3 Começando...

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Mariany

No dia seguinte, me levantei cedo, falei com minha mãe, disse que ficaria uns dias com uma amiga, e depois procuraria um lugar em São Paulo, prometi a ela que assim que me estabilizasse, a convidaria para passar um tempo comigo. Ela aceitou bem. E fiquei feliz em não ter que insistir na mentira. Depois de três anos de namoro com Gui... Trabalhar daquela forma parecia uma coisa mais agradável do que receber migalhas pelo que eu tinha que fazer.

Quando a mulher na estação me fez a proposta de ir até a agência, deixou claro do que se tratava, mas não esperava que houvesse tantas regras, muito menos, treinamento.

***

Eram nove e meia, quando desci com minha mala até a calçada, e entrei no carro que já me esperava. Da mesma forma que no dia anterior, caminhei pelo corredor, mas dessa vez, paramos em frente à outra porta.

— Seu quarto. — O homem alto me falou, quase ronronando.

Abri a porta e entrei. Um quarto simples. Uma cama de casal, uma cômoda e um frigobar. Ao lado, um banheiro pequeno, e mais nada.

Sentei-me na cama, entediada depois que o homem fechou a porta atrás dele, e fiquei sozinha, no silêncio daquele quarto, imaginando que tipo de treinamento era aquele.

Alguns minutos depois, a porta se abriu com violência, e o homem sem camisa do dia anterior entrou com uma roupa de academia, molhado de suor e sorrindo para mim.

— Bom dia, Mariany. — Ele fechou a porta, e se aproximou de mim. — Animada? Ansiosa? — Ele riu — Espero que não. Não curto muito garotas afobadas.

Fechei a cara para ele, ele só podia estar tirando com a minha cara.

Ele passou por mim, e abriu minha bolsa, jogada na cama. — Vejamos... — Ele começou a tirar minhas roupas de dentro da bolsa enquanto eu olhava horrorizada as caretas de avaliação a cada peça que ele jogava no chão. — Desculpe, aqui só tem roupas de vadia.

— Achei que fosse esse o intuito. — Desdenhei.

Ele fechou um olho, me olhando em um misto de sorriso e surpresa.

— Primeiro! — Ele ergueu uma das minhas blusas de renda preta — Se usasse isso, nenhum dos nossos clientes teria coragem de sair com você. E segundo! Por que pagar, se já está mostrando tudo... — Ele riu — É um jogo comercial Mariany, Um produto tem que ser bom e atraente, para ser caro. Tem que despertar o desejo no cliente em ter aquele produto, conhecê-lo... Se você vem em uma embalagem tão vulgar, e já mostrando tudo o que pode fazer, ou seu preço cai, ou sua qualidade é subestimada.

— Você tá mesmo falano de mim como seu eu fosse uma porra de pacote de salgadinhos?

Ele riu e pegou minha mão. — Não. Só estou te dando aulas de como tem que pensar daqui para frente. — Ele cerrou os olhos para mim — E é melhor começar a prestar atenção ao português, ou não vou ser legal com você.

Olhei para ele quase rindo. — É brincadeira né?

Ele ergueu uma sobrancelha para mim. — Quer ver para crer? Experiente soltar mais uma dessas frases de garota de rua, para você ver o que acontece.

Pisquei várias vezes olhando para ele, mas não ousei.

Ele sorriu. — Quer um cronograma, ou prefere surpresa?

— Como assim?

— Tenho um mês com você. E ninguém mais vai te tocar. Vou estar aqui todos os dias às sete, sem feriados, sem domingos ou qualquer coisa do tipo. Se precisar de algo, peça, se quiser ir embora, é só pegar suas coisas, e ninguém fará perguntas. Se chegar ao final deste mês, terá uma prova, esta pode ser comigo, ou com qualquer um da casa. Vou te ensinar tudo o que precisa saber.

