Capítulo 6

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Abdiel narrando

Sentei na escada, em frente ao restaurante e puxei Ellie para sentar ao meu lado.

- Você não pode sentar no chão. Deixa eu ver se acho algo para você sentar em cima. - Ela ia levantar e eu a segurei.

- Está tudo bem, ok? Eu sou um ser humano igual a você. Não precisa me tratar de um jeito diferente, se você me tratar assim, aí é que vou me ofender.

- Desculpe. - Ela sentou e relaxou um pouco.

- Agora vamos comer. - Abri a marmita. Tinha realmente comida para dois. Só que a comida era diferente. - Essa é diferente, o que é?

- É igual a outra, porém tem carne ao envés de camarão. Daí o nome é vaca atolada. - Ela sorriu e eu sorri junto.

- Que nome engraçado. Eu vou experimentar primeiro, está com a cara ótima. - Ellie me olhava com aqueles lindos olhos arregalados. Afundei a colher na comida e coloquei em câmera lenta na boca. Quando não gosto de algo faço logo vômito. Experimentei um pouquinho e logo coloquei a colher por completo na boca. Olhei para ela com a boca cheia. - Isso está melhor do que o outro. - Falei de boca cheia. Ela sorriu e bateu palminhas.

- Que bom que você gostou. - Ela sorria de um jeito tão meigo, nem parecia ter tantos problemas.

- Agora é sua vez. Abre a boca. - Enchi a colher e fiquei esperando ela abrir a boca.

- Eu vou comer na mesma colher que você?

- Você tem nojo?

- Não, não é por mim... É que...

- Abre logo, deixa de enrolação. - Ela abriu a boca e eu coloquei a refeição em sua boca.

- Realmente está muito bom. - Ela sorriu com a boca cheia.

- Não está? Vou querer comer isso todo dia. Já guarda meu lugar aqui no restaurante. - Assim comemos, uma colher para mim e outra para ela.

- Abdiel, obrigada. Você é diferente de todas as pessoas que já conheci. Não sei de onde vem toda essa empatia, mas eu te agradeço do fundo do meu coração. - Aquilo fez meu coração acelerar de uma forma diferente, nunca fui ruim com ninguém, mas também nunca tive tanta empatia por ninguém. Com ela é diferente, tenho vontade de cuidar de Ellie.

- Isso não é nada. Eu também sou sozinho, eu sei como é. Não me proíba de falar com você, eu não sou muito de fazer amizades. - Sorri. - Escolhi você para ser minha amiga, você aceita?

- Eu? - Ela olhou assustada para mim. - Por quê?

- Você não quer? - Fiz um beicinho, como quem iria chorar. - Está rejeitando a minha amizade?

- Não, não é isso. - Ela respirou fundo e abaixou a cabeça. - Tá bom, eu aceito sua amizade.

- Sério? Uffa! - Dei a mão para ela apertar, ela apertou como um trato feito.

- Mas... Evite falar comigo na escola, por favor.

- Que amizade é essa? Não posso falar com você em qualquer lugar? - Sorri e balancei a cabeça negativamente. - Mas vou respeitar seu pedido. É só na escola que não posso falar com você, certo?

- Não é que não possa, é só não falar muito. Você me entende? Ninguém nem me enxerga naquela escola, só Ian, para me explorar. Daí de uma hora para outra o capitão do time, o cara mais famoso da escola é visto comigo. O que você acha que vão falar?

- Que você é uma garota de sorte? - Sorri para ela. - Você é a mais inteligente da nossa turma, vão falar que você está fazendo meus trabalhos. - Prendi o riso.

- Até nisso você é bom. Eu já vi sua dedicação nos estudos, suas notas são as melhores da turma. Não vai colar.

- É porque queria que esse ano terminasse logo. Por isso me dediquei tanto aos estudos.

- Queria? Não quer mais? - Ela me olhou, não entendendo o motivo de eu ter desistido.

- Sim. Agora quero que passe lentamente, só para eu aproveitar. Estou em uma fase bem peculiar, nunca tinha vivido essas coisas: morar sozinho, estar no esporte que gosto, ter comida boa e uma amiga. Meu ano começou bem. No começo do ano eu não tinha nada disso, só um receio de voltar para aquela escola. Por isso queria que acabasse logo o ano, pra eu não ter que ficar olhando para a cara de Ian.

- Ele já aprontou com você? Ian é insuportável mesmo, só aturo as graças dele por causa da minha mãe.

- O tem sua mãe? - Me virei para ela, para ouvir a história.

- Ela é doméstica na casa dela. O pai dele foi quem arrumou essa bolsa para mim. Antes eu morava com uma tia, mas ela teve que ir para fora do país. Daí tive que vir morar com minha mãe. Não conheci meu pai, ele me abandou quando eu era muito pequena. Minha mãe veio para cá eu já estava adolescente, não podia abandonar os estudos, então fiquei com uma tia.

- Entendi. Mas não deixe ele te humilhar. Se for preciso, eu te ajudo.

- Muito obrigada. Mas pode deixar do jeito que está, falta menos que antes. Daqui a pouco o ano letivo acaba.

- Eu vou tentar não me meter nas coisas, mas eu vou logo dizendo que o meu pavio é muito curto, ainda mais se tratando de Ian. Esse cara me dá nos nervos, odeio pessoas que se acham.

- Não se prejudique por mim. Eu te peço, por favor. Ou eu desfaço a nossa amizade. - Ela sorriu.

- Ou eu desfaço nossa amizade? Isso é uma ameaça senhorita Ellie? - Sorri.

- Entenda como você quiser. - Ela falou ainda sorrindo e virou o rosto para o lado, escondendo o sorriso.

- Então vou me comportar o dobro. Ah, já ia me esquecendo. - Levantei e fui até a minha a moto, abri o bagageiro, que fica embaixo do banco e peguei a sacola com o celular. Caminhei até ela e dei a sacola em sua mão. Ela ainda estava sentada, sentei ao seu lado novamente. - Isso é um presente para você, considere um presente de amizade. - Sorri.

- O que é? - Ela abriu a sacola e olhou dentro. - Mentira! Você comprou isso para mim? Esse celular é muito caro. Eu não posso aceitar. - Ela empurrou a sacola para meu lado. Empurrei para o lado dela novamente.

- Eu já tenho um, não preciso de dois. - Puxei o meu do bolso e mostrei para ela. - Comprei esse para você, se não gostar da cor, eu troco.

- É claro que vou gostar, a cor é o de menos.

- Então aceite. Abra para você anotar meu número.

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