Capítulo 21

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"Eu não posso parar está doença que toma conta

Ela assume o controle e me arrasta para lugar nenhum

Eu preciso de sua ajuda, eu não posso lutar contra isso para sempre

Eu sei que você está assistindo

Eu posso sentir você lá fora...".

My demons - Starset.

Abri meus olhos me sentindo atordoada, minha cabeça latejava e meu corpo parecia estranhamente leve. Bips irritantes soavam ao meu redor e, quando tentei mover minha mão, uma dor horrível se espalhou por todo meu braço. Ajustei melhor minha visão e comecei a avaliar o cômodo onde eu estava. As paredes eram brancas e não havia decoração nenhuma, exceto pela TV na parede, a única luz que iluminava o quarto vinha de uma janela ao lado da cama onde eu estava deitada, que era ladeada por monitores e um suporte para soro. Uma cômoda com um jarra de água estava do outro lado da sala e logo ao seu lado uma porta, onde possivelmente seria o banheiro. Ninguém seria burro o suficiente de me trazer para um hospital, então provavelmente eu estava em alguma clínica particular.
Deixei meus olhos vagaram aleatoriamente e eles se voltaram para a poltrona ao lado da cama onde Jason dormia, minha mente estava tão dispersa que eu nem sequer tinha notado ele ali. Mesmo parecendo relaxado, seu rosto estava cansado e abatido. Quantos dias será que fiquei aqui? Me mexi novamente para tentar me sentar, mas a dor em meu braço me fez ver manchas vermelhas, fazendo com que eu voltasse a me deitar.
-Você não pode fazer força. - disse Jay ao meu lado, a voz rouca de sono. - Acabou de acordar e já quer aprontar?
Me virei para ela assustada, seus cabelos estavam um pouco bagunçados e havia um sorriso em seu rosto, um pouco de alivio também.
-Pensei que estivesse dormindo. - falei com a voz rouca.
Minha garganta arranhou com as poucas palavras, como se minhas cordas vocais não funcionassem a tempos. Fiz uma careta pelo incomodo.
-Quer um pouco de água? - perguntou Jay.
Apenas assenti, não muito disposta a falar alguma coisa sem molhar minha boca que parecia estar com gosto de serragem. Jason se levantou e andou até o outro lado do quarto, trazendo um copo já cheio e a jarra. Ele me entregou o copo e ficou sentado segurando a jarra, assim que a água molhou meus lábios foi como um alivio instantâneo e, sem que eu notasse, já pedia para Jason encher meu terceiro copo.
-Vai com calma ai. - falou sorrindo quando terminei mais um.
-Parece que faz séculos que não bebo água. - falei entregando o copo para ele. - A quanto tempo estou aqui?
Jason colocou o copo e a jarra em uma mesinha ao lado da minha cama e se ajeitou melhor na poltrona.
-Pouco mais de um dia. - falou. - Derek te trouxe para cá de madrugada.
Me recostei na cama, ficando na posição mais confortável que os tubos enroscados em mim permitiam.
-O que aconteceu? - perguntei.
Jay arqueou a sobrancelha.
-Você não se lembra? - perguntou.
-Lembro que lutamos contra uns caras, eu levei um tiro e... - forcei minha memória. -Que depois que estava tudo bem eu desmaiei.
Ele passou a mão no cabelo, os bagunçando ainda mais.
-Por sorte o tiro foi de raspão e você não levou mais que alguns pontos. Havia alguns ferimentos da luta que você não deve ter notado e o corte de uma faca na sua perna. - falou com a testa franzida.
-Mas só isso não me faria desmaiar. - comentei.
Eu era difícil até mesmo em ficar doente, pior ainda em desmaiar.
-E não foi apenas por isso. - falou com uma carranca. - Ao que parece, má alimentação, falta de sono e uma grande carga de estresse sobrecarregou você. Já estava no limite da exaustão e seu corpo não aguentou.
Mordi o lábio sentindo seu olhar fulminante em mim.
-Não me olhe com essa cara. - falei.
-E que cara seria essa, Kyle? - perguntou com a expressão séria.
Merda! Se Jay estava tão sério daquele jeito eu realmente estava encrencada.
-De louco da vida.
-E você queria que eu estivesse como? - silvou para mim. - Já te falei umas mil vezes para não se sobrecarregar com esses assuntos, que não está nesse barco sozinha e mesmo assim ainda teima comigo e pula pra ação sem nem pensar duas vezes.
-Eu não quero você envolvido nisso. - falei olhando em seus olhos castanhos. - Quero que você tenha uma vida tranquila.
