Capítulo 36

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Ian narrando

Desde que a vi pela primeira vez, na minha casa, meu coração disparou.
Quis desesperadamente uma maneira de falar com ela, mas como não conversa com pessoas de classe baixa não dei o braço a torcer.

Pedi meu pai para ver se conseguia uma bolsa para Ellie, já que era seu último ano.
Prometi que estudaria com ela, pois minhas notas nos últimos anos estão horríveis, assim o comovi.
Ele pediu ao dono da escola, que nem faço ideia de quem seja, ele prontamente aceitou.

Comecei a pensar muito em Ellie, inventava desculpas para ir na cozinha vê-la.
Por vezes sentei na sala para ouvir a voz dela conversando com a mãe. Fingia sempre estar mexendo no celular, só para ficar ali ouvindo sua voz.
Quando as aulas começaram, inventei uma desculpa para falar com ela. Ameacei mandar a mãe dela embora, caso Ellie não fizesse meus trabalhos.
Falei também que pediria meu pai para cancelar sua bolsa de estudos.

Isso tudo foi uma máscara, só para eu manter contato com ela e não demonstrar fraqueza.
Eu tenho raiva de Ellie, por me fazer sentir essas coisas. Se ela tivesse nascido em uma família rica, seria tudo diferente. Estaria passeando de mãos dadas com ela.

Estava sendo vitorioso, mantendo contato com ela, a vendo todos os dias na escola, fazendo ela ter medo de mim e escondendo meus verdadeiros sentimentos.
Até Abdiel se aproximar dela, com qual direito ele fez isso?

Vê Ellie andando com esse cara me dá um negócio por dentro, não sei explicar o que é. Me dá vontade de arranca- lá de perto dele, dá vontade de coloca-la do meu lado e não deixa-la conversar com ninguém.
Mas eu sou Ian Bittencourt, não posso manter pessoas de classe baixa próximo a mim.

Eu nunca fui de saber pedir nada para as pessoas, sempre impus.
Gosto de dar ordens e ver as coisas acontecerem do jeito que mandei.
Com Ellie é difícil isso acontecer, ela até faz o que eu peço, mas no final ela retruca.
Não gosto de ser desafiado, mas ela faz isso. Acaba que eu fico pensando nela o dia todo, tentando entender porque ela é tão difícil.

Essa garota está acabando com meu psicológico.
Tenho raiva por pensar tanto nela.
Quando ela machucou o pé por minha causa, senti muita raiva de mim mesmo.
Por que eu estava insistindo para leva-la para casa?
Se Abdiel não estivesse chegado, eu teria conseguido levá-la para o hospital. Teria conseguido cuidar dela.
Minha vontade, as vezes, é matar Abdiel. Só assim o caminho vai ficar livre para mim.

Fui algumas vezes na casa dela, dirigindo meu carro. Fiquei parado do lado de fora, esperando vê-la.
Em todas as vezes vi Abdiel saindo ou chegando.
Quando ficaram tão próximos?
Isso só aumenta a raiva que tenho por ele.
Queria que esses dois sumissem do mapa.  Não, os dois não, só ele.

Enviei um caixa para o endereço dela, tinha coisas para dar um pouco de conforto. Sei que estou certo, ela que puxou o braço e acabou caindo, se tivesse feito o que eu pedi, estaria bem agora. Mas uma coisa fica martelando dentro da minha cabeça, como se eu tivesse culpa.
Não quero demonstrar afeto e nem preocupação, por isso fico escondido observando de longe.

Hoje Ellie veio me falar que a mãe dela está morrendo, ouvir aquilo me deu um choque. Senhora Helena está lá em casa desde que eu era uma criança.
Deixou a filha com a irmã para sustenta-la. Ellie cresceu sem a mãe, enquanto a mãe dela cuidava de mim.
Tentei ser o mais seco possível com Ellie, referente a sua mãe.

