Capítulo 4

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Ian narrando

Entrei na sala e vi Ellie de cabeça baixa, joguei os livros na mesa para assusta-la. Ao levantar a cabeça olhar para mim, senti uma pontada de tristeza. Seus olhos estavam vermelhos e as lágrimas escorreram pelo seu rosto.
Uma parte de mim sentiu vontade de perguntar se ela estava sentindo alguma coisa, outra parte de mim travou.
Ela me encarou enquanto as lágrimas escorriam.

- Preciso do trabalho para daqui há dois dias. - Falei e desviei o olhar, para não demonstrar fraqueza. Detesto sentir esse sentimento, empatia.

- Sim, senhor. - Ela respondeu entre os dentes e se levantou, saindo da sala.

Abdiel narrando

Minha vontade era de levantar e pegar Ian pelo pescoço.
Joguei o livro, que estava em minha mão, em cima da mesa e o encarei.
Que cara nojento!
Ian andou até a cadeira dele e se sentou, me olhou com o queixo erguido, querendo demonstrar poder.
Me levantei e fui atrás de Ellie.
Andei pelo corredor olhando as salas vazias, não a encontrei.
Olhei pela janela e a vi indo em direção ao jardim, atrás da escola.
Desci as escadas correndo e caminhei o mais rápido que pude até ela. Como sou um atleta, foi fácil alcança-la.

- Ellie, me espere. - Gritei atrás dela. Ela se virou e ficou surpresa ao me ver ali.

- Você é doido? O que está fazendo aqui? - Ellie se virou e voltou a andar. - Volte para a sala, não quero que se prejudique por causa de uma ninguém. - Ela gritou ainda andando.

- Ei! - Segurei seu ombro. - Parei em sua frente. - Nunca mais repita isso. Não é verdade o que você acabou de dizer, além do mais, não estou aqui por você. Eu só quero tomar um ar fresco. Você me faz companhia? - A soltei e começamos a andar um do lado do outro. Ela sorriu ao ouvir a mentira que acabei de contar.

- Obrigada. - Andamos até um banco no meio do jardim, as árvores eram altas, não conseguiriam nos achar ali dentro. Ellie sentou e olhou na direção oposta de onde eu estava sentado. Seus ombros começaram a descer e subir.

- Ellie? Você está chorando? Ei? - Puxei o rosto dela em minha direção. Ela olhava para baixo.

- Desculpe! Eu vou embora. - Ela ameaçou se levantar. A segurei pela mão.

- Não vai não, fica aqui. Chorar alivia. Pode chorar o quanto quiser, eu prometo ficar aqui, quietinho. - Cheguei para mais perto dela e ofereci meu ombro para Ellie deitar. - Deita aqui. - Bati no ombro. - Não vou ficar olhando.

- Obrigada, eu nunca tive alguém para me consolar. - Ellie apoiou a cabeça no meu ombro e ali ficamos por alguns longos minutos. A cada fungada dela, mais eu sentia raiva de Ian.

- Está melhor? - Perguntei após ela levantar a cabeça.

- Estou sim, obrigada. É difícil se fazer de forte o tempo todo.

- Quando precisar conversar, é só falar. Cadê seu celular para eu anotar meu contato? Olhei ao redor dela procurando.

- Eu não tenho um. O meu estava muito velho, daí quebrou. Estou guardando dinheiro para comprar outro. - Ela olhou para baixo envergonhada.

- Entendo, mas não precisa se envergonhar por isso. Vem, vamos voltar para a aula.

- Eu não posso entrar com você na sala. - Ela se encolheu. - Vai na frente, depois eu vou.

- Não estou entendendo. O que há de errado nisso? Agora eu tenho que ter um padrão de amigos?

- Eu já falei eu sou uma... - Ela abaixou os olhos e seus olhos ficaram rasos de lágrimas. - Você sabe.

- Olha aqui, pare de se pôr para baixo. Você acha que as pessoas se aproximam de mim por quê? Só por status. Você acha que eu ligo para padrões? Eu que estou correndo atrás de você, então pare com isso. O que falarem ao meu respeito, eu resolvo. Não precisa se preocupar comigo, ok? Sei bem me virar.

- Isso aqui não está certo. Agradeço por você ser importar. Mas, imagine se as meninas me vêem com você? - Ela sorriu. - Elas me irão me estrangular.

- Não estou entendendo. - Realmente não estava. Eu não prestava atenção em nada ao meu redor e nem me importava com as coisas, só queria terminar esse ano letivo.

- As meninas morrem por você, não é possível que não reparou isso. Dá pra ver que você não se importa com isso. - Ellie secou a lágrima com as costas das mãos. - Você poderia estar andando com qualquer menina dessa escola, daí você escolhe logo a bolsista e filha de uma doméstica. O que acha que elas vão fazer comigo?

- Estou começando a entender. Você tem medo que elas façam alguma coisa com você?

- Claro que tenho, já tenho problemas demais na minha vida. Desculpe, Abdiel.

- Você está rejeitando a minha companhia, é isso?

- Sim. Não precisa me defender ou me consolar. Te agradeço do fundo do meu coração, mas não se preocupe comigo, por favor.

- É sério isso? - Senti uma tristeza tão grande, ela estava tentando se fazer de forte novamente. Enquanto as pessoas lutavam pela a minha atenção e eu rejeitava, eu estava lutando pela atenção de Ellie e ela estava me rejeitando.

- É sim. Desculpe!

- Está bem. Pode deixar que não te perturbo mais. Com licença. - Levantei e andei em direção as escadas que me levariam para a sala de aula. Escutei Ellie chorando enquanto eu saia. Cerrei os punhos e me controlei para não voltar, minha vontade era de abraça-la. Fechei os olhos e respirei fundo.

Subi as escadas pensando nas palavras de Ellie. Aquilo me deu raiva e tristeza ao mesmo tempo. Entendi perfeitamente sua posição, mas eu não entendi porque eu tinha que me afastar.
Até onde ela estava se protegendo? Até onde ela estava me protegendo?
Entrei na sala e Ian me encarou.
Caminhei até a sua mesa e o encarei, meus olhos estavam sombrios.

- Algum problema Abdiel? - Ele estava visivelmente nervoso, mas quis mostrar coragem.

- Por que você é tão ridículo assim? Você não tem vergonha? Pessoas como você me dão nojo. Eu estou doido para dar um soco no meio da sua cara, de maneira que você não possa dar esse seu sorriso debochado nunca mais.

- Sério? Está defendendo a bolsista? Fica quietinho na sua, você não tem nada haver com isso. Se ficar latindo, ela vai ter consequências. - Dei um soco na mesa e abaixei para falar bem próximo ao rosto dele.

- O próximo soco vai ser na sua cara, seu babaca. Aprende a ser gente. - A turma toda estava nos observando, peguei minhas coisas na mesa e sai porta a fora. Passei por Ellie no corredor e a ignorei. Não podia olhar em sua direção, minha vontade era de arrasta-la comigo. Mas eu tinha acabado de ouvir que ela não queria minha empatia.

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