Capítulo 26 (revisado)

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Eu não gostava de praticar a expressão "emburrada", nem por isso conseguia evitar. É inevitável esconder o desagrado, mas lá estava ele, exibindo-se em minha face. 

-Você parece o tipo de garota que lê muito- diz Ozônio.

Sim, ele se apresentou como Ozônio. E além da besta ele trouxe um vira lata chamado Óxido. E é muito inteligente e talvez um pouco inconveniente, já que fez muitas observações desde que chegou. Ele me analisa atentamente enquanto enrola uma mecha do cabelo longo e encaracolado. 

-Você acha? pergunto sorrindo, ele com certeza sabe ler as pessoas. Disse coisas sobre Daryl que não o agradaram em nada e ele ficou incomodado o bastante para invadir a mata sozinho. Mas eu confiava em suas habilidades e que ele voltaria. Por mim. Não é assim que se diz adeus, mandando à merda o cara que o ajudou .

Ele senta no banco ao lado da minha cadeira. Eu estava jogada em cima de um exemplar de "O theorema Katherine", tentando entender uma equação. Sem sucesso. O livro fora presente de Ozônio, direto de sua estante particular.

-Ou disso ou gosta de equações complicadas.

Fiz uma careta.

-Matemática nunca foi o meu forte- assumo.

Ele da um sorrisinho torto

-Nem o meu.

-Você parece o tipo de cara extremamente inteligente, matemática, português, biologia, nada é problema pra você.

-Você acha? Ele devolve a pergunta com deboche.

-Não. Eu sei.

Ele sorri.
Eu também. Estou certa.

-Está disposto a abrir mão do conforto da sua casinha para fugir? Pergunto.

O sorriso perde o rumo em seu rosto.

-Não quero mais ser um deles. Não quero estar aqui, 

-Eles são assim tão maus ?

Ele pensa um pouco.

-Eles só não são...descentes. Quer dizer, a filha do Gabriel meteu o pé na sua cara. E ela tem o que? Doze anos?
Ele ri timidamente.

-O que eles fazem aqui? De verdade.

Ele olha para a janela, detrás das árvores se pode ver uma parte do complexo do presídio.

-Eles recrutam- ele leva as mãos até a cabeça e faz si nal de aspas- pessoas para se juntar a eles.

-Qual o objetivo de tantas pessoas? A maior parte deles nem está apta para combater zumbis.

-Eles precisam de pessoas para várias funções. Estar aqui é levar uma vida de escravo. Cada uma das pessoas que eles capturam tem duas opções: Luta na arena e prova que pode ser boa em alguma coisa ou morre e vai para o muro.

-O muro?

-Nas partes cegas do presídio existem muitas falhas na segurança, como eles não tem tanto pessoal preparado para defender o lugar assim, eles usam os zumbis. São acorrentados como os da arena e ficam presos ao muro para impedir a passagem de inimigos. Não da para ver daqui, porque este lado é melhor protegido por guardas.

-Nossa -digo chocada.

-Eu sei. É assustador.

-Não. É inteligente. Eu subestimei esses caras, eles são realmente espertos.

Ozônio da de ombros.

-Por que quer tanto sair daqui? pergunto- Quer dizer, eu entendo que o que eles fazem é horrível, é cruel. Mas é a sua casa. Você disse que sua família está aqui. 

-Isso não vem ao caso agora. O que importa é que está escurecendo e temos de ir.

-Viajar a noite não é uma ideia boa- afirmo- Já ficamos aqui o dia todo, porque não podemos esperar mais um pouco?

-Não temos escolha. Eles vem atrás de vocês pela manhã, temos de estar longe.

-E quanto a você? Não vão sentir sua falta ?

Ele sorri novamente.

-Não. Eu sou ninguém para eles. Assim como a camada de ozônio.

Solto uma gargalhada.

-Então é dai que vem o apelido?

-Talvez -responde.

Ouço um barulho na entrada, em seguida Daryl aparece com a cara pra dentro.

-Temos problemas.

Ozônio levanta e me estende a mão. Agarro-a e acompanho ele até o telescópio onde Daryl já está procurando alguma coisa.

-Onde? Pede Ozônio.

-Ao Norte, trezentos metros.

Ozônio ajusta os ângulos e mira no local descrito por Daryl. Quando olha de volta para nós, sua expressão é de pânico.

-O que? Pergunto. -O que você viu ?

Ele não fala. Daryl não responde. Decido ver por mim mesma. Luto um pouco para chegar ao objetivo mas quando o encontro , percebo que não queria tê-lo visto.

-Zumbis.

É tudo o que consigo dizer.
Dezenas deles se esgueirando por entre as árvores, talvez atraídos pela confusão no presídio, pessoas correram pela mata o dia todo a nossa procura. 

-Vamos- alguém diz. Não sei qual dos dois é. Óxido late ao pé da árvore mas ninguém ordena que se cale. Estamos todos em choque.

-Tenho suprimentos escondido pelo caminho todo daqui até a estrada principal. Vamos partir agora, não podemos perder tempo.

-É mentira- digo rapidamente.

-Não, é verdade. Estão por toda parte.

-Não, nisso eu acredito. Mas é mentira que você não seja valioso. Você deve ser um membro muito importante, para ter conhecimento sobre todas as falhas e os pontos fortes. Rotas, segurança, armas. Você é com certeza uma parte crucial daqui.

-Podemos discutir isso no caminho- responde ele colocando a mochila das costas.

-Não vou engolir sua história- informei.

-Ah ela vai sim- intromete-se Daryl- Ela sempre engole. 

Ignoro a vontade de empurra-lo escada abaixo e passo à sua frente descendo pela escada de madeira. Ozônio vem em seguida e desprende o cão da coleira que o prendia, os dois parecem conhecer muito bem um ao outro, e também confiam plenamente. Diferente de Daryl e eu. Humanos. Incompatíveis.

DIXON - No Fim Do Mundo Onde histórias criam vida. Descubra agora