Capítulo 30

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Estava a caminhar por uma floresta cinzenta, queimada. As árvores em meu redor estavam mortas e gélidas ao toque. A água de um rio muito idêntico ao da cascata, se não fosse até o mesmo, estava negra e coberta de sangue nas margens. Continuei a caminhar, a subir o pequeno planalto até ao topo. Estaquei ao encontrar aquele panorama. Era horrível ver aquela paisagem de guerra e sangue, de corpos espalhados e destruídos pelo tempo.

Eu usava um vestido branco e flutuante. Sentia os meus olhos diferentes, mais ardentes, como se aquilo que via mos tivesse a queimar e a destruir as córneas. Tudo à minha volta tinha uma cor estranha, morta. A guerra tinha afetado muito mais do que a gente que lutava e morria ali em baixo. Senti algo atrás de mim, o que me fez voltar.

Um homem, com os seus dois metros de altura, talvez, e de cabelo negro, como a própria morte, empunhava uma adaga na mão direita e um sorriso de triunfo, escondido por debaixo de uma barba mal lavada.

Olhei para baixo, para o meu vestido. Um fluxo rápido de sangue espalhara-se agora pelo tecido de um branco puro. Os meus olhos aterraram no homem de novo, aterrorizados. Não tive tempo de reagir para me desviar. O homem deu um passo na minha direção e baixou a adaga sobre mim, perfurando-me o peito, coberto de sangue, recriando aquele fluxo, mais uma vez. Sentia o sangue, espesso, a jorrar de mim.

Caí no chão, sem conseguir respirar, e muito menos falar. Os meus olhos, arregalados, fixaram-se no monstro, que agora assumira uma outra forma, mais imponente e mortífera. O sorriso manteve-se, mas a barba desapareceu aos poucos. Os olhos, cinzentos, alteraram-se, para um vermelho berrante e mortífero.

A última coisa que ouvi da boca dele foi:

– Nunca deverias ter existido.

...

Acordei de um salto e aos gritos. Estava toda suada, com a respiração e o batimento cardíaco muito acelerados.

Alexandre foi empurrado para longe, no meu ataque de histeria ao acordar. Tinha a preocupação estampada nos olhos.

– Tive um pesadelo, só isso, não te preocupes. – Tranquilizei-o.

– Um pesadelo, hãn? Conta-me tudo.

Olhei-o nos olhos.

– Porque queres que to conte?

Eu queria contar, mas também queria parecer forte. Um pesadelo não podia ser capaz de me fazer sentir desmoronar. Eu tinha morrido às mãos de um desconhecido com olhos assustadores.

– És importante para mim. Estás ao meu cargo.

– Sou um fardo para ti, é? Não sou mais do que uma missão para ti?

– Não. És o ser mais importante da minha existência, e eu já vivi bastante. Mas, se não confias em mim, não te irei forçar a nada que tu não queiras. Mesmo que saiba que sentes algo por mim, algo forte, e que não me irias recusar se eu quisesse.

Senti a minha face aquecer, devido à vergonha. Encolhi-me, abraçando as pernas e sussurrei:

– O teu ego está em alta, estou a ver...

Ele sorriu, com aquele típico jeito de ser dele.

– Estás a dizer-me que é mentira?

– Estás a gozar comigo? – Olhei para ele de frente.

– Não. – Olhou-me também diretamente nos olhos. – Só quero aliviar o ambiente, e quero ver-te mais descontraída.

– Lamento, mas o teu tiro está a sair-te pela culatra.

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