-E você acha que não quero isso pra você também? - perguntou consternado. - Ou pra Samira e pro Derek? Eu perdi tudo e vocês são a única família que tenho. Você é como uma irmã pra mim Kyle, prefiro perder uma perna ou um braço a ver você morrer e sei que se sente assim em relação a mim e a Sam, e as outros também. Sei disso por todas as coisas que já fez por nós.
Engoli em seco enquanto ele bagunçava os cabelos, nervoso.
-Enfia logo nessa sua cabeça dura que somos um time. - falou. - Se um cai todos os outros vão junto.
Ele sorriu enquanto apertava minha mão encima da cama. Jason geralmente era o mais na dele quanto a sentimentos, não era exatamente tão retraído quanto Samira e eu, mas também não mais aberto, demonstrava afeto apenas pelas pessoas mais próximas e tinha certa dificuldade em se expressar, ainda mais com seu gênio forte.
-Acabou seu monólogo de briga? - perguntei deitando a cabeça de lado.
Ele estreitou os olhos para mim, mas logo depois sorriu.
-Cala boca. - falou. - Não sabe o quanto fiquei preocupado com você quando Derek ligou, eu vim de pijama para o hospital.
Olhei para ele me sentindo um tanto culpada. Eu realmente não havia parado nem um pouco nas últimas semanas, minha alimentação era o que eu achava para comer no caminho e o sono era mínimo, ainda mais que a maioria das vezes que eu parava para fechar os olhos, era dominada por alguma lembrança que eu não estava nada a fim de reviver.
-Desculpa fazer você passar por isso. - falei apertando sua mão.
Tentei o máximo transmitir a sinceridade das minhas palavras naquele aperto, o que ele percebeu, retribuindo o gesto.
-Família serve para isso.
Uma cabeça com curtos cabelos loiros escuros se esgueirou pela porta, espiando ao redor com cautela até encontrar meu olhar e um grande sorriso se espalhar por seu rosto.
-Posso entrar? - perguntou.
-Claro, Adam. - falei sorrindo.
Ele entrou fechando a porta com cuidado. Seu cabelo estava um pouco bagunçado, mas o terno cor de chumbo estava impecável como sempre, o que me indicava que ele estava indo ao trabalho ou tinha feito alguma pausa. Em sua mão direita havia um lindo vaso orquídeas roxas, uma das minhas flores favoritas.
-As flores são lindas, - comentei enquanto ele colocava o vaso na mesa ao lado da cama e dava um beijo em minha testa. - mas cadê os meus chocolates?
Vi seu corpo vibrar em uma risada enquanto ele se afastava.
-Você e Samira foram irmãs em outra vida, só pode. - falou ajeitando o cabelo. - Nunca vi duas mulheres para gostarem tanto de chocolate quanto vocês.
-Os chocolates na minha opinião são os mais importantes e não se deve discordar dessa lógica.
Adam se virou para Jay que apenas ri em sua cadeira enquanto assistia nossa conversa.
-Como você aguenta isso todo esse tempo? - perguntou para ele.
Jason deu de ombros enquanto se apoiava nos braços da cadeira.
-Viver com duas mulheres estressadas que poderiam virar Hitler na TPM? - perguntou. - Irmão, chocolate era o primeiro e mais importante item na lista de compras.
Nós três rimos.
-Por falar em estresse... - falei olhando a porta. - Cadê a Sam?
-Ela teve que atender uma ligação. - falou se sentando na beira da minha cama. - Está três vezes mais estressada que o normal hoje, então a ideia do chocolate poder ser boa... Ainda mais que não quero que ela esteja assim no nosso jantar.
-Jantar? - perguntei arqueando a sobrancelha.
-Hoje é dia dos namorados. - falou jogando uma luz na minha mente perdida. - E...
-Aniversário de namoro de vocês. - completei.
-O cara sobreviveu quatro anos ao temperamento da Samira. - falou Jay sorrindo. - Ele é um herói.
Comecei a rir bem no momento que a loira em questão entrou no quarto, Samira nunca fazia cerimônias.
-Falavam de mim? - perguntou com um enorme sorriso.
-Como se não tivéssemos mais nada de importante sobre o que falar. - falou Jason com sarcasmo.
Ela o ignorou ele e andou até mim, me dando um abraço leve de modo que não puxasse nenhum fio.
-Eu devia bater em você. - falou se afastando. - Já falei que ainda vai me deixar de cabelo branco um dia.
-Relaxa, Sam. - falei a tranquilizando. - Já disse que adoro seus cabelos e não quero que isso aconteça tão cedo com você.
-Não é isso que parece ás vezes. - falou me dando seu olhar reprovador.
-Ei, eu não estava lá sozinha. - falei erguendo as mãos o máximo que pude. - O D estava comigo quase o tempo todo.
