DEPOIS QUE ESTACIONEI o carro na frente do Perverse, Kananda entrou desconcertada, meio aérea.
Eu sabia que Lorenzo era o motivo e isso me fez ficar irritado. Eu pedi para ele não aparecer, para sair fora e deixar meus planos seguindo seu curso natural. E ele fez justamente o contrário — para me provocar. E a Kananda também.
Ele mexia com ela. E pior, o contrário também estava acontecendo.
Notei isso desde a festa. Quando ela deu um tapa em seu rosto e ele foi correndo atrás dela, como um cachorrinho. Foi de lá para cá que Lorenzo começou a mudar em relação a garota.
Eu queria tê-la — assim como ele.
Mas não sabia se eu e Lorenzo disputávamos acidamente a mesma vaga em sua mente. Talvez ela estivesse me usando para provocar meu irmão. Logo dei de ombros, constatando que provavelmente estávamos usando um ao outro e isso não iria dar certo no final.
Um de nós se apaixonaria — e podia apostar que seria eu.
A viagem foi silenciosa e não fiz esforço algum para ligar o som. Eu queria que o momento durasse, mas não podia desacelerar o carro. Ficaria óbvio e desconfortável da minha parte.
— Você gostou de hoje? — Indaguei.
A verdade nua e crua é que eu estava brigando por ela. E pior... com meu irmão! Mas... não sabia nem por onde começar a fazer isso. Nunca precisei. Sempre existiriam mulheres que gostavam de vagabundos drogados como eu. Kananda parecia a primeira a não cair inteiramente de joelhos sob meu charme.
E isso era desconcertante.
Kananda assentiu.
— Muito melhor que ontem.
Tudo seria melhor que ontem, querida.
Quando chegamos em sua casa, todas as luzes estavam apagadas. A rua era apenas calmaria. Ninguém estava andando por ali, e os cachorros permaneciam quietos.
Ainda bem.
Não estava no clima de ver sua avó vindo com uma vassoura quebrar meu carro. Botei-o em ponto morto e sorri pesaroso.
— Entregue.
Kananda desafivelou o cinto de segurança e apertou a alça da mochila, sem me encarar.
— Muito obrigada por hoje, Gabriel. Foi muito importante para mim.
Algo dentro do meu peito se apertou. Eu não queria saber o que era.
— Imagina. Sempre estarei aqui, se precisar.
Tanto para treinar, como para beijar e muito mais. Tive o cuidado de deixar meu rosto inexpressível ao pensar em nós dois em uma cama. Nossos corpos enroscados e suados.
Ela sorriu, alheia aos meus pensamentos eróticos.
— Boa noite, Gabriel — desejou.
Imediatamente, meus pensamentos começaram a bolar um plano. Sorri diabolicamente.
— Boa noite, Kananda.
¥
Cheguei no apartamento procurando por Lorenzo.
Ele estava sentado no sofá com um copo de vodca em uma das mãos e um cigarro na outra, os olhos pregados no telejornal que passava na televisão. Lorenzo não me encarou.
— Demorou — ele disse.
Minha deixa perfeita. Obrigado, irmão. Aprumei a postura, deixando que outro sorriso ferino tocasse meus lábios.
— Sim, eu estava ocupado demais com Kananda.
Lorenzo estreitou os olhos verdes, desconfiado. Finalmente, os direcionou para mim.
— Ocupado — ecoou.
Eu sabia que estava sendo um completo babaca insensível com ela, mas no meu lugar, Lorenzo faria o mesmo. Inventar uma historinha não daria em nada, apenas o deixaria irritado. Então somente estava aproveitando as chances.
— Sim, nós estávamos transando.
Um músculo se contraiu em sua mandíbula.
— Mentira. Ela não faria isso.
Ela não fez. Mas estávamos em guerra, e eu usaria qualquer artificio que estivesse ao meu alcance.
— Será mesmo, Enzo? Acho que não. Pergunte a ela — me distanciei, indo em direção ao meu quarto, mas não contive o sorriso ao virar e ter a deliciosa visão do cigarro tremendo em seus dedos. — Você perdeu, Lorenzo. Acabou. Ela foi minha.
Ela ainda não foi. Mas um dia pode vir a ser.
Lorenzo engoliu em seco e voltou o rosto em direção a televisão novamente.
Quando deitei em minha cama, o sentimento terrível de trair os dois perdurou até que eu dormisse. E quando pensei que estaria livre da culpa, ela me perseguiu até em meus sonhos.
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Fire | Vol. I
RomansLivro 1. Série Dark Souls. Kananda Wright sempre foi atraída pelos bad boys, aqueles que fumavam e possuíam tatuagens espalhadas pelo corpo. Ou talvez, que só se vestissem de preto. Não importava, ela adorava observar os homens. Mesmo que a sua vida...