42 - Aquele do reflexo de moro

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Estamos sentadas numa espécie de sala de espera assustadoramente vazia, apenas a atriz mal-humorada e eu. Ela balança sua perna esquerda impacientemente, não falamos nada desde que chegamos, até mesmo porque tenho certeza de que nossas vozes produziriam um eco enorme aqui. Até mesmo a recepcionista que nos recebeu já foi para casa.

Penso que este seria um bom cenário para um crime, mas imediatamente me repreendo mentalmente e tento afastar esse pensamento.

Também é uma situação bastante apropriada, eu tenho noção do quão conhecida é a mulher sentada ao meu lado, então é bom que estejamos sozinhas aqui. Logo que esse pensamento me ocorre, percebo que talvez tenha sido uma péssima ideia vir aqui, essa profissional pode não ser tão profissional assim e em poucos minutos vai ter matéria para uma revista inteira.

Estou quase me levantando para irmos embora quando, como se pudesse ler minha mente, a doutora Millar aparece no corredor para nos receber.

Freen e eu nos sentamos em duas poltronas que estavam dispostas lado a lado, mas separadas por uma mesinha redonda que amparava uma jarra de água e dois copos vazios.

– Podem se servir – a doutora faz sinal para a jarra. – Fiquem à vontade.

Freen nem se move.

– Estamos bem, obrigada – digo.

Mas ela ignora meu comentário e serve a água nos dois copos dispostos ali, antes de ir se posicionar em seu lugar.

A doutora se senta em uma poltrona parecida com a nossa, de frente para nós e cruza as pernas confortavelmente apoiando sua caderneta de anotações sobre o joelho. Ela não parece ter mais de quarenta anos, tem seus cabelos escuros presos em uma trança lateral e usa óculos de grau, se parece exatamente como eu imaginaria uma terapeuta, se isso fosse uma cena de filme.

– Posso fazer uma pergunta antes? – Peço.

– Claro, por favor – a doutora ajusta seus óculos.

Me ajeito na poltrona desconfortavelmente e olho de relance para Freen, que analisa a analista, antes de eu voltar a dizer.

– Não quero que isso soe rude – me adianto. – Mas a doutora sabe quem ela é?

Faço sinal na direção da atriz que eu namoro.

– Te deixaria mais confortável se eu dissesse que não? – Ela responde minha pergunta com outra e isso me faz querer revirar os olhos.

– Eu acho que não – sou sincera.

– Profissionalmente, eu sei quem as duas são – ela responde.

'Ótimo, isso vai ser um caos.' Penso ironicamente.

– Ficariam mais confortável se soubessem quem eu sou também?

– Profissionalmente? – Questiono.

Ela assente com a cabeça.

– Eu acho que sim.

– Certo – ela deixa sua caderneta de lado. – Tenho formação médica com residência em psiquiatria e doutorado em psicologia. Sou especialista em psicologia clínica e comportamental, neurociência, neuropsicologia e psicopatologia. Atuo na área há mais de 20 anos, não estou aqui pela fofoca.

Eu não processei nem metade do que ela acabou de listar, mas isso me tranquiliza de alguma forma.

– Isso é bastante coisa – admito.

– Acredito que sim – ela sorri gentilmente. – Mas como eu posso te ajudar hoje?

Suspiro. – Eu não tenho a menor ideia, o que você costuma fazer normalmente?

Duas Marcas - Freenbecky (GAP)Onde histórias criam vida. Descubra agora