Sombras do passado 🍂

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“Amor quando é amor não definha e até o final das eras há de aumentar, mas se o que eu digo for erro. E o meu engano for provado, então eu nunca terei escrito ou nunca ninguém terá amado.”
— William Shakespeare

”— William Shakespeare

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Henry Blackwood

É curioso como o tempo parece se alongar quando a vida de outra pessoa depende de cada respiração sua. Uma semana já se passara desde que cheguei à residência Pembroke, e cada momento se arrastava com o peso do que eu não disse. Catherine ainda estava fraca, oscilando entre o desespero e a recuperação, mas ao menos sua febre havia diminuído. Por mais que eu não quisesse admitir, temia pelo futuro. Sabia que, a qualquer momento, ela poderia escorregar novamente para aquele abismo do qual eu talvez não pudesse trazê-la de volta.

De pé ao lado de sua cama, observei-a respirar lentamente. O rosto dela, tão pálido e sereno, contrastava com a vivacidade feroz que eu conhecera. Aquela mulher que antes me desafiava com sua língua afiada agora parecia frágil, como uma porcelana delicada que poderia se quebrar a qualquer toque. Eu sabia que, por mais que seu corpo estivesse exausto, sua mente ainda se agarrava àquela luta interna, e era por isso que, apesar de tudo, ela ainda estava aqui. O problema era que, assim como eu, Catherine nunca soube quando desistir.

Inclinei-me sobre a mesa ao lado da cama e servi um pouco do caldo de frango que uma das criadas havia trazido mais cedo. Ela precisava comer algo. Mesmo naquela fraqueza toda, eu podia ver que ela estava perdendo peso, e isso só tornava o medo mais palpável.

— Catherine... — chamei-a com a voz baixa, tentando não assustá-la. Vi suas pálpebras tremerem por um momento, como se o som da minha voz tivesse lhe trazido de volta de algum sonho distante. — Você precisa comer algo.

Ela abriu os olhos lentamente, o olhar ainda embaçado pela exaustão. Uma tentativa de sorriso — ou o que parecia ser uma tentativa — se formou em seus lábios, aquele típico sarcasmo que ela exibia mesmo nos momentos mais inoportunos. Eu sabia que aquele sorriso fraco era uma forma de resistência, mas agora... era um alívio ver qualquer sinal de vida.

— Alimentando-me, Blackwood? Que consideração... — A voz dela era quase inaudível, um mero sussurro, mas o sarcasmo estava lá, ainda que enfraquecido. Seus olhos, porém, tentavam manter a mesma audácia de sempre.

Eu não pude evitar o sorriso que se formou no meu rosto. Era típico dela, mesmo à beira do esgotamento total, encontrar forças para me provocar.

— Acredite, minha cara, não faço isso por gentileza — retruquei, segurando a tigela com uma das mãos enquanto a outra apoiava sua cabeça. — Apenas prefiro você viva para que continue a me irritar. Agora, beba um pouco. Não vou lhe pedir de novo.

Ela franziu o cenho, e por um breve momento pensei que fosse retrucar, mas ao tentar mover a cabeça, um gemido suave escapou de seus lábios. Resignada, ela aceitou a ajuda, e eu levei a tigela aos seus lábios com cuidado. Catherine fechou os olhos enquanto tomava pequenos goles do caldo quente, o corpo tão frágil que parecia mais leve do que eu jamais imaginei.

— Se... for para me irritar, Henry... — ela disse, com a voz entrecortada entre goles, sua expressão de dor suavizada por uma leve ironia — ...você está indo muito bem.

— Ah, sempre o sarcasmo — repliquei, colocando a tigela de volta na mesa quando ela parou de beber. — Isso me conforta, devo admitir.

Ela tentou rir, mas o som foi mais um suspiro do que uma risada verdadeira. O cansaço logo a venceu novamente, e seus olhos começaram a fechar-se. Eu me movi para ajeitar as cobertas ao redor de seus ombros, garantindo que ela ficasse aquecida. No entanto, antes de seus olhos se fecharem por completo, ela olhou para mim uma última vez, seus lábios formando um leve sorriso que não combinava com sua palidez.

— Você... é péssimo nisso, Henry — sussurrou ela, quase inaudível.

— Nunca disse que seria bom, Catherine. — Minha resposta foi um murmúrio, mas ela já havia caído novamente no sono. Sua respiração voltou a ser lenta e estável, o único som que preenchia o quarto além do estalar distante da lareira.

Fiquei ali por um tempo, apenas observando-a dormir, os pensamentos rodopiando em minha mente como uma tempestade violenta. Eu deveria ter contado a ela... sobre tudo. O segredo que mantive por tanto tempo, a verdade sobre o bebê, a dor que carrego por trás das palavras que nunca disse. Mas, como eu poderia jogar mais esse peso sobre ela agora? Catherine precisava se recuperar, e a última coisa que eu desejava era vê-la sofrer mais por minha causa.

🍂🍁🍂

Perdi-me em pensamentos, a visão de seu corpo adormecido à minha frente se desvanecendo enquanto meu olhar se fixava em algum ponto indefinido do quarto. Minha mente, porém, estava a quilômetros de distância. Eu sabia que, em breve, teria de encarar a verdade — tanto com ela quanto comigo mesmo. Catherine merecia saber o que realmente aconteceu, merecia entender a profundidade da traição de Harrington e as mentiras que foram plantadas para nos separar.

O filho que eu perdi... Como poderia contar a ela sobre isso? Eu mal conseguia lidar com a dor, e pensar em como ela reagiria... Não, eu precisava esperar. Ela precisava estar mais forte, mais lúcida, para ouvir. Ainda que as dúvidas permanecessem, eu sabia que seria impossível continuar vivendo sob esse manto de silêncio.

A cada dia que passava, sentia meu próprio coração se apertar, esmagado pelo peso das palavras não ditas. A responsabilidade de protegê-la — não apenas de Harrington, mas também da verdade brutal que estava prestes a ser revelada — tornava minha vigília cada vez mais solitária. Eu me odiava por ter permitido que as coisas chegassem a esse ponto, por ter permitido que a verdade fosse distorcida a ponto de nos separar.

Você sempre foi um tolo, Blackwood, pensei comigo mesmo. Sempre fugi dos sentimentos, das responsabilidades, escondendo-me atrás de máscaras e falsos prazeres. Mas agora... agora era diferente. Catherine era diferente. E por mais que eu quisesse protegê-la, sabia que não podia mais adiar o inevitável. A verdade viria à tona, cedo ou tarde, e, quando isso acontecesse, eu só podia rezar para que ela fosse forte o suficiente para suportar o peso de tudo.

Afastei-me da cama, os olhos ainda fixos nela. Sua respiração suave era a única coisa que me dava algum conforto naquela tempestade interna que me consumia. Eu sabia que precisava ser forte, por ela e por mim. E, no fundo, sabia que, quando o momento chegasse, não haveria mais segredos entre nós.

O vento lá fora uivava contra as janelas, como se o mundo externo estivesse tentando penetrar o pequeno refúgio que criamos ali dentro. Mas, por ora, ao menos, estávamos isolados — presos no tempo, num limiar entre o passado e o futuro.

Eu só esperava que, quando Catherine finalmente acordasse e estivéssemos prontos para enfrentar a verdade, ela ainda pudesse me perdoar.

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⏰ Última atualização: 7 days ago ⏰

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