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Dizer que consegui pegar no sono logo em seguida aquela conversa com Ash seria uma tremenda mentira, porque por mais bobo que seja, minha cabeça não parou de pensar a respeito do porquê não posso simplesmente denunciar Sebastian. Não quando não faço ideia do estrago que isso pode fazer na sua vida pessoal, aquela qual não levamos para a universidade, nem falamos sobre. E meus olhos pesados enquanto encaro a questão número 9 são a prova do quanto a falta de uma noite de sono tranquila pode ferrar com a vida de um estudante. Acabo bocejando e fecho os olhos só por alguns minutinhos. Voltando a abri-los só quando sinto um chute na cadeira. Levanto a cabeça, sem me lembrar do momento qual a abaixei e levo alguns instantes para lembrar onde estava. Limpo o fino fio de baba no canto da minha boca e meu olhar se fixa no professor na frente da turma, conversando com um outro estudante. O aproveito distraído para olhar por cima do ombro para a pessoa que havia me acordado e estou quase sussurrando um agradecimento, quando percebo Sebastian sentado de uma forma despreocupada, fingindo estar interessado na prova, enquanto girava uma caneta parecida com a minha entre os dedos. Volto minha atenção para minha carteira, revirando os olhos tanto por ele estar fingindo mesmo prestar atenção nas questões, quanto por ter escolhido se sentar logo atrás de mim e ter me pego dormindo sobre a prova; enquanto procuro minha caneta. Claro que o universo me odiaria o suficiente para me fazer ter que dividir não só um quarto, como também a sala de aula com a pessoa mais idiota do planeta. E estarei mentindo se disser que não fiquei surpresa quando descobri que Sebastian estava cursando odontologia também. Sem surpresa não encontro a caneta e nem perco tempo tentando encontrá-la no chão, porque sei bem onde ela está. Ou melhor; com quem está. Volto a olhá-lo sobre os ombros e rosno o mais baixo que consigo um; "Me devolve a caneta", conseguindo fazer sua atenção se fixar em mim. E conforme seus olhos sustentam os meus, por um segundo, penso seriamente que Sebastian simplesmente iria me entregar a caneta. Assim, dessa forma, simples e sem segundas intenções. Mas claro que o babaca de porte maior desconstrói meu faz de conta assim que adota aquele seu sorriso diabólico.

— Veio fazer a prova sem caneta, exemplo? — por mais surreal e hipnotizante que possa ficar a junção da sua voz sussurrada com aquele sorriso; uma risada sem humor algum me escapa, conforme me viro na cadeira, tentando recuperar minha caneta — Cuidado exemplo, você não está mais cumprindo com o seu papel — conseguindo ser mais rápido que eu; Sebastian afasta sua mão do meu alcance e não abandona em nenhum momento o sorriso.

— Meu papel? Do que você está falando? Não, quer saber, não responda, só me devolva a maldita caneta — tento sussurrar, enquanto alguns outros estudantes próximos as nossas carteiras olham de cara feia pra gente e nem posso julgá-los por isso.

— O papel de ser uma boa garota — Sebastian se inclina, aproximando nossos rostos e luto internamente para não cair olhar no seu sorriso, agora bem mais próximo que antes, deixando apenas alguns centímetros de distância entre nós, porque sei que se fizer isso ele vai entender que seu sorrisinho diabólico tem o mesmo poder sobre mim, que teria em qualquer outra garota desse campus — Não me diga que vai mudar de lado logo agora e vai ser o tipo de pessoa que não se importa se está babando sobre a prova ou não — apesar de garantir que meus olhos não se desviassem dos seus; Sebastian não se importa de decair sua atenção para os meus lábios, o que me faz querer socá-lo, porque sei muito bem o que ele está fazendo.

Sebastian sempre age como se estivesse interessado quando quer algo. Um sorriso com aquelas malditas covinhas, um aproximar invasor e um toque; é toda a munição que ele tem para entrar em qualquer jogo e bizarramente sempre conseguir vencer. Porém ele esquece que nesses 4 terríveis meses que estamos tendo que suportar um ao outro; já decorei cada uma das suas jogadas. E não só sei qual será seu próximo passo, como o ínsito; me aproximando mais ainda de si, transformando aqueles seus centímetros em um mísero respiro, sem abrir sorrisos como toda garota abre no segundo em que Sebastian dirige qualquer palavra para elas.

