11. O Passe-Livre (ou: Norman, o idiota)

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Um ano depois, enquanto estudava para a pós, ela foi chamada para um teste para fazer tradução simultânea. Segundo ela, foi um lance de sorte. Um cliente para o qual ela traduzia textos com frequência, precisava de alguém para traduzir uma palestra, e como só conhecia ela e já era de confiança, ofereceu a ela um teste. Lógico que ela passou (e isso não é puxação de saco de namorado, me atrevo a dizer que ela fala e escreve em inglês melhor que eu como nativo). E então, uma nova oportunidade se abriu para ela, e ela não a desperdiçou.

A única coisa que eu não gostava era que mesmo ganhando melhor, ela ainda assim não saía da casa do ex-marido. A ambição era um pouco maior que a realidade, e ela achava que poderia ficar lá até conseguir comprar um lugar para morar com o filho. Mas isso levaria mais tempo do que ela calculava e não tinha tanto tempo disponível.

Porém, foi alguns meses depois, que Sean me ligou, e me fez uma oferta inusitada.

- você tem interesse em conhecer alguns fãs de São Paulo? - perguntou, sabendo qual seria a minha resposta e sabendo os motivos.

- São Paulo, Brasil? Sem dúvida, cara! Como você conseguiu essa proeza?

- Bem, já faz um tempo que tentam levar uma Con para lá, mas as negociações nunca iam longe. mas dessa vez, conseguimos. Vamos fechar para Setembro o que me diz?

- É só me mandar a papelada que eu assino.

- Preciso ainda negociar o cachê.

- Qualquer oferta eu aceito. De qualquer maneira, não é como se eu precisasse do dinheiro.

- Certo. Anotado, pateta. E...tem alguma exigência em específico? Acomodações? Os...passes-livres, talvez?

Eu ri da forma que ele insinuava. Mas ele tinha razão, e não ia mentir para ele dos meus motivos que ele sabia muito bem quais eram.

- Liga para a Jo, ela tem todos os dados e te passa.

- Apenas um passe-livre então?

- só consigo pensar em um.

"Puta merda," eu pensei, "ela vai ficar maluca quando eu contar."

Estava já pensando em como eu escreveria uma notícia dessas. Me antecipando, estava imaginando como ela reagiria ao ler uma carta avisando que eu providenciara passe-livre para ela vir me conhecer na Con.

"ainda bem que ela sabe falar inglês...seria complicado se ela não soubesse, ia precisar de um tradutor..." e foi aí que eu me xinguei de todos os nomes que você pode imaginar. Idiota, burro, imbecil, panaca...peguei o celular e liguei de novo para o Sean.

- Fala pateta! Pensou em mais alguém, seu cachorro?

- Não é nada disso...só queria...me diz uma coisa...as regras para staff ainda são as mesmas de sempre?

- com certeza que são.

- E você tem alguém em mente para fazer a tradução simultânea nas entrevistas, ou até mesmo durante os autógrafos e fotos?

- Ainda não, na verdade só estava esperando você confirmar a sua participação para pensar nisso. Por quê?

- convide-a para ser minha intérprete.

Ele ficou em silêncio por alguns segundos.

- Tem certeza, cara? E se ela ficar ansiosa, sei lá...

- Não vai. eu sei que não vai. Chame-a. E peça para ela orçar o serviço, pague o que ela cobrar.

- E se ela recusar o trabalho?

- aí você insiste. Sean, é a única condição que tenho para participar dessa Con. Se ela não for minha intérprete, ninguém vai ser.

- Certo. Bem....talvez com a oferta certa..."farei uma proposta que ela não poderá recusar..."

- Valeu, cara. Vamos fazer isso então.

- conta comigo. Te falo depois do andamento de tudo.

Semanas depois ela me madou uma carta agradecendo pela oportunidade, que seria um trabalho e tanto, que faria seu melhor.

Respondi a carta dizendo apenas que eu sabia que ela o faria. E que estava ansioso em conhece-la pessoalmente.

Naqueles meses seguintes além da preparação, eu estava começando a ter novos planos. Eu já tinha uma certa experiência em administrar um bar em que era um dos sócios em NY, e o bar que frequentávamos na Geórgia depois de um dia exaustivo no set estava prestes a fechar. Greg, o produtor e eu planejávamos comprar o lugar, e já negociávamos com o proprietário. Não tínhamos pressa em abrir o bar de novo, tínhamos muitas idéias para o lugar, e tais idéias precisavam ser consideradas com calma. Enquanto isso eu continuava a sequencia de cuidar da minha produtora, gravar um filme e estudar o novo roteiro, aparecer em Cons em meu próprio país. Estava bastante ocupado e mesmo assim, sempre pensava em como seria encontra-la pessoalmente depois de tanto tempo trocando cartas.

As Cartas da ProblemáticaOnde histórias criam vida. Descubra agora