— Posso perguntar? — Fiz cara de assustada para ele. E ele assentiu. — Vou ter que transar com você todos os dias? — Quase resmunguei.

Ele riu. — Eu diria que você está se candidatando a uma vaga de trabalho que meio que exige isso. — Ele me observou por alguns instantes — Mas não, acho que exaustão não faz bem a ninguém. — Ele se virou, e parou a porta — Vou tomar um banho, nos vemos em quinze minutos. Ache algo aí que não faça os homens quebrarem seus pescoços tentando te acompanhar.

Sorri com a piada dele. Mas ele me olhou fixamente — É sério!

Assenti, e peguei minha bolsa para ver o que havia sobrado dentro dela enquanto ele saía do quarto.

Peguei uma calça jeans, uma rasteirinha confortável e uma blusa baby look.

Fiz um rabo de cavalo, passei um batom rosa escuro e contornei meus olhos de preto, me avaliei no espelho, e para mim, estava ótimo.

Pontualmente, quinze minutos depois, ele abriu a porta. E passou a mão pela testa olhando para mim. — Essa foi sua tentativa?

Ele estava vestindo uma camisa preta abotoada, e uma calça jeans de marca, com um tênis elegante e os óculos escuros pendiam da gola da camisa.

— Você não me disse aonde vamos. — protestei.

Ele cruzou os braços. — Aonde acha que vamos? E vou tirar as opções que sua roupa sugere. Não vamos a um parque de diversões, nem a uma pista de skate, muito menos fazer um piquenique.

Emburrei.

E ele bufou. — Anda, vamos...

Entramos em um carro azul, não sabia o nome, mas era um carro antigo, muito bem conservado, mas velho.

— Você não me disse seu nome. — falei do nada, olhando-o enquanto ele dirigia.

— Não é importante.

— Por quê?

— Porque não é. — Ele sorriu.

— Você me disse que vamos ficar juntos por um mês. Preciso de um nome, vou te chamar do que?

— Do que quiser. Não importa, logo só vai usar adjetivos mesmo. — Ele deu de ombros.

— Quantas já "treinou"? — Arrisquei perguntar.

— Não faça perguntas!

— Por quê?

Ele parou no sinal — Porque é irritante, e nenhum cliente vai te responder coisa alguma. Você também só deve dizer o trivial. Assuntos pessoais são proibidos.

Desdenhei, e me virei para a frente outra vez.

Entramos em um shopping, e nem consegui acreditar. Ele ia mesmo me levar para fazer compras? Meus olhos brilharam.

Ele estacionou, e abri a porta para sair.

Ele deu a volta no carro e me olhou de cima a baixo. — Nunca saia, se não lhe for permitido sair.

Olhei surpresa para ele. — É o lance de esperar o cavalheiro? — Debochei.

— Mostra que tem valor, que precisa ser paparicada. E também... Que tem bom senso. Se alguém lhe disser para ficar no carro, para não olhar, ou não tocar, você não faz, entendeu?

Assenti.

Ele pegou sua carteira, e me mostrou um cartão. — Vou deixar você aqui por duas horas. — Ele colocou o cartão em minha mão — Use com sabedoria, não é um presente, vão descontar de você, e se comprar merdas, vou jogá-las fora. Então pense bem.

— Mas o que eu devo comprar? Eu não faço ideia do que eu tenho que vestir para isso. Você deveria me ensinar!

Ele respirou fundo — Saltos altos, vestidos longos e lingeries. Não vai andar com gente que vai te levar para comer no Mc Donald's, vai a eventos formais e importantes. Roupas de dama e lingeries de vadia. Essa é a dica. Te encontro em duas horas.

Ele entrou no carro, e me deixou com cara de tacho no meio do estacionamento.

Olhei para o cartão, sem limites. E tive a certeza de que tinha acabado de fazer um pacto com o próprio diabo.


AudazOnde histórias criam vida. Descubra agora