Capítulo 49

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Ian narrando

Entrei no carro e fechei as portas. O motorista bateu no vidro para eu abrir o carro.
Acelerei, saindo da escola. Estava tomado pelo ódio.
Aquela palavra ficou martelando na minha mente, como eu posso ser adotivo?
Soquei o volante, tentando extravasar minha raiva.
Parei no meio do mato e ali chorei tudo o que pude, trancado dentro do carro. Fiquei com raiva da vida e do mundo.

Abdiel narrando

Ouvir senhor Bittencourt dizer que Ian não era filho legítimo dele, me fez ficar em estado desnorteado.
Até para mim foi um choque, imagine para Ian, que tem um ego bem grande.
Ellie ficou pasma igualmente a mim.

Senhor Bittencourt pediu desculpas por Ian e foi atrás do filho.
Abracei Ellie e consegui acalma-la.  Voltamos para a sala de aula, sentei do lado dela e segurei sua mão durante toda a aula.

Após a aula, voltaríamos para casa. Ellie sentou na moto e me abraçou com força.
Se eu soubesse que esse dia terminaria assim, nunca teria permitido ela sair de casa para voltar a estudar.

Um carro avançou o sinal, em uma esquina próxima a escola, parecia estar parado só esperando  passarmos por ali. Ellie ainda olhou para trás e soltou os braços de minha cintura. Parecia querer me impedir de cair.
O carro bateu em cheio no meio da moto, Ellie voou e caiu muito longe de mim.

Cai de bruços, tentei levantar e não consegui. Ellie estava um pouco distante, eu a observava com esforço e ela não se mexia.

- Ellie! - Falei e quase me engasguei com o sangue em minha boca. Comecei a tossir, estava quase bronco aspirando. Alguém tirou meu capacete e eu consegui deitar de lado, cuspi o sangue. - Ajude ela. Por favor, ajude ela. - Eu tentava falar alto, mas a minha voz não saia tão clara. Parecia que meu corpo estava todo quebrado, doía até para respirar. Eu queria levantar e correr na direção  dela, mas nem me mexer conseguia mais. - Ellie! - Tentava gritar. O desespero me invadiu.

- Fique calmo, a ambulância já está chegando. - Uma senhora que viu o acidente, tentava me acalmar.

- Vê como ela está, por favor. Por favor, ajude ela. - Meus olhos começaram a pesar e eu tentava me manter acordado. A última frase que eu ouvi, foi a de um homem, antes de apagar: Ela não resistiu.

Acordei um mês depois no hospital, me senti o Robocop, de tantos ferros que tinham em meu corpo.
Podiam ter trocado meu coração por um de ferro também, só assim não sentiria essa dor desgraçada.
Vieram me informar que Ellie não tinha resistido aos ferimentos. A loucura e a dor me invadiram.

- Por que vocês me salvaram? - Eu gritava desesperadamente. - Eu falei para salva-la. Por que não me deixaram morrer? - A dor estava me queimando, eu só queria morrer. Arranquei os acessos do meu braço, o sangue voou para todos os lados, na busca de tentar pular da janela. Meus pais me seguraram, o médico veio com uma injeção e aplicou no meu braço.

Dormi por mais três dias. Acordei achando que tudo o que eu tinha ouvido era um pesadelo. Mas a realidade caiu na minha cabeça.
Eu estava sendo engolido pela dor, parecia que minha garganta ia pegar fogo.
Agora eu tinha a atenção dos meus pais, mas eu não tinha Ellie.
Trocaria tudo isso por ela.
Meus dias e noites foram dolorosos.
Mais do que os ferros nas minhas pernas e no meu braço, a dor invisível na minha alma me matava de dentro para fora.

Fiquei um mês no hospital, a base de remédios.
Quis me isolar do mundo. Quis morrer todos os dias.
O médico decidiu me dar alta.
Ao entrar em casa desabei, tudo me fazia lembrar Ellie.
Cai sentado no sofá e gritei, tentando mandar embora aquela dor.
Minha mãe me abraçou tentando me acalmar. Meu pai ficou de longe nos observando.

- Tenta se acalmar filho. - Minha mãe passava a mão em meu rosto.

- Foi tudo culpa minha. Eu matei Ellie, mãe.

- Não fala isso. Não foi culpa sua, o carro que avançou o sinal. Não fique se culpando.

- Onde ela foi enterrada? Eu quero ir até lá. Me leva mãe. - Eu estava em prantos. Minha cabeça parecia que ia explodir.

- A tia dela a levou para outro país. Não temos o contato dela, filho.

- Mãe, vocês tem que descobrir onde foi. Eu preciso pelo menos me despedir. Eu não sei se vou aguentar lidar com essa dor. Está doendo muito. Por que me salvaram? - Abaixei a cabeça para chorar.

- Não fala uma coisa dessas filho. Pare de falar besteiras.

- Me deixem sozinho, por favor. Eu não quero ver ninguém.

- Está bem. Se precisar pode ligar. Estamos no apartamento aqui do lado, já sabíamos que você ia querer ficar sozinho. Daqui a pouco eu volto com seu almoço. Seus remédios estão aqui, não fique sem toma-los, vou vir conferir. Carreguei o celular e deixei na sua mochila, onde estava. - Não entendi que celular era esse.

Levantei e entrei no quarto onde estavam as coisas dela. Passei a mão em suas roupas penduradas no closet, seu cheio ainda estava ali. Sentei na cama e me permiti chorar.
Dizem que chorar alivia, mas quanto mais eu chorava, mais o buraco se abria no meu peito.

- Ellie, por que você fez isso comigo? Eu não sei como vou viver sem você, eu falei que você era a  minha vida. Você é uma covarde, nem deixou eu me despedir de você. Por que você me fez se apaixonar por você? Pra me deixar assim? - Eu gritava em meio ao choro. - Você não podia deixar eu saber como dói perder você. Volta para mim, por favor. Em que vou ser bom agora? Eu só era bom em te amar. Eu estou com muita raiva agora, não quero ficar em um mundo que não tem você. Volta pra mim, por favor. - Meu coração parecia que ia explodir. - Me desculpe Ellie, é tudo culpa minha. Se eu tivesse ido de carro, se não deixasse você voltar para a aula, nada disso teria acontecido. - Chorei até não ter mais lágrimas.

Fui até a sala e peguei meu celular, na esperança de mandar uma mensagem para ela e ela responder.
Mandei a mensagem e escutei um barulho no meu quarto.
Fui caminhando vagarosamente, liguei para o número dela. O celular de Ellie estava dentro da minha mochila.
Peguei o celular ainda em meio ao pranto.
Digitei a senha e olhei sua galeria. Só tinha fotos nossas, eu deitado dormindo, eu na cozinha fazendo nossos lanches, eu com a toalha no ombro escovando os dentes.
Tinha vídeo de mim, eu a ensinado falar coreano.

Por que você tinha que me deixar? Abracei o celular. Se ela soubesse a dor que me causaria,  será que teria ido mesmo assim?
Sentei na minha cama com os celulares nas mãos, me joguei para trás e coloquei um dos braços no rosto.
Até para respirar doía.
Como vai ser agora? Vou tentar ser forte ou me entrego?
Por que você tinha que me mostrar essa dor?

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