— O que eu faço... — toco no desenho escuro gravado na pele do seu antebraço e me inclino ainda mais sustentando seu olhar — Não é da sua conta — sussurro o mais lento que consigo e Sebastian, por adotar outro sorriso não se acovardando, me faz jurar que sinto nossos lábios se tocarem por uma quebra de segundo, porém ignoro essa possibilidade e até tento pegar a caneta dos seus dedos em um movimento rápido, mas ele prevê meu movimento e leva sua mão, qual segurava a caneta, para trás das costas.

— Você é boa, exemplo — mesmo com nossos narizes quase que se tocando; seus olhos caem nos meus lábios novamente — Melhor do que pensei que fosse, mas ainda não é o suficiente.

Ignoro a sensação estranha que seu hálito quente faz meu corpo inteiro sentir, focando única e exclusivamente em montar alguma resposta. Qualquer uma que não o deixe ficar com a última palavra. Porém antes que eu pudesse de fato falar qualquer coisa; Sebastian vira seu rosto e aproxima seus lábios da minha orelha, sussurrando um; "Prometa que não vai mais dormir no meio de uma prova e a caneta será sua de novo, exemplo", sem se importar dos seus lábios estarem raspando num ponto sensível da minha orelha, o mesmo ponto traíra que produz um arrepio inusitado e totalmente sem nexo no meu corpo inteiro. Sem nexo, porque não acho Sebastian atrativo, talvez seu corpo seja mais que incrível para alguém que só vive a base de álcool, barrinhas e aperitivos servidos em festas ou bares, mas sua personalidade consegue fazer com que qualquer outro traço seu seja transformado em um qual me enjoa. Inusitado, porque nunca senti um arrepio tão forte como esse antes, quase como se ele pudesse conter energia, aquela qual por mais atrativa que seja ainda é perigosa. Lembrando a mim mesma desse gigantesco detalhe, acabo recuando, me afastando de Sebastian.

— Não vou prometer nada, quem você pensa que é para querer exigir algo? — aproximo as sobrancelhas, sentindo todo e qualquer arrepio que havia surgido antes desaparecer.

— Alguém que tem uma coisa que você precisa — Sebastian deixa de esconder a caneta atrás das suas costas e a exibe, a girando entre os dedos como um pré-adolescente que abriu um pacote de camisinhas pela primeira vez.

— Juro que você tem o poder de tirar a minha sanidade — me inclino novamente, mas dessa vez não para desafiá-lo e sim para tentar recuperar a minha caneta, que de novo se torna uma tentativa fracassada.

— Se essa mesma frase fosse dita em um outro momento, exemplo... Teríamos grandes problemas — Sebastian vira sua cabeça, fazendo seus cabelos pretos caírem um pouco para o lado, sem desviar seu olhar do meu e percebo seu sussurro se transformar em um mais rouco, mais lento, como se de alguma forma; ele estivesse dando em cima de mim.

— Do que está falando? — pisco confusa, sem esconder minha confusão e ao nosso lado alguém faz um "Shhh" pedindo silêncio.

— Você não concorda? Porque eu aposto todas as minhas fichas que se você falasse a mesma frase com a minha cabeça entre as suas pernas, o nosso problema seria mil vezes maior — Sebastian deixa de sorrir e dessa vez a forma que seu olhar decai nos meus lábios é diferente, porque esse seu gesto não carrega nenhuma sombra de brincadeira.

— Senhores vocês estão em prova individual! — antes que eu pudesse cair mais e mais nesse seu jogo idiota; a voz do professor quebra esse momento estranho e me faz soltar o ar que sequer percebi estar prendendo, antes de pegar a caneta dos seus dedos em um movimento rápido, voltando meu corpo e minha atenção para prova de novo.

Ou ao menos tento, porque apesar dessa vez não ter o barulho da sua máquina, ainda é extremamente difícil focar em qualquer pergunta depois do que Sebastian disse. Tento me lembrar de alguma outra vez qual já tivéssemos feito ou falado algo perto do que ele fez agora, mas não encontro porque nunca nos provocamos da forma que ele acabou de fazer, nunca. Sempre soubemos muito bem o quanto odiamos um ao outro para manter nossas provocações num caminho qual seguia por uma estrada bem diferente da qual ele resolveu percorrer dessa vez e por mais que grande parte de mim tenha odiado essa sua iniciativa; outra quer sorrir, por Sebastian Carter ter mesmo dado em cima de mim de uma forma totalmente descarada. "minha cabeça entre as suas pernas, o nosso problema seria mil vezes maior" relembro a sua frase e balanço a cabeça em negação assinalando outra questão da prova, que babaca presunçoso.

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