O essencial é invisível aos olhos

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As roupas mostravam que fazia parte do exército do Conselho. Seu cabelo loiro apertado num coque, suas sobrancelhas finas e fortes, seus olhos duros, seus braços cruzados --- tudo deixava claro que ela falava sério quando dizia para o cocheiro fechar a porta e partir.

O problema é que Kan estava esperando pelo general do exército, cuja descrição dada por um mensageiro era substancialmente diferente da pessoa com a qual ele agora dividia a charrete rumo a Rouneen. Esperou para que talvez a situação se resolvesse sozinha, mas ela sequer olhou para o rosto contraído do mago.

--- ... Não tenho certeza se nos conhecemos.

--- Não. --- Respondeu ela, sem tirar os olhos do vidro.

--- Você é a general do Exército do Conselho?

--- Não. Sou a segunda-em-comando.

--- Ah... O... O que aconteceu com o general?

--- Nada.

--- Mas Desmodes especificamente ordenou que ele me acompanhasse.

--- E o general especificamente me designou para substituí-lo porque ele já tem problemas suficientes nas mãos.

--- Isso... --- Começou Kan.

A segunda-em-comando o observou no passo falso em direção à frase, reticente; ele não sabia ao certo até onde deveria levar sua lealdade.

--- ... Isso não é ele quem deveria decidir.

Ela cerrou os olhos suavemente, movendo o queixo como quem entendesse exatamente quem seu inimigo é.

--- Se quiser volte e entenda-se com ele.

Kan pensou uma centena de coisas ao mesmo tempo. Perguntava-se se Desmodes o colocara num teste. Ou se ela, fazendo parte de algo planejado ou não, teria algo a dizer sobre ele quando voltassem. Ou se ela não era uma filinorfa em disfarce que corrompera o sistema para pegar aquele comboio --- ele não a conhecia, mas certamente seus contatos sempre foram mais amplos entre os alorfos que entre os filinorfos.

Rejeitou a imagem de Hiram com uma forte mão proverbial e olhou de relance para a cintura, decidindo que não podia deixar uma segunda-em-comando tratar o assistente pessoal do mago-rei daquela forma.

Enquanto pensava no que fazer exatamente com a espada desembainhada, a guerreira chutou seu rosto de volta para o fundo do seu lado do carro, pegou sua própria espada e num instante ameaçava seu pescoço com a lâmina; com a outra mão, impedia Kan de atacá-la.

--- Quem você pensa que é para me ameaçar?

Kan saiu do castelo antes que ela chegasse perto de suas portas; queria atacá-la, mas ela foi mais rápida. Kan precisou criar um escudo grande o bastante para barrar as adagas que voaram em sua direção.

Fez o escudo desaparecer e viu que ela estava prestes a cravar uma espada em seu peito. Gerou uma lança e atacou, sem sucesso; Kan aproveitou o desvio e sumiu dali.

--- O assistente pessoal do mago-rei.

Ela fez uma chave materializar-se em sua mão. Abriu a porta do castelo dele. Entrou, e os pisos para além da porta, falsos, espatifaram-se abaixo da preculga. Depois do grito, bateu a testa num dos pisos logo à frente, chão verdadeiro, e caiu num buraco mais fundo que sua altura.

Empurrou Kan contra o banco, retirando-se para o próprio lado da charrete. Kan percebeu que ela desistiu também de tentar atacá-lo em Neborum, tendo voltado para o próprio castelo.

--- Da próxima vez não vai haver ameaça. --- Disse ela. --- Covardes como vocês mal merecem uma segunda chance. Não haverá terceira.

A Guerra da UniãoOnde histórias criam vida. Descubra agora