46. My Love For Evermore

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E foi isso. Foi assim que tudo começou. Aos poucos, ela conseguiu convencer o ex-marido, e para ser sincero, eu mexi alguns pauzinhos para conseguir o green card dela também. Dela e do Ian. Aos poucos ela se libertava da vida antiga, e aos poucos se aproximou cada vez mais, primeiro com uma carta, depois outra...com um pequeno gesto tão comum, abrindo uma carta e me esforçando para ler depois de um dia de trabalho pesado no set, minha vida mudou completamente. Não tenho a menor ideia de como seria minha vida agora, se não tivesse aberto aquela primeira carta. E toda vez que lembro, parece que escapei por pouco de algo muito ruim, e é um alívio lembrar que aquele pequeno gesto foi sem eu saber a melhor coisa que eu poderia ter feito.

A única vez que ela voltou para o Brasil foi algumas semanas depois, mas ficou apenas 20 dias e voltou. Voltou de vez. Com tudo feito. Pediu a demissão do trabalho, mudou o endereço no registro da faculdade (que já tinha terminado, de qualquer forma), pegou indicações para a NYCU para continuar os estudos. O ex-marido concordou que era bom para o Ian mudar para cá também, e desde então, estamos aqui.

O casamento nunca passou deste pedido, e resolvemos considerar como tal. Só percebemos que esquecemos o assunto do casamento oficial uns quatro anos depois.

Apesar de todo meu receio, ela nunca mais teve um dos tais "episódios". Eu diminuí a bebida, e inclusive voltei a esculpir e pintar, com o incentivo dela. Ela escreveu um livro e dois glossários de tradução. Viramos uma família. Ela parou de trabalhar de novo, e depois quando voltou, voltou com força total. E hoje em dia conseguiu chegar além de onde queria, e mais importante do que eu estar orgulhoso de ter sido a testemunha mais próxima, é o orgulho que ela tem de ser quem é. Ela hoje em dia sabe a força que tem e do que é capaz, e ao contrário do que muitos podem pensar, eu não fiz absolutamente nada. Isso acho que ninguém nunca entendeu. Ela só precisava ser deixada em paz. Eu não fiz nada por ela, a não ser, claro, comemorar com ela a cada passo para frente. Apoiar quando ela duvidou se conseguiria. Fiz por ela a mesma coisa que ela fez por mim, e a cada dia que passa, mais admiração e respeito eu tenho por ela. E sendo assim, as coisas mudaram muito, e digo com propriedade: ela não é um terço tão difícil de lidar quanto diziam. Quanto ela mesma dizia ser.

Novos amigos apareceram, e claro, tivemos brigas colossais. Mas nunca, desde aquele primeiro beijo naquele hotel em São Paulo com a luz cafona do luminoso da rua, nunca mais me imaginei com mais ninguém. Nem mesmo com as piores mancadas.

- O que você está fazendo? - acabei de levar um susto com a voz dela pelas minhas costas.

- Nada, Shoo, apenas escrevendo algumas ideias.

- Quer roubar o meu lugar agora?

- Jamais. O pouco que eu consigo escrever foi porque li muitas cartas suas. Mas não tenho o suficiente para virar escritor.

Ela veio, enrolada no cobertor. Me beijou, e me abraçou pelas costas, dando um beijo no meu pescoço.

- Vamos dormir. Amanhã você tem um dia cheio.

- Vou em alguns minutos. Só preciso terminar isto.

- Certo. amo você, Shoo.

- Também te amo, Shoo.

E ela voltou para o quarto.

Estamos saindo de uma crise que eu causei. Por isso que dediquei uma boa parte do tempo que teria para descansar escrevendo estas lembranças. Por mim e por ela. Ela não merecia o que eu fiz com ela, e eu não me perdôo por tê-la decepcionado. Mas ela resistiu, e ficou. Por mim, pela nossa família, mas o que mais importa, por que ainda nos amamos, e ela é a mulher da minha vida. Eu disse isso a ela. E permiti que ela me odiasse o quanto precisasse.

Por isso tudo isso está escrito aqui. Transcrevi algumas coisas que encontrei em cartas que ela escreveu para uma amiga muito próxima. Espero que ela me perdoe por essa.

Mas eu precisava contar, colocar por escrito as minhas lembranças mais antigas e que me são tão caras. Cada vez que vim escrever isso tudo, coloquei todo meu coração, não são apenas lembranças. Toda vez que releio tudo isso, sinto a mesma alegria, o mesmo nervosismo, os mesmos receios e preocupações como se estivesse naquele momento.

É o quanto você importa para mim, Ally. E por mais que tenha me perdoado, eu não me perdoarei nunca por ter ignorado tudo isso. Por nós dois.

Como prometi uma vez, prometo mais uma vez:

"Meus braços estão sempre abertos. Para te segurar quando você cair."

Te amo. Daqui até a Lua e de volta.

Minha Shoo. Minha garota. Minha maluquinha. Mulher da minha vida. Estou voltando para a cama. Para mais um dia de todos os anos da minha vida ao seu lado. Vamos comemorar os 7 anos de casados. Da melhor forma que temos: duas motos, e uma estrada pela frente. 

As Cartas da ProblemáticaOnde histórias criam vida. Descubra agora