22. Ally fala...

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Era muito estranho, a princípio. Meados de Maio ele partia para as gravações e era impossível nos vermos de outra maneira que não fosse vídeo chat, e mesmo assim, todos os dias ele me mandava mensagens de bom dia. Sempre que possível conversávamos. Um dia, meados de Novembro, ele me mandou uma mensagem dizendo que estava no aeroporto.

-Mas para onde você está indo? Mudaram as locações?- perguntei por mensagem. Esperei por uma resposta, mas ao invés disso, ele me ligou.

- Estou no aeroporto de Guarulhos - eu engasguei - Me deram uma pequena folga, bom, na verdade eu me dei uma folga. Onde posso te encontrar? Essa cidade é uma bagunça!

Eu ri e disse que ia até lá encontrá-lo. Peguei meu carro, coloquei meu filho na cadeirinha no banco de trás e fomos.

Cheguei no aeroporto e segui em direção à área VIP. Sabia que ele voava pela Delta, e seria mais fácil encontrar ele, com as coordenadas que ele me passou. Ele me ligou perguntando se eu iria demorar, e eu disse que estava bem ali. E estava mesmo, estava no outro lado da porta. Com meu filho no colo, vendo ele mexendo nervosamente no celular. Ele umedecia os lábios com a língua nervosamente, ansioso. Mordia o canto dos dedos. Quando me viu, um sorriso constrangido apareceu. Ele estava lindo, com os óculos escuros, uma camiseta preta, a mesma camiseta que vi tantas vezes por foto, da "Minor Threat" e uma calça jeans. Os cabelos já começavam a pingar de suor, naquele tempo quente diferente do sol da Geórgia. Levantou-se e ajeitou a calça puxando a pelo passador de trás.

- Mesmo com o ar condicionado, não consegui me livrar do calor...

- É assim mesmo, Norman, você acostuma....bem, o que digo? Bem vindo ao Brasil novamente?

- É...acho que sim....obrigado! Eu posso me acostumar aqui....

E riu aquela risada aberta e me puxou pela cintura, me beijando com força, puxando meu corpo contra o dele. O Pequeno Ian não gostou muito da cena, assistindo confortavelmente sentado no meu braço, e protestou, empurrando o rosto dele com as mãozinhas gorduchas.

- Ei, carinha!!! Finalmente estou te conhecendo pessoalmente! Duvido que se lembre de mim, nos falamos algumas vezes por vídeo chat, lembra de mim? - O Ian se limitou a sorrir, e se concentrou no boné dele, a ponto de saltar do meu colo e partir pro colo do Norman, tentando alcançar o boné...

-Calma aí, homenzinho. Quando Chegarmos no carro, te empresto esse.

Subi o vidro do carro e liguei o ar condicionado. O Ian já se ajeitava na cadeirinha quando se lembrou da promessa do boné, que Norman prontamente tirou da cabeça, esfregando os cabelos castanhos desgrenhados, e com um sorriso que só ele tem, virou para trás

- Aqui está homenzinho.....tem razão, tem que fazer a palavra valer, certo?

A viagem até em casa foi tranquila. Não conseguia deixar de me preocupar, como que vamos desviar de todas as atenções possíveis na pequena viagem do aeroporto até Osasco? (Sim, na época ainda morava lá, numa casa de fundos com um pequeno pomar. Felizmente meu ex-marido havia encontrado outra pessoa, e já estava bem apaixonado, o que facilitava pois ele ficava sempre pelo menos duas semanas com ela. )

Ao chegarmos na porta, dei a ele as chaves, pois a casa é de fundo, e indiquei a porta entre duas lojas.

- Mas você acha seguro?- ele perguntou, legitimamente preocupado.

- Eu estou aqui, vou esperar você entrar pra garantir que está seguro...mas duvido que alguém aqui pare pra notar. Você vai entrando lá, e eu em seguida, quando ver que você já está lá dentro, eu vou estacionar o carro, a garagem é na outra rua. - Ele me olhou tentando entender do que eu falava, mas desisti e me limitei a fazer um sinal com a palma da mão aberta.

As Cartas da ProblemáticaOnde histórias criam vida. Descubra agora