Um pouco de fogo

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Depois de um bom tempo encarando as folhas sobre o homem criei coragem para perguntar a Shun como iríamos acender o fogo. Assim que abri minha boca ele me silenciou com um Shh e eu fiquei meio irritada. Ele encarava algo pela frente com uma atenção especial, olhei para o outro lado do rio, Shun apontou mais ao longe e eu estreitei os meus olhos. Eu vi um vulto se aproximando. Shun agarrou meu braço e me puxou para atrás de um arbusto vermelho enorme.
Nos agachamos ali por um bom tempo em silêncio.
A figura começou a se tornar mais clara e eu vi uma lança enorme, era ele, o assassino, não tinha como confundir, a lança tinha um tecido branco com vermelho escuro amarrado na ponta, ela era diabolicamente linda, o ferro escuro brilhava com o menor feixe de luz. Como ele tinha pego a lança? Ele deveria ter se aproximado por trás depois de ter pego, mas ele estava do outro lado do córrego.
Ele chegou mais perto da margem e eu vi como ele era. As roupas marrom tinham manchas de sangue quase imperceptíveis, e pelo modo como andava graciosamente o sangue não era dele. Os olhos eram de um verde tão intenso que pareciam brilhar, os cabelos castanhos eram longos e lisos, desciam para além dos ombros que eram largos e fortes. Ele era definitivamente menor que o homem morto, deveria ser bem ágil. Ele entrou na água, seguindo em direção ao monte de folhas e galhos que fizemos sobre o corpo. Arregalei meus olhos. Ele iria fazer alguma coisa com a casca vazia que tinha sobrado, nós não tinhamos como impedir, ele tinha matado um homem daquele tamanho. O que faria com uma adolescente sedentária?
Encarei o monte, ele tinha que queimar de algum jeito. Queima, queima, queima! O assassino estava bem perto agora. Queima! Rezei para o sol. Que ele topasse em uma pedra no córrego. Que alguém se aproximasse. Queima!
Ele chegou ao corpo e no mesmo instante labaredas douradas surgiram sobre o monte, por um instante elas foram vermelhas então ficaram azuis. O assassino se afastou e olhou ao redor, ele bateu a lança no chão e seus olhos pararam bem no arbusto em que nos escondiamos, ele parecia encarar-me, olhos nos olhos. Evitei respirar ou mesmo pensar, como se ele fosse escutar o menor sussurro em minha mente. Suor frio escorreu por minha testa, pelo esforço anterior e pelo medo que se alastrava por cada recanto meu, aqueles olhos carregavam o terror. Um pássaro saiu cantando e ele desviou o olhar, tinha escutado alguma coisa. Ele sequer virou a cabeça quando saiu.
Ficamos por um tempo escondidos e quando Shun decidiu que já era seguro nos levantamos.
- Quem era aquele?
- Não sei. Mas definitivamente é o assassino.
Soltei o ar que tinha prendido por um bom tempo. Shun chegou mais perto do fogo.
- Qual era a raça dele?
- Não tenho como saber. Ele parecia humano, mas tinha algo sobrenatural nele. Temos que ter cuidado.
O fogo apagou. A combustão havia sido muito rápida e tinha queimado apenas o corpo, até mesmo os galhos e folhas estavam ali. Shun se abaixou e tocou onde deveriam haver cinzas.
- Shun, como o fogo acendeu?
Ele me encarou.
- Não sei. Pareceu...
- ...Mágica.
Completei para ele, que acenou. Ele encarou o vazio por um instante então ele abriu bem os olhos e me olhou.
- O que foi?
- Você é meio alf, certo?
Não. Sou algo que não sei o que é, e provavelmente algo inútil e esquisito. Concordei.
- Alfs têm poderes ligados à natureza. Talvez tenha sido você. Dei um passo para trás.
- Não tem como. Eu não fiz nada!
- Tem certeza? Não tem como ter sido eu. Não quis profundamente que o corpo queimasse?
Engoli em seco. Shun se levantou e chegou perto, muito perto, tanto que tive que virar o rosto para o lado.
- Você quis, não quis? E agora está com medo por algum motivo. Não sabe o quão incrível é descobrir seus poderes? Até mesmo alfs puros têm dificuldade, todas as raças têm. Alguns são obrigados a viver sem o privilégio de usar a própria magia. Isso é incrível. Você tem que aproveitar. Ainda mais com um poder como, como...
-...fogo?
Eu o encarei e mantive seu olhar. Ele concordou.
- Shun, não acho que eu tenha feito isso, e mesmo se tiver, não sei como. Então de que adianta?
Ele riu e agarrou meus ombros.
- Assim vai poder direcionar o seu treinamento para controlar o inscius e não descobrir. Tem uma grande diferença.
Eu bufei. Como poderia ser diferente se o tal poder ainda é desconhecido. Shun riu ainda mais.
- Eu sabia que você seria interessante!
- Como?
Ele me encarou.
- Pelos seus olhos.

◇•°•◇

Eu joguei a água em meu rosto e comecei a lavar as mãos. O sangue se misturou à água e não era possível saber qual era qual. Então lavei meu rosto novamente, assim que abaixei minhas mãos percebi uma coisa.
Meu indicador estava com uma linha preta e ramificada desenhada nele. Lavei o dedo com esforço, mas a linha não sumia. A examinei. Não era uma linha, pareciam... pareciam espinhos.

×××
Gente, acabei mudando o nome do cap. Mas o próximo vai ser sim A marca.

Ah. Feliz aniversário Milena!!!

Brighid

Cidade de Magia - Marcada por EspinhosOnde histórias criam vida. Descubra agora