Cheguei em casa e fiquei observando senhora Helena, cinco meses que ela tem para viver.
Lembrar daquilo fez meus olhos se encherem de lágrimas.

- Ian, o que foi? - Ela reparou meus olhos rasos de lágrimas.

- Nada, não é nada. - Levantei da cadeira e subi as escadas, indo para meu quarto.

Deitei na cama e me permiti chorar, estou com raiva por estar sentindo afeto por uma empregada doméstica.
Lembrei que Ellie não tem mais ninguém. Como ela vai viver sem os pais? Isso me fez chorar ainda mais.

Enfiei uma almofada no rosto e dei um grito. Não quero ter empatia por ninguém, só quero continuar sendo do meu jeito. Isso está me deixando com mais raiva ainda.

Antes de sair de casa e na volta para casa, fico observando senhora Helena de longe.
Os dias estão passando e não posso fazer nada para ajuda-la. Ellie pediu para eu cuidar dela, mas como posso fazer isso? Eu não sei demonstrar afeto.
Sou diferente dos meus pais, eles tem tanto amor para dar. Sempre foram presentes na minha vida e me cobriram de presentes, mas eu não consigo ter amor pelas pessoas, não penso em ninguém que não seja eu mesmo. Mas eu gosto de ser assim.

Abdiel narrando

Ian tem ficado muito quieto no canto dele, desde que Ellie falou da doença da mãe.
Já se passaram 3 meses desde que descobrimos, já se passaram 3 meses desde que começamos a namorar.  Agora faltam 3 meses para senhora Helena partir. Com o tratamento ganhamos mais um mês.
Não tenho conseguido dormir, minha cabeça fica nisso dia e noite.
Decidi ir para o psicólogo com Ellie, tenho que ser forte para ajuda-la a suportar. Estávamos indo para o hospital de carro.
Recebi uma ligação após a consulta, os olheiros marcaram meu jogo para esse final de semana. Terei que ir amanhã para um preparo físico.

- Ellie, marcaram o jogo.

- Sério? Que legal. Estarei lá torcendo por você. Quando vai ser? - Ela falou animada.

- Vai ser neste sábado. Mas vou ter que ficar dois dias lá, para treino. - Aquilo acabou comigo. Senti um aperto tão grande no peito, em ter que deixar Ellie.

- Então você vai amanhã?

- Sim. - Seus olhos estavam tristes, mas ela sorriu para mim. Tentou me encorajar. - Não quero ficar longe de você.

- Vai passar rápido. Você vai ver. - Ela segurou minha mão.

- Eu vou ficar com muita saudade, falei que estava ficando dependente emocional de você.

- Eu também vou ficar com muita saudade, vou sentir sua falta todos os segundos que estiver longe. Vou sentir falta de você me levar para a escola, vou sentir falta das trocas de olhares na sala, vou sentir falta das nossas fugidas para o jardim. - Ela sorriu com os olhos cheios de lágrimas. - Tem horas que é difícil ficar sem te beijar, daí temos que fugir. Vou lembrar disso e vou sorrir.

- Como agora, não estou conseguindo ficar sem te beijar. - Desci do carro, estacionado na garagem do hospital. Dei a volta e fui até ela. Abri a porta do carona e a puxei para fora.

Envolvi sua cintura com um braço e a outra mão coloquei em sua nuca. Encostei Ellie no carro e tomei seus lábios com desespero. Ela retribuiu.

- Eu te amo. Eu te amo. Não esquece, tá bom? - Seus olhos estavam molhados, ela segurou meu rosto com as duas mãos. - Eu vou casar com você e vamos ser muito felizes. - Ouvir aquilo fez meu coração acelerar.

- Eu te amo. - Cheguei mais perto dela e apoiei os dois braços no carro. Ellie envolveu minha cintura com os braços. - Olha aqui nos meus olhos. - Ela olhou. - Eu vou fazer de você a mulher mais feliz desse planeta, eu te prometo. - Ela tomou meus lábios e eu me entreguei por completo.

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