A chave

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Quando abri meus olhos minha mãe me encarava.
- Bom dia passarinho!
- Bom dia!
Eu sorri até que vi o cabelo vermelho dela e percebi que não tinha sido só um sonho. Ela se levantou e pegou a bolsa.
- Não temos muito tempo, pegue suas coisas, já estamos saindo.
Peguei minha mochila e saí atrás dela. Pagamos a estadia e fomos aos carros, passamos por vários e ainda não tinha visto o velho sedan. Dara entrou em um altima preto.
- Mãe, que carro é esse?
Ela sorriu majestosa.
- É o nosso carro, comprei ontem.
- Onde? Como?
- Tem uma cidade aqui perto e comprei o carro lá. Tinha umas economias. Agora, entre, temos que ir.
Assim que me sentei o cheiro de carro novo me invadiu, o banco era vem confortável e já na estrada Dara dirigiu usando todos os cavalos que o altima dispunha.
Existem muitos momentos da vida em que paramos para pensar em tudo o que já fizemos e fomos, quando olhei para minha mãe que dizia que eu e ela éramos diferentes de todos passei a pensar em minha ínfima existência, como eu era minúscula, como eu era apenas mais uma no meio de centenas e milhões e bilhões de pessoas, e como eu me sentia pequena, uma pequena criatura diferente, eu não me achava diferente de ninguém, não tinha nada de especial, mas minha mãe dizia que sim. Do que estávamos fugindo? O que a amedrontava e fazia mudar sua aparência?
- Chegamos!
O nome da cidade era Lisian, na placa de boas vindas dizia que era a cidade de preservação histórica mais preservada. E era, todas as construções pareciam velhas como um vulcão adormecido, e eram lindas e magestosas, Dara parou em frente a um velho restaurante, parecia uma mistura de café de Paris com restaurante italiano. Descemos do carro e fizemos o desjejum, a comida era tão boa quanto aparentava, as pessoas que andavam pelas ruas pareciam saídas de um filme antigo, daqueles mudos, muitos homens de terno e muitas mulheres com vestidos, minha mãe disse que a todos da cidade procuravam emoldurar ainda mais a imagem do lugar, a sensação era incrível e eu me sentia nostálgica. Depois de um período observando os habitantes levamos o carro ao estacionamento de Lisian, era proibido a circulação de meios locomotivos que não bicicletas ou o bonde no interior da cidade, imaginei como aquilo deveria incentivar uma melhor saúde para todos. Caminhamos até o hotel que tinha muitos empregados no salão de entrada, alugamos um quarto e um homem de uniforme vermelho e azul carregou nossas bolsas, que não eram muitas, apenas minha mochila e uma mala de mão da mamãe, ela não largava a bolsa dela e mesmo dirigindo ela permaneceu em seu colo, me perguntei o que haveria ali dentro, mas logo me esqueci deixando-me levar pela beleza da arquitetura e decorações do hotel.
O quarto mais parecia um apartamento, tinha um tipo de salinha com varanda e duas portas para dois quartos diferentes, um para mim e outro para ela, a cama era gigantesca e deitar nela era um deleite, logo entrei no banheiro particular, tinha uma banheira clássica, um vaso e pia, nada de ducha, me peguei calculando quanto tempo levaria para encher a banheira, me detive apenas por sentir a necessidade de saber afinal o que deveria fazer, não precisei falar nada ao entrar no quarto de Dara.
- Amanhã irei levá-lá a uma casa nesta cidade, é a mais nova e mais acabada, toda de madeira e enorme, parece abandonada e algumas ervas invadiram o interior, você terá duas coisas, a primeira é essa chave.
Ela me entregou um cordão com uma chave, ela era prateada e pelo modelo podia ver que era antiga, tinha vários padrões gravados nela.
- Nunca perca essa chave, não a quebre nem entregue a ninguém, ela é muito importante, sua vida pode depender dessa chave, ande sempre com ela, irá abrir todas as portas importantes. A segunda é o medalhão.
Ela tocou o medalhão oval que usava sempre, ele era predominantemente prateado, havia pequenos detalhes no adorno dourados e várias pedrinhas violeta incrustadas, no meio formava-se uma imagem de uma flor, eu nunca reconheci qual era, parecia uma mistura de hortênsias com rosas e peônias, era lindo, eu nunca vi o que havia dentro.
- Ele era de sua avó, e ela me deu quando fiz vinte anos, assim que engravidei de você, disse que iria me proteger, e protege. Darei ele apenas amanhã, ainda preciso dele. Você vai colocá-lo e nunca tirar, também não poderá abri-lo, a não ser que sinta que precisa, não por curiosidade. Se for para abrir você sentirá e saberá disso como se estivesse escrito em sua alma.
Ela acariciou meu rosto e uma lágrima escorreu de seus olhos azuis.
- Quando você chegar do outro lado, procure por Brittany, diga que a Adara a mandou, que você precisa da mesma ajuda que eu, que o previsto aconteceu mais cedo. Ela vai te ajudar, te acolher e explicar quase tudo o que eu não posso. Vai saber que é ela porque quando a chamar de Brittany ela vai fazer uma cara de ódio, ela é um pouco baixinha, os olhos são cinza, ela vive pintando o cabelo.
Ela tremia muito e eu comecei a chorar entendendo finalmente que eu iria sozinha. Eu abracei minha mãe como não fizesse isso a anos.
- Assim que você passar pela porta ande direto até encontrar uma linha ferroviária, siga ela pela esquerda, na estação você pergunta sobre a loja de tecnologias externas, a Brittany é a dona.
Começamos um coro de lágrimas e choramos até que a fome fosse grande demais para ignorar

Cidade de Magia - Marcada por EspinhosOnde histórias criam vida. Descubra agora