Capítulo 8

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Fábio parou repentinamente o carro quando o descobriu. O jardim de há tantos anos, aquele onde costumava vigiar a pequena de longe, antes de surgir o motivo que o levasse a se aproximar. Parou o carro perto da entrada, virou o rosto para o suporte para bicicletas, e viu-a, a bicicleta azul com um cadeado vermelho.

Aquela miúda nunca iria aprender? Sim, é verdade que ela ainda não sabia que era perseguida e que tinha poderes, mas isso não fazia com que ela pudesse fugir sem dizer nada e deixá-lo como um louco à procura dela, temendo que os demónios de Mercúrio a tivessem apanhado e levado.

Estacionando o veículo, Fábio correu para o interior do parque, parando o tempo suficiente para se concentrar e canalizar os seus poderes na energia vital de Sofia. Respirou fundo, fechou os olhos e concentrou-se nela o melhor que pôde, já que a vontade de esganar a rapariga quando a encontrasse era mais forte do que a de a encontrar sã e salva, para a levar para casa.

Passado pouco mais de um minuto, já a tinha encontrado. Praguejou quando se apercebeu de que ela tinha feito o que mais temia. Tinha entrado na floresta, mas o mais estranho é que sentia uma força estranha com ela. Não era demoníaca, mas ao lado dela não parecia totalmente benigna.

Começou a correr em direção ao local onde Sofia estava com o estranho ser, preocupado com o que é que ela poderia estar a ser sujeita.

...

Empurrei o Alexandre para longe de mim com a pouca força que tinha, visto que estava a tremer de nervos e ansiedade e o meu batimento cardíaco parecia um tambor acelerado.

Alexandre sorriu-me, como se achasse divertido o estado em que me tinha deixado.

– Porque estás tão nervosa? Sofia, querida, eu não te vou comer. Não ainda. – Não consegui perceber a última coisa que ele disse pois ele tinha baixado o tom de voz a um leve sussurro, e eu era péssima com leitura labial.

– Bom, eu só estou assim porque tu te aproximaste de mim como se me fosses violar. Além me dizeres que sou poderosa de uma maneira que achei terrivelmente assustadora.

– Sim, mas essa não era a minha... – Calou-se, como se alguém lhe tivesse tirado as pilhas. Eu até podia ter começado a saltar de alegria por ele se ter calado, se não fosse o facto de dois minutos depois ter avistado o Fábio com uma cara de poucos amigos e um olhar fulminante dirigido a mim.

Corri até Alexandre e escondi-me atrás dele, na esperança de que o Fábio não me visse, mas foi em vão. A minha sorte foi o facto de Fábio ter ficado especado a olhar para Alexandre durante algum tempo, até este lhe dirigir o olhar. Estavam-se a avaliar, pensei, até que Fábio disse:

– Quem és tu e o que fazes aqui?

– Chamo-me Alexandre e sou colega de turma da Sofia.

– Por falar em Sofia... – Reparei na cara de Fábio, quando espreitava por cima do ombro de Alexandre. Estava com uma mistura de gozo, divertimento e fúria, se assim podia dizer. Aclarou a garganta e disse no tom mais sério que conseguiu, já que parecia estar a fazer um esforço enorme para não se rir pelo que tinha feito quando o vi. – Miúda, não penses que eu não te vi, sai de trás do teu amigo, ele não te pode salvar do que vais ouvir em casa.

Encolhi-me só de pensar no que me iria acontecer. Nota mental: ver se ainda há comprimidos para as dores de cabeça em casa.

Suspirei e tentei encontrar forças para sair de trás de Alexandre e dar a cara. Engraçado, naquele momento sentia-me segura com o Alexandre. Não sei bem como vos explicar, num momento ele é a pior criatura à face da terra, é uma criatura perversa, assustadora, mas ao mesmo tempo atraente e apelativa. Agora tinha virado um porto seguro, belo, protetor.

Isto é mesmo aterrador, eu sabia que havia pessoas que davam em malucas com a escola, mas não no primeiro dia!

– Fábio... que bom ver-te. – Disse a medo.

– Estás metida num grande sarilho, sabes disso, não sabes, Sofia? – Disse o Fábio, cruzando os braços por cima do peito.

Acenei e olhei de relance para Alexandre. Não parecia zangado, muito menos sério. Estava... descontraído, como... como se conhecesse o Fábio há muito tempo. Reparando que estava a olhar para ele, esboçou-me um pequeno sorriso, que me fez tremer e ficar quente. Senti-me corar.

Voltei a olhar para o Fábio. Depois lembrei-me.

– Como é que sabias que eu não estava em casa e como me encontrar?

Fábio sorriu.

– Bom, soube que decidiste "fugir", porque quando fui ao teu quarto não estavas lá como devias. Descobri onde estavas quando, por acaso, enquanto te procurava pela rua e parei num semáforo, reparei numa bicicleta azul com um cadeado vermelho.

– Sabes que aquela bicicleta não é única no mundo. E como é que a viste de tão longe?

– Quando olhei para o lado e vi o parque, lembrei-me que, por acaso, era um dos teus locais favoritos. Supus que aqui estivesses e decidi tentar a minha sorte.

Comecei ficar com calor com os nervos que sentia a aumentar dentro de mim. Senti a mão de Alexandre no meu ombro e tive de fazer um esforço para perceber o que ele dizia.

– Sofia, sentes-te bem?

– Eu... – Não consegui continuar, pois passei a ver tudo escuro e sentia-me leve. Ainda consegui ouvir o Fábio e o Alexandre durante os cinco segundos seguintes, antes de ser engolida pela escuridão.



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