-E ele já levou uma descascada enorme lá fora, então cala boca e me escuta que agora é sua vez. - falou de cara fechada. - Sei que você é boa no que faz e blá, blá, blá, que vocês dois tiveram treinamento desde criança e são melhores e mais experientes na luta do que eu jamais serei, mas vocês dois tem que parar de ser tão loucos e pular com tudo nessas lutas, estão querendo morrer? - perguntou e não me deixou responder. - Como mais velha, eu sempre vou me sentir responsável por você e não estou a fim de receber no meio da noite dizendo que eu tenho que ir reconhecer um corpo, então é melhor criar juízo e pensar bem em cada passo seu.
-Ahn... - sorri para ela. - Mas eu sempre faço isso.
Sam também estava arrumada para o trabalho, o vestido azul escuro destacava suas curvas de modo sensual, mas não provocante, o blazer branco estava dobrado em seu braço e o cabelo amarrado em um rabo de cavalo dava um ar mais sério a ela. Sam geralmente era tranquila, quando não estava de mau humor, então para estar falando daquele jeito comigo, o negócio devia mesmo ter sido sério.
-Eu sei, por isso estou falando.
Eu não podia ficar brava com eles por brigarem comigo, passamos parte da nossa vida cuidando um do outro e isso não era algo que iria mudar, não importava o que acontecesse. Sorri para eles, mesmo que eu passasse a maior parte do meu tempo preocupada em fazer o melhor para que eles ficassem seguros, não podia evitar em ficar emocionada toda vez que eles demonstravam, com brigas ás vezes, o quanto eu era importante na vida deles.
-Para de nos olhar com essa cara, - falou Jason olhando para mim. - sabe que amamos você.
-É claro que sei. - respondi prendendo o riso.
-Nem um pouco convencida.
-Aprendi com quem? - desafiei sorrindo.
Adam sorria nos olhando mais do canto, já estava acostumada a nosso jeito não muito sentimental de demonstrar carinho.
-Eu tenho uma reunião em meia hora, então preciso ir. - falou andando até mim e dando um beijo na minha testa. - Melhoras pra você viu, e não tente nada estúpido.
-Não posso prometer, mas vou tentar. - falei sorrindo. - Compre os chocolates suíços, são os favoritos dela.
Ele se afastou me olhando sem entender. Adam geralmente era bem rápido para captar as coisas, mas tinha vezes também que sabia muito bem como ser lerdo.
-Me agradeça depois com uma caixa de bombons. - falei dando uma piscadela.
Ele sorriu, deu um toque na mão de Jay, um beijo em Sam e saiu.
-O que estavam cochichando? - perguntou Samira com curiosidade.
Jay e eu trocamos um olhar e ele sorriu, parecendo entender qual tinha sido nossa conversa.
-Disse que ele tava me devendo chocolates. - falei com simplicidade. - Sou a cunhada de consideração que ele tem que aguentar, então... Aproveito para explorá-lo.
-Podia ter me falado que eu ajudava você. - falou. - Eu mataria por uma caixa de chocolates nesse momento.
-Só nesse momento? - perguntou Jay com a sobrancelha arqueada.
Samira deu um tapa em seu braço, o que deve ter doido, porque ele resmungou de dor. Ela podia falar que não era tão boa na luta, mas tinha uma força que ás vezes me dava medo.
-Ter fome não é nem um crime. - resmungou.
-Se fosse você seria condenada à prisão perpetua.
Não me contive e comecei a rir, o que fez com que meu corpo todo doesse, ainda mais meu braço que começou a latejar com o movimento. Fiz uma careta, fazendo com que Jason e Samira parassem de discutir e olhassem para mim.
-Ta tudo bem, Ky? - perguntou Sam.
-Estou apenas com um pouco de dor, nada demais.
-Vou chamar uma enfermeira. - falou Jason se levantando.
-Não precisa. - falei.
Ele parou na porta e olhou para mim.
-Claro que precisa. - falou. - Já que está aqui, vai aproveitar esse tempo para descansar. Não adianta nem insistir, isso é para o seu bem.
E não adiantou mesmo, assim que a enfermeira e o médico, que devo acrescentar que era um loiro muito bonito, charmoso e que parecia simpático até demais, terminaram de me examinar e conferir os fios e aparelhos, eu já me sentia sonolenta e mal conseguia manter meus olhos abertos.
-É apenas um efeito do medicamento. - falou o médico com sua voz rouca. - Agora você precisa descansar.
-Mesmo se eu quisesse ficar acordada duvido que esse maldito remédio deixaria.
-Calma, querida. - falou com a voz calma e um sorriso um tanto perturbador, ou talvez fosse o efeito do remédio me causando alucinações. - Tudo vai acabar bem rápido.
Não tive consciência de muita coisa, apenas o vi se aproximando de mim enquanto eu era puxada para o mundo dos sonhos.

