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Primeiro penso ainda estar dormindo, por já ter tido inúmeros outros pesadelos com aquele maldito barulhinho. No entanto, conforme mais real o zumbido fica; mais minhas sobrancelhas se aproximam. Não pode ser. Escuto Sebastian resmungar algo, uma das suas inúmeras frases repetidas — como; "não se mexa" ou "tente relaxar" — mas não baixo o suficiente, o que me obriga a abrir os olhos, enquadrando não só alguém sentado na sua cama, como também o próprio parado em pé à frente da pessoa. Olho para o relógio digital ao lado da minha cama e quando o vejo indicando 5:05am; choramingo, puxando a coberta até cobrir minha cabeça.

— Será que você não dorme? — ignoro a rouquidão da minha voz e o questiono com raiva, por ter tido o sono interrompido.

Mesmo embaixo da coberta, o barulhinho ainda se faz presente, se arrastando para dentro dos meus ouvidos, como um inseto, ou meio de tortura. Tanto faz. 

— Prometo que essa não vai levar mais de 30 minutos, exemplo — escuto sua promessa que me faz choramingar, de novo, levando minhas mãos até minhas orelhas.

Se ao menos tivesse alguma coisa que eu pudesse arremessar na sua cabeça — como uma pedra — por perto... Tento obrigar meu subconsciente a deixar esse mundo em cada pequeno intervalo dos zumbidos da sua máquina e em certo ponto quase consigo. Até eles resolverem começar a conversar e rir, às 5am. Desisto de tentar pegar no sono novamente e me levanto, chutando o cobertor para longe no processo, sem me importar de abaixar a barra da camisola, qual estou usando.   

— Saiba que estou torcendo que você contraia herpes — rosno capturando meu travesseiro e ignoro o olhar do idiota que está sentado na cama de Sebastian, encarando minhas coxas.

Chego a esperar 2 segundos por uma resposta da sua parte, mas Sebastian não desvia sua atenção do que está fazendo, o que só me deixa com mais raiva ainda. Solto um grunhido cheio de ódio e marcho em direção a porta do quarto, amaldiçoando todas as encarnações de Sebastian Carter. Quando estou fechando a porta, escuto sua voz pronunciando um; "Ela está de TPM, não liga" que quase me faz voltar para dentro do quarto, apenas e somente para soca-lo, quem sabe enfiar aquela maldita maquininha bem no meio do seu rabo, porém ainda não estou com energia o suficiente para isso. Sequer consegui dormir 4 horas essa noite, porque só consigo pegar no sono com o quarto estando no mais completo silêncio e para variar, Sebastian só parou de fazer barulhos às 1am. Dando um intervalo de apenas 4 horas para voltar a fazê-lo de novo. Desço as escadas, indo até a porta B-22 e mesmo sabendo o quão inconveniente seria; bato várias e várias vezes na madeira, até uma Ashley tão sonolenta quanto eu abri-la.

— Preciso da sua cama emprestada por algumas horas — a informo e entro no seu quarto tranquilo, sem um barulhinho, sem nenhuma conversa ou risadas. Acho que encontrei com o paraíso.

— Você já viu que horas são? Quincie, não são nem 6am ainda — apesar de estar brava, Ash não me expulsa do seu quarto e fecha a porta, esfregando seus olhos.

Me jogo na sua cama, que não produz nenhum protesto, aconchegando minha cabeça no travesseiro qual trouxe e logo a sinto se deitar ao meu lado, dividindo a cama de solteiro do dormitório. Não é a primeira vez que um episódio como esse acontece, pra falar a verdade, conseguiria facilmente construir uma minissérie com todas as vezes que tive que migrar para a cama de Ash nesses últimos 4 meses.  

— Por que você não denuncia ele? Tenho certeza que a administração vai fazê-lo parar, de um jeito ou de outro — mesmo que eu pudesse jurar que Ash havia voltado a dormir pelo silêncio qual toma o quarto; a escuto questionar de uma maneira arrastada, quase que como se parte dela estivesse mesmo dormindo.

— Porque é complicado — resmungo em resposta, pedindo mentalmente para que ela deixe a conversa por isso mesmo, porém seu corpo se remexendo no colchão me indica que não, ela não vai deixar pra lá assim tão fácil.

— Você ter uma paixão nele vai além do complicado, Quin.

— Não tenho uma paixão em Sebastian, não mesmo, nunca, pra sua informação ele poderia ser o último homem no mundo e ainda assim escolheria beijar uma árvore — aproximo as sobrancelhas mesmo que de olhos fechados e ainda que eu não esteja a vendo; sei que nesse segundo Ash está me observando.

— Se você não gosta dele, por que não o denuncia? — sua voz agora abandonou um pouco da sonolência de antes e ao que parece ela quer mesmo desperdiçar nosso tempo conversando ao invés de dormindo.

— Porque não posso, ok? — me viro de costas para si, porque não quero falar sobre isso — Podemos só tentar dormir mais um pouco?

Ashley não me responde, apenas suspira e também se vira de costas para mim. Por sermos amigas desde o ensino médio, conhecemos o suficiente uma a outra, para sabermos quando uma está forçando demais a barra, assim como também sabemos quando uma esconde algo da outra e por mais que ela saiba que estou escondendo algo, Ash nunca me forçaria a falar. Suspiro e sussurro um; "Boa noite, Ash", recebendo como resposta um; "Você quis dizer bom dia" que faz com que aquele leve desconforto desapareça e nós duas acabamos rindo.

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