Uma noite depois de gravar, parti no meio da madrugada com o Greg e o Steven para um bar.
Tinha me arrumado depois de gravar no trailer, e as caixas de correspondências se empilhavam mais uma vez; Jo deixava separada uma caixa com as correspondências que ela sabia que eram mais importantes, e eu imaginava que teria alguma carta dela lá, mas não queria ver. Estava determinado em me conformar que havia acabado qualquer coisa que eu nem sequer sabia se havia começado na verdade.
Estávamos no bar, quando uma banda local estava se apresentando. Só seria pior se fosse uma banda de psychobilly, ou pelo amor de Deus, o próprio Demented Are Go que ela tanto amava.
Mas era uma banda de rockabilly. Uma porra de uma maldita banda de rockabilly. E lógico que tocaram Elvis. Lógico que tocaram "Are you Lonesome Tonight". Eu já tinha bebido um bocado, e travei ouvindo aquilo. Lembranças dos olhos dela fechados enquanto ela dormia, de tocar a linha do nariz dela, aquele primeiro beijo enquanto ela me mostrava aquela cicatriz. Me levantei antes de a música acabar e fui no banheiro lavar o rosto. Mas talvez por causa da bebida, sentia um aperto dentro do peito que me incomodava e não sabia o que fazer a respeito.
Voltei para o bar fingindo que estava tudo bem, era só o problema de beber demais. Joanna, então namorada do Steven estava lá, e como toda mulher, ela percebeu que eu estava com problemas, mas não quis falar a respeito. A impressão que tinha era que se eu contasse para alguém, provavelmente seria internado, ou pelo menos eu enlouqueceria e nunca mais pararia de falar.
Para ser justo, eu não sabia o que entender daquela última carta. Cada vez que lia tinha uma conclusão diferente. Porque diabos ela tinha que ser tão enigmática justo agora? Ela foi clara quanto às opiniões, quanto a sua própria história, e até mesmo sua auto crítica ás vezes me incomodava nas cartas. Por que justamente agora, que ela precisava ser mais clara e objetiva do que nunca, estava se escondendo?
Voltamos de manhã para o set, eu me ajeitei no trailer e praticamente desmaiei de bêbado. Claro que não deixava aparecer (ou pelo menos tentava), mas por dentro, sentia um vazio que tornava tudo sem importância. Por mais que eu tentasse não pensar nela, por mais que eu bebesse, parecia que as lembranças só ficavam mais e mais nítidas, quando deveriam se apagar.
Cansei daquilo na manhã seguinte, enquanto não começávamos outro dia de trabalho. Acordei com a cabeça doendo, fiz um café, e tomei um banho frio. Quando voltei, respirei fundo, olhando para as caixas de correspondência. "Coragem, Norman." pensei comigo mesmo.
Peguei a caixa que Jo separava as correspondências. Haviam cartas e presentes diversos. Cartas de alguns fãs mais próximos, e cartões de família. Haviam cinzeiros, canecas, patches e buttons. Mas não havia nenhuma carta dela.
Então estava mesmo encerrado. Pensei assim.
Olhei as outras caixas, e não havia carta dela. Nenhuma. As únicas cartas dela que tinham lá eram de antes de eu pedir para a Jo enviar a minha resposta e ela passou a me enviar em NY.
Mas depois de tê-la conhecido pessoalmente, nenhuma carta nova. A mais recente era a que ela deixou na minha mochila.
Mas pensei comigo que aquilo não estava certo. Ela deveria se despedir, ou me dispensar direito. Não com uma carta pela metade, cheia de enigmas. Não partindo sorrateira enquanto eu dormia.
"Certo. Vamos fazer do seu jeito, então..." pensei. E escrevi a carta mais ridícula que poderia ter escrito.
Mas naquele momento, em nada me importava.
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As Cartas da Problemática
FanfictionO que aconteceu antes de "Problemática"? Norman conta como conheceu Ally. "foi um gesto mínimo, de abrir uma carta entre milhares de outras. Outro gesto sem pensar, sem importância, que mudou tudo."