Nomes em árvores

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Essa noite. Como eu faria aquilo? Jantar com estranhos, fingir que estou envolvida com Adam e ainda causar uma boa impressão, nem sei usar talher direito!
- Parece preocupada.
Olhei para Lark ao meu lado.
- Eu estou.
Sussurravamos duarante a aula.
- O que aconteceu?
Falei mais baixo.
- Não posso contar ainda.
Ele olhou de um lado pasa outro e falou apenas com a boca.
- E o julgamento?
É mesmo! Ele também sabia. Tarsa falou durante nossa admissão. Espalmei a mão e a balancei indicando desequilíbrio. Ele franziu as sombrancelhas e olhou para a frente. O imitei e quase simultaneamente Tarsa se virou, suspirei aliviada.

◇•°•◇

Até mesmo tinta a óleo seca, é o que minha mãe adorava dizer. E naquela tarde o óleo do meu quadro deveria secar. Eu iria ter uma tarde relaxante com Shun. Ah! Shun... só de pensar suspiros me escapavam.
Eu desci as escadas e na sala tinham mais pessoas do que eu esperava e uma delas era um vampiro sombrio que tinha me defendido no tribunal.
- O que foi?
As expressões deles mostravam certo receio. Claren girou no sofá para me olhar.
- Temos uma novidade!
Ela tentou soar animada, mas é claro que a verdade estava estampada no rosto dela e não dizia coisa boa. Britta bufou irritada.
- A quem quer enganar, Claren? Ninguém está muito feliz com a notícia.
Parei na sala.
- E qual é?
Britta cruzou os braços e as pernas.
- Seu treinador já foi determinado.
- Mas já? Mas...
Olhei para Trent, ele tinha dito que iria demorar até a próxima semana.
- Quem é?
- Akira, ele é um dos filhos de Sojobo, o rei dos tengu.
Tengu... Eram os homens pássaro.
- Isso é ruim?
Trent me respondeu um pouco indiferente.
- Nem tanto. Mas tengus são muito rígidos, você não pode falhar com eles, além disso não acho que seja muito bom você ser ensinada por uma criatura sem caráter.
- Como assim?
Claren respondeu.
- Eles não foram definidos como seres da luz nem das trevas. Já foram chamados de demônios em certos tempos e em outros de deuses. Têm o próprio senso de justiça e para eles é inviolável, se o burlar eles matam impiedosamente. Por isso muitos dos assassinatos são direcionados a eles como culpados.
- Mas... e o Conselho?
- Não tem poder sobre eles. Foi uma das condições para que saíssem do mundo humano.
- Então eles podem fazer o que quiser?
Britta riu.
- Não se preocupe, eles não saem matando sem motivos.
- E por que parecem tão preocupados?
- Akira não é exatamente o melhor mestre...
Claren tentou nos animar.
- Mas Trent disse que vai tentar assumir seu treinamento!
Olhei para ele curiosa.
- Mesmo?
Ele deu de ombros e pegou um biscoito na mesa de centro e o devorou.
- Para onde estava indo?
Claren pareceu notar que eu tinha um destino em mente antes de parar para a conversa. Ela soou suspeita. Não podia culpá-la, tinha passado as últimas noites fora sem nenhuma explicação, não sei como ela não tentou me amarrar com a personalidade que tinha.
- Estava indo ver Shun.
Os olhos dela brilharam por um breve instante.
- Oh! Sim. Vá! Não temos mais nada a dizer.
Eu sorri e acenei para todos correndo para fora da casa.
Lá estava ele, de costas encostado no baixo muro ao lado do portão de ferro.
- Olá!
Ele se virou.
- Oi.
Abri o portão e começamos a andar. Minha boca exibia um contínuo sorriso. Decidi inciar a conversa.
- Trent já sabe quem vai me treinar.
Ok, não era um assunto lá essas coisas. Eu estava ansiosa e ele geralmente demorava a começar um diálogo então falei o que tinha acabado de acontecer mesmo.
- Quem vai ser?
- Akira, filho de Sojobo...
Ele me interrompeu.
- Isso vai ser problema...
- Por que?
- Não se preocupe com isso agora. - Todos estavam fugindo daquele assunto? - E como vão as coisas com o fogo?
Ele me indicou e eu olhei para mim mesma.
- Mais nenhum incêndio.
- Andou treinando?
- Na verdade...
Olhei para o lado.
- É melhor treinar por si mesma antes de ter que enfrentar uma pessoa dizendo o que deve fazer.
Dei de ombros.
- Parece estar lidando bem com tudo...
Olhei para ele.
- Com tudo o que?
Ele encarou o horizonte enquanto falava comigo.
- Até pouco tempo vivia com os humanos e achava ser uma deles. Agora está entre tudo menos o que conhecia, viu um assassino, descobriu um poder, foi levada a julgamento por ele e condenada a defender a cidade dos contos de criaturas medonhas que surgem dos piores pesadelos.
Levei uma mão ao pescoço e a desci acompanhando os cordões e então agarrei os pingentes. Tinha mais, muito mais que isso e sinceramente não sei como não tinha ficado louca. Talvez, na realidade, achasse que aquilo tudo era um sonho, um longo e complicado sonho. Annie deveria estar na casa dela ainda com o namorado maluco, minha mãe deveria estar na sala dela, pintando os quadros mágicos e eu deveria estar na minha cama, bolando de um lado para outro com aquele sonho maluco. Olhei para Shun, era muito real. Não, aquilo não era um sonho. Fechei minha mão mais ainda em volta da chave, do medalhão e agora da cordinha. Dara estava fugindo de alguma coisa e eu estava ali apenas a esperando. Mas não mais somente a esperando. Eu tinha me envolvido naquele mundo, eu vi monstros, eu tinha sido derrotada, eu fraquejei, mas ainda viriam mais e não hesitaria. Olhei para a floresta vermelha, em algum lugar ali Marian estava confinada e eu iria descobrir. Notei algo estranho em um tronco.
- O que é aquilo?
Shun procurou entre as árvores.
- Onde?
Me aproximei e então eu vi. Tinha sido entalhado dois nomes. Dara e Eric. Poderia ser qualquer casal, até poderia se não fosse pela letra, por um pequeno detalhe, o d estava invertido e o último a estava ao contrário, apenas uma dara poderia fazer aquilo com aquela letra. Minha mãe. Mas se aquela era minha mãe então por que o nome dela estava gravado em uma árvore envolto por um coração junto a um nome que não era o de meu pai?

Cidade de Magia - Marcada por EspinhosOnde histórias criam vida. Descubra agora