Capítulo 6

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"Eu vi a curtida." Recebi uma mensagem dele enquanto ainda estava nos meus devaneios sobre as suas boas ações.

"De quase quarenta mil, você prestou atenção logo na minha?" Perguntei.

"Digamos que você é um pouco mais inesquecível do que as outras quarenta mil." Ele respondeu e eu fiquei atônita.

"Você realmente sabe como deixar uma pessoa sem palavras." Escrevi e ele mandou apenas um emoji piscando.

Dei um pequeno sorriso e fiquei me sentindo em paz por um momento. Só por um momento. O pesadelo estava vindo.

Ouvi a porta da frente ser brutalmente arremessada para trás e meu coração começou a bater muito mais rápido.

Meus pais entraram, rostos distorcidos pela raiva e a tensão no ar era palpável.

— Por que saiu na internet que você teve um encontro com um guitarrista?! — A minha mãe foi a primeira a esbravejar.

— O quê? Como assim? — Fiquei confusa.

— Não se faz de desentendida. Uma jornalista postou uma foto distante de você dois e eu logo reconheci. — Ela continuou. — Foi por isso que você foi demitida? Você armou uma situação só para ele não saber que você era só uma mera funcionária? Só para ele não ter vergonha de sair com uma pessoa assim?

A minha mãe me acusou com seriedade.

— Claro que não! Eu fui demitida injustamente de lá! — Me defendi.

— Olha essa foto aqui. — O meu pai mostrou uma foto minha e dele. — Vai dizer que não é você? Eu te conheço, Lily.

Ele também me acusou e eu fiquei quieta.

— O seu silêncio diz tudo. — A minha mãe balançou a cabeça. — Você está indo de mal a pior, Lily. Está saindo com um guitarrista só para tentar sugar a fama e o dinheiro dele. Está forçando uma demissão só para forjar o seu status.

Olhei para ela sem acreditar no que ela estava falando. Se ela achava realmente isso, ela não conhecia a filha que tinha.

— Eu não forjei nenhum status. Eu não forcei nenhuma demissão. — Usei um tom firme. — Vocês não podem vir aqui na minha casa e me acusarem disso. Foi ele quem me chamou para sair e eu nunca fingi ser quem eu não sou perto do Luke.

Os dois se olharam de maneira irônica.

— Vocês deveriam ser os únicos a sentirem vergonha aqui. — Apontei para eles. — Vocês deserdaram uma filha porque ela foi demitida do trabalho de maneira abrupta e injusta. Vocês jogaram fora toda uma relação construída com uma pessoa que deveria ser o mundo de vocês. Que deveria ser amada por vocês.

Respirei fundo e desviei o olhar deles.

— Sim. Eu saí mesmo com esse tal guitarrista. — Admiti. — E ele está se tornando um bom amigo. Inclusive, ele foi o responsável pela minha janta de hoje.

Apontei para as embalagens dos sushis.

— Então você está mesmo se aproveitando do dinheiro do coitado. Eu sabia. É bem a sua cara. — O meu pai riu com ironia.

— Você está enganado. Ele mandou porque quis. — Frisei. — Talvez não seja comum para vocês se importarem com os outros, mas ele se importou. Uma pessoa praticamente estranha me tratou melhor em poucos dias do que vocês dois em anos.

Atravessei a sala e abri a porta para eles.

— Vai expulsar a gente? Você tem coragem? — A minha mãe perguntou.

— Está sentindo um dejavu? Você fez o mesmo comigo. Vocês dois. — Coloquei a mão na maçaneta e fiz um sinal para eles irem embora daqui o mais rápido possível.

— Duvido que ele saiba que você era só uma garçonete patética. Você não é do mundo dele. — O meu pai foi em direção à porta. — Eu vou avisar esse cara. Ele vai saber que você só é mais uma interesseira.

Ele me encarou e eu vi maldade nos seus olhos. Eu vi ódio. Ódio da própria filha.

— Por quê? Por que isso? — Questionei.

Uma sensação de confusão e tristeza me consumia e eu só queria encontrar uma resposta para essa pergunta que martelava minha mente: por que eles estavam agindo assim com a filha deles?

— Não tem resposta. Nós só achamos injusto você se apossar do cara dessa maneira. — A minha mãe deu um tapinha no meu ombro e se juntou ao meu pai.

— Vocês não me amam? — Perguntei querendo entender o porquê de tudo isso.

Naquele momento, comecei a questionar tudo o que pensava que sabia sobre meus pais. Se eles nunca haviam me amado ou demonstrado carinho por mim, o que havia mantido nossa família unida por tanto tempo? Por que eles nunca haviam chamado meu nome com um mínimo afeto antes de me expulsarem da casa dos dois?

A dor da rejeição era intensa, mas agora também havia uma sensação de traição.

Era difícil aceitar que o amor que eu acreditava existir nunca tinha estado lá.

— Você precisa entender que o mundo não gira em torno de você. Não importa o quanto você tente, nunca será boa o suficiente. Pare de esperar que eu me importe com suas necessidades ou desejos pessoais, porque eu nunca vou. Você não passa de um fardo para nós dois. — As suas palavras saíram totalmente ríspidas.

Receber essas palavras foi como um soco no estômago. Fiquei paralisada, tentando processar o que meu pai acabara de dizer.

Senti como se eu tivesse sido esvaziada de dentro para fora. Uma mistura de tristeza e raiva fervilhando dentro de mim. Aquelas palavras cruéis ecoaram em minha mente, ecoando a dura realidade de que, para ele, eu era somente um fardo.

Foi um momento que marcou o meu coração com várias cicatrizes profundas.

— Ficou claro agora. — Forcei um sorriso.

— Nem tudo é ruim, filha. Você tem aqueles dois melhores amigos idiotas do seu lado. Eles podem te dar um apoio. Mas para ser bem sincera... — Ela assobiou de forma irônica. — Aquele seu amigo gay me enoja, Lily. Ele é muito escandaloso, sabe?

Antes que eu pudesse pensar nas consequências, meu braço se moveu instintivamente e minha mão desferiu um tapa no rosto dela. Foi um gesto totalmente impulsivo, impulsionado pela dor e pela raiva que eu sentia naquele momento. O silêncio tenso que se seguiu deixou claro que não havia voltar atrás.

— Você bateu na sua mãe?! — O meu pai me questionou e eu vi o rosto dela começar a ficar vermelho com o tapa.

— Não. Eu bati em uma mulher desprezível e homofóbica. — Respondi.

— Você vai ver. — Ele veio na minha direção com raiva e cerrou os punhos.

Me preparei para levar um soco dele.

— Se eu fosse você, eu não moveria mais um músculo contra ela. — Ouvi uma voz rouca conhecida. — Você não vai querer que eu acabe com a sua raça na frente da sua mulher. Porque se você não abaixar a porra dessa mão imunda, eu vou fazer questão de arrancá-la sem nem pensar.

CORDAS DO CORAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora