Tentativas de trabalhar a escrita, através de temas variados, textos curtos, sem grandes compromissos, sem prazos ou metas, apenas aproveitando qualquer inspiração que surgir.
Também posso revisitar algumas histórias ou poemas meus, publicadas em ou...
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Moema nunca tinha conhecido o mar. Nascida e criada no interior do Mato Grosso, também nunca perdera muito tempo pensando nele. Havia grandes rios em sua região, onde podia banhar-se e refrescar-se após a lida na roça. Pra quê mar? Para ela era apenas uma palavra que aprendera na escola e que via aqui e ali em forma de imagem na televisão, ou em alguma foto de revista. Sua vida era o sol, era a mata, era o rio, era a fruta pega diretamente do pé da árvore. Moema era sertão.
Quando fez 23 anos de idade, a vida da solitária Moema ficou ainda mais solitária. Os pais que já eram bem velhinhos desde sempre, finalmente despediram-se do mundo. Para Moema nada restou, além de uma roça bem feita e um cachorro tão magro quanto ela. Era filha única e temporã. Sempre preocupada com a saúde frágil dos pais e com os muitos afazeres, nunca perdera tempo pensando em amores e dispensou todos os corajosos pretendentes que ousaram se aproximar. Naquela altura de sua vida, Moema era solidão.
Logo após a morte dos pais, precisamente uns três meses depois, Moema descobriu que família que não se conhece, ainda é família. Uma prima distante, do qual o pai nunca falara, de repente entrou em contato. De fato, notícia ruim corre longe e vai rápido. A tal prima apareceu, lhe deu um abraço apertado e lhe fez uma oferta: que Moema fosse viver com ela no litoral, ela era também solitária e apreciaria a companhia. Moema olhou para o pequeno terreno seco a sua frente, a pequena casa onde vivera toda uma vida. Teria coragem de abandonar tudo o que conhecera e partir para viver uma vida que nunca sonhara? Moema era feita de indecisão.
-Posso levar o cachorro?
-Pode.
Empacotou os poucos pertences e uma foto tirada com os pais a pouco tempo atrás. O terreno a prima tratou de vender por ela, que só assinou os papéis. Deu uma última olhada para trás, respirou fundo o ar seco da região, prendeu o cachorro numa gaiola de transporte (ele não gostou muito do tratamento recebido e deixou isso claro ao latir chorosamente o caminho todo) e entrou no carro que a prima alugara na cidade. Aquela Moema era um adeus sem dor.
A prima morava em uma cidade grande, em um prédio grande, mas em um apartamento pequeno. Da janela, que era bem alta, Moema podia ver e ouvir o mar. Que espetáculo! A morena ficou fascinada e assustada. A teoria nada se aproximava da realidade. Tanta água assim, num lugar só, não parecia certo. Será que era de verdade ou ilusão de ótica? Moema era curiosidade.
Desconfiada e temerosa, aceitou um dos muitos convites da prima para irem a praia. Já fazia uma semana que estava ali naquele lugar apertado. Sem saber direito o que fazer da vida. Longe de tudo o que conhecia. A maior parte do tempo sozinha, enquanto a prima saía para trabalhar. Difícil saber quem andava mais miserável, se ela ou o cachorro. Moema era vazio.
O cachorro ficou no apartamento e ela foi com a prima ver o mar. Com um biquini emprestado, envergonhada e atarantada de ver aquele povo todo seminu. De perto o barulho do mar era ainda mais forte, e vinha uma brisa gostosa que lhe afagava a pele. A sua frente o azul se espraiava, ora em ondas fortes e pungentes, ora em pura calmaria. Então isso era o mar. Sem tirar os olhos daquela imensidão à frente, e com os pés firmes enterrados na areia, Moema era fascinação.