O processo

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--- E você não tem nada novo para mostrar.

Leo bufou. Entrou fazendo Fjor tirar da frente o braço erguido até o batente.

--- A gente tem que pensar em alguma coisa... Agora. Alguma coisa que faça o Seimor acreditar na banda de novo.

--- Não sei como eu vou fazer isso se nem sei se eu acredito...

--- Fjor, chega disso! --- Esbravejou Leo, com as mãos atravessando o ar. --- Você tem que tomar uma decisão! Nós temos um agente, nós temos um espaço... Só temos que pensar em algo para chamar a atenção! O-ou você...

--- Mas é isso! --- Interrompeu Fjor, apontando as duas mãos para o irmão. --- É disso que eu falo. A gente nunca precisou "chamar atenção" em Novo-u-joss. A gente fazia o que gostava. O que a gente queria, o que a gente quisesse!

Leo tentou controlar ao mesmo tempo a respiração e a vontade de berrar qualquer coisa para o irmão.

--- As coisas não são fáceis, Fjor! Não são! Se em Novo-u-joss a gente chamava atenção sem fazer esforço, qualquer um fazia isso! A gente era só mais uma banda lá!

Fjor fechou os olhos e deixou o corpo cair na cama. Leo o ignorou solenemente enquanto, sério, andava pelo vão em frente à janela.

--- Eu tenho uma ideia.

--- Qual? --- Instigou Fjor, sem mexer mais que os músculos necessários para falar.

--- O tipo de música que todo mundo está fazendo agora... Que eles mandaram a gente fazer naquela reunião... E se a gente fizer o contrário?

--- O Seimor nunca ia deixar, Leo.

--- Não, não se a gente mudasse coisas demais, mas... Dá para desviar um pouco... O-ou... Sem que ele perceba...

--- Se ele não perceber ninguém vai perce...

--- Tem que ser sobre a guerra. Uma música sobre a guerra.

--- E o que é o que você sabe da guerra? --- Reagiu Fjor, contorcendo a cabeça inteira na resposta instantânea.

--- Nada... --- Sussurrou Leo, subitamente agitado. --- Muito pouco... A gente tem que sair.

--- Quê?

--- Sair, Fjor, sair! --- Explicou Leo.

Fjor levantou-se num pulo e ficou olhando Leo abrir a porta. Parado a um passo do corredor, virado para dentro do quarto, segurava a maçaneta.

--- Você vem ou não vem?

***

Mergulharam nas ruas com passos longos e olhares atentos. A do hotel estava escura; deixaram-na pra trás, vazia e levemente poluída --- mais ou menos como achavam que estaria o resto da cidade.

Seguiram, debaixo de estrelas já então ferozes e do traço dos focos azuis, rosados e verdes dos postes. Encontraram uma fila algumas esquinas mais tarde. Discerniam a música --- era uma banda que tocava junto com esferas de fogo. Leo perguntou se Fjor a reconhecia, e como resposta veio um revirar de olhos.

Em outra rua viram outra reunião de sons e eventos. Chegaram devagar, rodeando os grupos que compunham a fila e nela conversavam animadamente, vestidos para a diversão como em qualquer tempo de paz. Para além deles, na encruzilhada de ladrilhos velhos sobre a qual a sombra de prédios desbotados se agigantava, dois bares enormes, aparentemente tradicionais, estavam abarrotados. O som rápido que as esferas de fogo produziam sozinhas do lado de dentro chegava do lado de fora com intensidade boa o bastante para as pequenas multidões, que faziam sua festa onde podiam. Tomavam as estradas rosadas com contidas dancinhas atrasadas, copos nas mãos e petiscos em um punhado de mesas improvisadas.

A Guerra da UniãoOnde histórias criam vida. Descubra agora