7. A decisão errada

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Optei por não saber. Sean foi embora, e me deu uma carona até a casa de minha ex-mulher. Ela ia para um evento de moda naquela noite, e eu a acompanharia.

E foi aí que tomei a decisão errada.

Foi naquela mesma noite. Já tinha combinado com Mingus, nosso filho que ele ficaria aquela noite na casa de amigos. Pelo menos, foi isso que ela me disse.

Chegando no evento, ela me apresentou uma conhecida, Cecilia. Conversamos a noite toda, era uma garota, jovem, bonita, e também muito inteligente. Imediatamente fiquei encantado com o jeito dela, e antes mesmo que a noite avançasse, eu já estava aos beijos com aquela garota.

Depois daquela noite, eu não sei explicar o que mais aconteceu. Mantive contato com ela dias depois, quando já estava de volta em casa e seguindo minha vida normalmente. Todos os dias eu falava com ela, e nos encontrávamos regularmente, e em questão de um mês, ela estava morando no meu apartamento.

Para ser justo, não era exatamente culpa dela. Odeio admitir isso, para mim mesmo e para as pessoas ao meu redor, mas eu a iludi, e muito. Deixei ela se mudar para minha casa, deixei que ela se iludisse. Eu gostava dela, gostava de ficar com ela, mas não tinha a mesma profundidade que ela. Deveria ter deixado isso claro desde o princípio, mas ao mesmo tempo, não sei se adiantaria alguma coisa.

Ela era jovem, e eu havia acabado de passar dos quarenta, então havia sim, algum tipo de crise de meia idade me afetando, por mais que eu não me sentisse de acordo com a idade, ou que dizem que deveria ser chegar aos quarenta. Durou pouco tempo, mas teve um impacto enorme na minha relação com o público. Se a escritora das minhas cartas se incomodava, eu não tinha como saber.

Uma vez li em uma das cartas que ela preferia se envolver com homens por não mais que 3 meses. Que depois dessa fase acabava o encanto, e acho que algo assim aconteceu comigo em relação a Cecilia. Em poucos meses depois de morarmos juntos, ela tinha crises de ciúme que não faziam sentido, chegou a discutir com fãs no instagram, eu precisei entrar no meio para tentar amenizar as coisas (e se existe algo que eu odeio, é atrito. Evito o máximo, e parece que por isso, eles me perseguem), enfim, foi uma situação difícil.

Um dia ela estava dormindo, e eu fiquei trabalhando até um pouco mais tarde. Já devia ser o meio da madrugada quando acendi um cigarro, e me levantei. Estava editando algumas imagens para postar na galeria, e minha vista ardia. E de repente, lembrei dela. Havia um bom tempo que não lembrava mais. Me veio na cabeça de repente, totalmente do nada. E lembrei do que Sean havia me sugerido, então pensei comigo. Por que não, afinal?". Criei coragem, peguei uma folha de papel e escrevi a carta mais idiota e curta que podia pensar.

" Olá, Ale!

Desculpe a demora em responder. Gosto muito de receber suas cartas, você parece ser uma mulher interessante. Por favor, escreva sempre que quiser, lerei suas cartas com o mesmo prazer que leio todas que você me envia. Espero um dia saber mais sobre você.

Abraço

NR."

Respirei fundo, e coloquei a carta dentro de um envelope e no dia seguinte enviaria para a minha RP, para que ela encaminhasse ao serviço postal. Lógico que, na manhã seguinte, ela encontrou o envelope e o abriu. Foi a pior briga que já tivemos, porque pela primeira vez, ela tinha razão. Dessa vez não era um ciúme sem fundamento. Eu estava escrevendo para uma fã, uma fã como todas aquelas que deixavam recados e comentários que a deixavam insegura. A partir daquele momento, se as coisas já estavam ruins, se tornaram insuportáveis. Ela brigava o tempo todo, exigiu acesso a todas as mídias sociais, e-mails, até mesmo os profissionais. Sabendo que eu tive minha parcela de culpa, permiti tudo isso. Mas não amenizava nada. Porque quando ela não encontrava nada para me acusar, sempre poderia voltar à aquela carta. Ninguém nunca estava certo, e parecia que a relação agora consistia apenas em competir quem estava mais errado. (mesmo assim, enviei a carta e a Jo a encaminhou para o endereço indicado no envelope).

Um dia eu falei para ela que não estava dando certo, pois eu tinha outras prioridades além dela, e que haviam alguns aspectos da minha carreira que ela não conseguia conciliar. Não foi uma nem três vezes que tivemos esse tipo de conversa, e sempre acabava com ela me ligando, ou chorando, e eu acabava cedendo. Eu precisava ser firme com ela, e impor o ponto final, pois ela estava me atrapalhando e eu a estava iludindo, mas não conseguia. Inúmeras vezes saí para algum bar ou coisa parecida com amigos depois de um término, e acabava saindo mais cedo, pois ela me ligava arrasada, e eu sentia dó, e me sentia responsável por tê-la magoado e voltava correndo.

Em algum momento, isso parou. Assim, simplesmente. Ela disse que não queria mais, eu mais uma vez concordei, e saí. quando voltei para casa na manhã seguinte, ela havia ido embora. Mesmo assim às vezes ela aparece de novo. É uma situação complicada, mas depois de alguns anos tudo se resolveu.

Entreguei a Jo a carta para ela enviar junto com as correspondências, e como diz ela até hoje "joguei pro Universo". Admito que pensei durante dias depois em várias coisas que eu podia ter dito a mais, deveria ter mencionado algum assunto que li nas cartas dela, algo que confirmasse que eu lia. Mas agora estava feito e era tarde demais. Talvez em outra oportunidade, isto é...se ela não me considerasse um imbecil arrogante e nunca mais escrevesse de novo de tão enojada.

As Cartas da ProblemáticaOnde histórias criam vida. Descubra agora