Capítulo 51 (revisado)

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Eu sempre soube que Daryl me encontraria. Mas essa foi a parte fácil de deduzir, ele era um caçador, um rastreador, essa era a parte fácil para ele. A parte difícil, era quase impossível, e mesmo assim eu mantive as esperanças. Como todo homem realista, Daryl precisava ver para crer, o que dificultava as coisas perante a situação. Fosse como fosse, a situação era desesperadora. E mesmo assim eu acreditei que tudo pudesse dar certo.

Quando Carl me encontrou semi morta no leito do rio nem eu mesma acreditava na minha sorte. Como eu poderia sobreviver depois de descer o rio em cima de um pedaço podre de madeira? Mas havia algo que eu questionava mais. Como pude sobreviver a uma mordida? A mordida geradora da infecção. A infecção geradora do pânico. O pânico gerador do caos, que destruiu a terra.  É claro que não contei a ele que havia sido mordida, estava confusa, mas não era burra. Ninguém acreditaria em mim e não era saudável fazer papel de louca. 

 Depois de anos tentando entender a rejeição de minha mãe comigo, as coisas simplesmente começaram a fazer sentido. Eu não fui uma filha desejada, até ai tudo bem, muitas crianças não são esperadas e nascem mesmo assim, a maioria delas é, inclusive, muito amada. Mas não eu, eu fui esperada, fui preparada, só não fui desejada. Criada em laboratório, fui feita para suprir as necessidades de pesquisa da ONU. Eles me fizeram, assim como fizeram outros iguais a mim, para que o meu corpo fosse cobaia para testes e vacinas, vacinas contra doenças mui poderosas. Doenças como esta.

A princípio eu não sei dizer o que causou esse apocalipse, e nem mesmo o pessoal da ONU, que me encontrou logo após minha saída do acampamento de Rick. Tudo o que sei agora é que o meu corpo é imune a mordida. Sim, só a mordida, não o vírus. Mas algumas das outras pessoas que, assim como eu, nasceram para serem cobaias são imunes a ele. Mas nenhum de nós pode ser imune aos dois, até onde sabemos. Pra ficar mais claro, eu posso ser mordida e não morrer, mas se eu morrer por qualquer fator, volto como um deles. E os outros... se forem mordidos eles morrem, mas depois de mortos eles não reencarnam como predadores famintos, para eles é o fim, como normalmente seria para qualquer um. 

Até agora eu não conheci ninguém como eu, e Michel, o líder da pesquisa na região, disse que sou a primeira que eles conseguiram achar. Ele usou o termo "achar", mas se pudesse usar "capturar" teria usado. É uma história difícil de engolir, mas nada é mais estranho do que mortos andando sobre a terra, então tento superar o choque inicial de estar viva para poder continuar. 

A princípio existem cinco de nós nos Estados Unidos, e dois estão no estado da Geórgia, que é o foco deles. Outra equipe está no Alabama e uma terceira no Colorado. A quarta equipe está na Carolina do Sul, mas eles perderam contato com ela havia algumas semanas. Eu acreditava que essa doença, por mais que tivesse sido comentada no mundo todo, pelo que os noticiários diziam, não tivesse se alastrado tanto. Mas Deus, como fui tola por pensar isso.

A equipe do Colorado aparentemente teve sucesso e está se encaminhando para o Alabama nesse exato momento. Nossa ordem é de permanecer na Geórgia, e em segurança, até que a equipe principal se junte a nós. Ou até segunda ordem.

Eu acreditava que o governo era uma associação grande, mas não são nada perto da Comissão de Resgate Federal . Aparentemente esses caras receberam ordens de nos achar e nos levar até Augusta, no Maine, custe o que custar. E isso lhes tem custado muito. Michael me contou que já perderam muitas pessoas desde o início da busca, onde partiram de Atlanta, que não está tão longe assim. E considerando que nosso sangue, aparentemente, é fácil de rastrear, pois não é compatível com as tipagens sanguíneas normais, eles não deveriam ter tido muita dificuldade em nos rastrear. Se não fosse pelo mortos, é claro.

Nosso sangue é chamado de Agente B12 e eu não sei mais a respeito porque isso é confidencial e não me diz respeito. Tudo o que eu sei é que os AB12 são imunes à mordida e os AB11 são imunes ao vírus. E isso basta, pelo menos por enquanto. Enquanto eu estive mais ocupada mantendo Daryl no nosso rastro eu não tive tempo para me preocupar com o motivo de estar sendo levada para tão longe. Mas ai Daryl me encontrou, três dias atrás, e depois de convencermos Michael e sua gangue de soldados gigantes que ele e a mulher -Carol, da qual não gostava nada- seriam de grande ajuda, ficamos grudados um ao outro pelo máximo de tempo possível, era hora de questionar se eu estava tomando a escolha certa. Não que isso me parecesse uma escolha. Mesmo que eu quisesse ir a qualquer lugar, dificilmente eu poderia. Todos deixaram claro, desde o início, que isso era Ordem de Conduta Máxima, e isso não é algo do qual você possa correr. Contra eles eu joguei meus melhores argumentos, mas era inútil dizer que não haviam mais governos, ou agências como a ONU para nos guiar, eles estavam ali com um propósito e dariam a vida por ele. Simplesmente porque seria uma morte gloriosa. "Meu sangue pela nação" era o lema da CRF e era realmente o lema, nada os impediria de deixar a missão.

Eu não tinha porque duvidar deles, mesmo sua história sendo incoerente para mim. Por que eu nunca fiquei sabendo sobre o que era de verdade? e por que não me lembro de ter servido de cobaia para essa gente?
Até que ponto eles chegaram comigo?

Eram mais perguntas sem respostas. Mesmo com a história furada deles eu os acompanhei sem dificultar. Não tinha mesmo pelo que lutar, estava cansada e não conseguiria fugir do Governo por muito mais tempo. Por sorte eu não precisei, porque quando ele nos encontrou, acampados num edifício destruído, foi como se só naquele momento eu tivesse voltado à vida. A presença dele me aquecia, não lembro de ter sentido tanta felicidade, mas lá estava ele. Por este motivo, os últimos dias tinham sido menos difíceis de suportar, eu estava me recuperando bem, ganhando mais peso e ficando mais forte porque todos estavam preocupados com a minha segurança, precisavam de mim e do meu sangue para uma cura. E eu esperava realmente poder ajudar, queria ir com eles, para algum lugar melhor, mas mais do que tudo, queria que Daryl fosse comigo. A princípio não achei que ele fosse concordar com tudo aquilo, mas ele pareceu entender tudo tão rapidamente e aceitou nos acompanhar, o que foi uma benção. 

          -Se você não sabia que ficaria viva- perguntou ele tentando me manter aquecida entre suas pernas- Como sabia que eu viria atrás de você? 

 Ponderei. 

         -Eu só quis manter as esperanças- era a única resposta que parecia explicar. E no fundo, ela acabou fazendo todo o sentido. 

Por um instante, fiquei feliz de termos conversado sobre o fim do mundo, eu imaginei que caso visse, ele entenderia o recado, mas eu não acreditava realmente que poderíamos voltar a ficar juntos. O mundo não gira, ele capota. 

DIXON - No Fim Do Mundo Onde histórias criam vida. Descubra agora