*****

Acordei com o barulho de algo se quebrando dentro do quarto. Por um momento, pensei que Jason tivesse esbarrado na jarra encima da mesinha ou que eu mesma tivesse puxado algum fio e derrubado o soro, mas quando olhei para a poltrona ele não estava lá e o soro estava no mesmo lugar em que me lembrava. Eu não estava uma das pessoas mais coordenadas no momento, não apenas por estar quase amarrada naquela cama, mas por causa daquele maldito remédio que o médico tinha me dado. Eu me sentia como se tivesse bebido muito na noite anterior e agora estivesse com a pior ressaca do mundo. Passei a mão no rosto, em uma vã tentativa de afastar a nevoa do sono, o que não teve lá muito efeito. Quando toquei meu pescoço senti um peso diferente, eu geralmente usava o colar que meu irmão tinha me dado, mas o que agora estava no meu pescoço não era ele, eu já usava aquele colar a tempo suficiente para reconhecê-lo até de olhos fechados.
Ele era um pouco menor que meu colar habitual e seu pingente era em formato de coração, um pouco grosso e pesado, de prata e com uns detalhes entalhados que quase pareciam ser pedrinhas. Ele era lindo, uma joia única. Levei meus olhos para um movimento do outro lado do quarto, divagado, e vi dois homens... Lutando? Eu não sabia dizer muito bem, além da minha mente estar um pouco enevoada pelo sono e pelo remédio estava um pouco escuro. A pouco luz que entrava no quarto me permitia ver um pouco do perfil deles, um tinha cabelos escuros e pelo que eu conseguia ver, olhos aparentemente claros, sua forma de se mover me era familiar... Carter? Eu não podia ter certeza. O outro era loiro e tinha uma barba bem feita, vestia um jaleco branco e... Aquele era o meu médico?
Fiquei apenas olhando os dois homens lutando pouco menos de um metro da minha cama, eu não podia fazer muita coisa além de olhar os golpes e escutar as coisas se quebrando pelo caminho. Posso ter dado uma cochilada por um momento, porque quando pisquei novamente o homem que parecia Carter dava uma chave de braço no pescoço do cara que já ficava vermelho e em um movimento preciso e muito bem calculado, escutei o estalo do pescoço se quebrando. Olhei o corpo do médico ser jogado de lado no chão, já completamente flácido enquanto o outro homem andava pelo quarto.
Podia ter sido apenas uma dedução, mas o cheiro de perfume me entregou que era realmente Carter que estava ali, não tinha como eu esquecer aquele cheiro. Ele andou até a cômoda do outro lado do outro lado da minha cama e pegou uma bolsa marrom que eu tinha certeza que não estava lá antes de eu dormir. Em seguida, andou até a minha cama e com delicadeza, começou a desconectar todos os fios que estavam ligados a mim e os colocou de lado.
-Preciso tirar você daqui. - falou.
Estremeci um pouco quando ele tirou a agulha, posso suportar um monte de coisas, mas odeio agulhas ainda mais do que hospitais, o que me faz perguntar porque eles me trouxeram para cá ao invés de me levar para o galpão, eu podia me curar lá também. Com cuidado, Carter me pegou no colo e fez com que eu passasse os braços envolta do seu pescoço, de uma maneira que eu ficasse confortável.
-O colar é lindo. - murmurei contra seu pescoço.
Meus pensamentos estavam desconexos e eu não conseguia me concentrar em nada por muito tempo, ao que parecia, aquele médico devia ter me dopado com uma dose extra forte. Eu não tinha um controle exato do meu corpo e isso era angustiante.
-Fico feliz que gostou, bonequinha. - falou sorrindo. - Mas agora preciso tirar você daqui.
-Pra onde vai me levar? - perguntei com a voz baixa.
-Para um lugar seguro. - respondeu.
Eu estava fraca demais para discutir, então apenas deitei a cabeça em seu ombro e deixei que ele me levasse para sabe-se lá onde fosse seguro.

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Nota da autora:

Olá pessoal, desculpe a demora para postar, mas devido ao tempo corrido e um infeliz bloqueio criativo, eu não estava conseguindo escrever. Como sabem eu posto duas histórias, então nem sempre da tempo de escrever as duas.
Bem, finalmente chegamos a 4k 🎉🎊🎉🎊🎉🎊🎉🎉 Não sabem o quanto fiquei feliz ao ver isso, ao perceber o tanto de pessoas que estão se dispondo a ler AS.
Como comemoração aqui esta o cap, desculpem algum erro e se não ficou o melhor dos meus caps, mas estou com uma gripe forte e está difícil me concentrar, mas por vocês eu fiz um esforcinho kkkkkk
Bem, era isso... Mais tarde vai ter uma postagem especial para vocês, então...
Espero que gostem.

Boa Leitura!

Legado de Sangue - Irmandade - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora