu redor, mas já estou me acostumando.

Sinto meu corpo se aquecendo com seu calor, meu coração ainda bate acelerado e aquela sensação de desamparo anterior começa a se transformar em outra coisa, em um outro tipo de necessidade. Ainda estamos nos beijando quando começo a empurrá-la na direção do sofá, abro meus olhos por breves segundos, apenas para calcular a distância.

Duas Marcas - Freenbecky (GAP)Onde histórias criam vida. Descubra agora