O esqueleto

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Minhas pernas tremiam. Horrível, horrível, horrível. Ninguém faria nada? Todos pareciam muito ocupados admirando os corpos. Cobri minha boca com a mão direita enquanto a esquerda ainda estava segura pela estranha. Ela se virou para mim e contorceu o rosto.
- O que é isso?
O baixinho respondeu grosso.
- É claro que são corpos.
Ela não parava de me olhar.
- Eu sei, idiota. Eu to falando disso.
Ela apontou para mim, o baixinho também olhou. O que eles estavam vendo? Tirei minha mão da boca e me lembrei dos espinhos que cobriam meu indicador. Claro, mais algua coisa pra ela desconfiar de mim. Ela me soltou rapidamente como se tivesse pego em uma panela quente.
- Você foi...?
O baixinho ficou de frente para mim.
- Amaldiçoada?
- O quê? - olhei para meu dedo - Não! Claro que não.
O baixinho juntou as sombrancelhas.
- Então o que é isso?
Abri minha boca para dizer algo, qualquer coisa, mas não conseguia inventar uma mentira tão rápido.
Os sussurros aumentaram de tom, todos se viravam para uma mesma direção. O baixinho também desviou sua atenção de mim.
- Droga!
Pessoas abriram passagem e um cavalo pálido veio a vista, seguido de um homem encapado sobre uma carroça que rangia e protestava a cada giro da roda. Ele parou próximo à fonte e desceu. Sua figura era esquelética e quando ele se virou vi que seu rosto não possuia carne alguma, até mesmo as órbitas estavam vaziam. Cobri minha boca suprimindo uma possível tentativa de grito. Ele reapmente era um esqueleto, um monte de ossos que se mexia como se estivesse vivo, com tendões, músculos, órgãos e pele.
Ele entrou na fonte, sem se importar em ser molhado com água e sangue, pôs os ossos que compunham a mão em volta do cabo da lâmina que atravessava o tórax da mulher e o puxou com destreza e rapidez. O corpo caiu na água fazendo um splash bastante sonoro. O baixinho fechou as mãos em punho, ele realmente queria ver os corpos, deveria ser um louco ou ao menos ter uma empatia bem baixa. O esqueleto puxou o corpo pela água e o jogou sobre a carroça sem cuidado algum. Eu escutei um choro feminino distante. Ele logo voltou a agir, seguindo para o corpo do homem. Não vi o homem cair na água pois estava correndo, sendo levada por Lark dali. Olhei para trás e vi o chafariz parar de jorrar sangue como se uma ferida tivesse coagulado.

◇•°•◇

Nós estávamos ofegantes depois da corrida. Onde tínhamos ido parar? Eu não sabia, esperava que ele soubesse, não parecia ser perigoso nem era escuro como a região onde tinha enfrentado o wendigo, enfrentado não, dizer que o tinha enfrentado seria o mesmo que dizer que tinha lutado, que podia vencer, aquilo não tinha sido uma luta, eu deveria estar morta, ser apenas restos no intestino do bicho, mas o fogo tomou o controle, alguém que não eu, e foi esse alguém que destruiu o wendigo. Sim, era melhor pensar assim, eu não era uma assassina, não fui eu quem o matou.
- Escapamos por hoje.
Me voltei para Lark.
- Hoje?
- Eles estudam no memo lugar que nós. Ainda vamos nos ver, o que nos resta é orar para que não seja tão cedo.
Eu concordei.
- O que vocês fazem aqui?
Eu trinquei meus dentes com o susto. Lark se virou e eu olhei além dele, ali estava uma fada de cabelos verdes, Melissen.
- Vocês deveriam estar na turma!
- É que... - Eu comecei a falar. - Fonte. Esqueleto. Pessoas. A turma. Tarsa.
Saiu tudo misturado. Ela suspirou e apertou a ponte do nariz.
- Alf?
Ele explicou.
- Novos corpos foram encontrados na fonte e um deles era amigo de Tarsa, então todos foram apoiar ele e o Ankou apareceu.
- E vocês aproveitaram para fugir juntinhos. E eu que achei que vocês eram irmãos!
- Ei!
Eu protestei contra a acusação. Ela desviou os olhos para mim e eu olhei para o chão. Covarde!
- O que fazem aqui?
- Estamos fugindo de uma garota que quer nos interrogar.
Ela parecia desconfiada. Depois de alguns segundos suspirou e pareceu se render.
- Tarsa está bem?
Eu e Lark trocamos um olhar.
- Não sabemos.
- Mas ele parecia bastante abalado quando saiu.
Ela parecia estar preocupada. Resolvi tentar melhorar.
- Não se preocupe, todos estão lá com ele.
Ela confirmou e determinação fez seus olhos brilharem.
- Eles estão na fonte de Teresa?
- Não. Marvilic.
Ela pensou um pouco então voltou para nós.
- Voltem para casa, amanhã terão aula normal, mas estão liberados por hoje. Se encontraram os corpos é melhor que se tranquem em suas casas, a maior parte da cidade já deve saber, mas se virem alguém que aparente não saber o avisem, nesta noite mais dois irão ser levados.

Cidade de Magia - Marcada por EspinhosOnde histórias criam vida. Descubra agora