ELLIOT
Os minutos que antecedem a entrada no palco sempre me deixam agitado. Não importa quantas vezes eu tenha me apresentado na vida, continuo sentindo um embrulho na boca do estômago, assim como vontade de sair correndo.
Embora minha postura seja confiante a maior parte do tempo, sou o extremo oposto quando se trata de apresentações e a excelência do meu trabalho.
Independentemente das fugas com Vince para farrear, sou altamente focado em sua dança. Sou o primeiro a chegar e o último a sair do estúdio, passando horas a fio ensaiando e ensaiando, buscando superar a mínima falha que seja. Teve ocasiões em que cheguei a desmaiar de tanto cansaço.
Buscar a perfeição era é que eu constantemente faço, o que, por várias vezes, me deixou frustrado comigo mesmo. E apesar de estar policiando essa mania desagradável, não é raro um dos meus colegas advertir que estou exagerando.
Vince é um deles.
— Eli, relaxa. – diz o ruivo - Vai dar tudo certo. Apenas não se cobre demais.
Fácil dizer, não é ele que está uma pilha de nervos. Eu praticamente repassei o espetáculo inteiro no backstage e agora não paro quieto num canto. Saco!
— O Elliot está com aquela cor verde no rosto de novo. – um dos bailarinos comenta, observando-me balançar para cima e para baixo na ponta dos pés.
— Só espero que ele não vomite como da última vez. – outro fala.
Qual é? Por acaso algum de vocês limpa o meu vômito, caramba?
— Deixem-no em paz. – censura Bernard – Todos nós sabemos que ele fica assim antes de entrar em cena. Não é nada demais. Quando estiverem lá em cima, vai passar como em todas as outras vezes.
Os bailarinos concordam. Valeu! Logo em seguida, ele orienta:
— Vão para as suas posições. Somos os próximos. A meia hora de diferença de um espetáculo para o outro está prestes a acabar.
Fazemos mais alguns alongamentos, até alguém da produção gritar:
— Cinco minutos!
Vince dá risada. Provavelmente passei do estágio verde para o branco – de palidez mesmo. Meu amigo oferece um gole de água, que bebo mesmo a contragosto. Estava precisando.
Confiro o figurino pela última vez e coloco-me na posição ao lado do palco. Apesar das cortinas abaixadas, posso ouvir as vozes do público. A casa está cheia. Eu sei que a sensação sumirá no segundo em que eu pise no palco, mas sou incapaz de controlar o nervosismo que me aborrece no momento.
Alguém tem que me ajudar a superar o medo do palco.
Puxando uma lufada de ar, caminho até o ponto central e espero o sinal da produção. As pesadas cortinas vermelhas logo sobem. A luz do holofote acende. Encontro-me no meio do palco, todos os olhares atentos sobre mim.
No instante em que a música começa, toda a ansiedade desaparece como mágica. No lugar, paixão e domínio explodem em movimentos belos, fortes e precisos. Entrego-me a dança e tudo o que ela representa. Meu corpo e minha alma estão nesse palco, expostos para os desconhecidos que me assistem.
Como aquela pessoa diz: "sua essência vibra a cada pequeno gesto, cada passo."
Posso ser focado nos ensaios, mas liberto-me quando é para valer.
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À Três
RomanceO amor tem várias faces, vários jeitos, várias interpretações. O coração não faz distinções, não escolhe entre o que é certo ou errado, assim como às vezes não se limita a querer apenas uma pessoa. Mas será que é realmente possível gostar de mais de...