18 Decadência

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Mike

Joguei-me na cama, tentando esquecer aquele maldito encontro no elevador, e assistindo as paredes e os cômodos vazios de meu apartamento. Mais da metade das minhas coisas já tinham sido vendidas para cobrir aluguéis em atraso. Tudo o que restou foi o básico. Olhei as três notas amassadas que Nay havia jogado em mim de manhã. Não faria nem cócegas em minha dívida. Peguei o celular no bolso e caminhei até o banheiro. Era o único lugar da casa que me possibilitava roubar o sinal do wi-fi do vizinho. Olhei para os números, e minha lista de emergência tinha apenas dois nomes. Um deles dizia respeito á hospitais. O número da Any vinha com um (contato, em caso de emergências) o segundo era George (para fins emergenciais financeiros).

Liguei, fechando os olhos - Ge?

- Mike? Se decidiu, por fim?

Respirei fundo. - Sim, quando você pode fazer o serviço?

- Até o fim da semana, mas não vou dizer o dia, você pode ficar ansioso e acabar estragando o lance.

- Qual a taxa?

- 10% Cara, vou fazer de uma maneira que ninguém vai se tocar. Fique tranquilo.

- Tudo bem. Só... Seja rápido. - falei com pesar.

Ele gargalhou do outro lado da linha - Figura... Ele não vai sofrer não... Até mais Mike.

- Até, obrigado.

Apertei o telefone nas mãos me odiando. Nunca havia chegado tão baixo na vida. E sabia que não resolveria todos os meus problemas. Mas no momento, era a única forma.

Tomei coragem, depois de uma tarde inteira dormindo para me recuperar da noite, e desci até a sala do Henrique, Wes me lançou um olhar de pesar e passei por ele sem dizer nada.

Bati na porta escrito administração e entrei.

- Boa noite Henrique, queria falar comigo?

Ele apontou a cadeira em sua frente, e me sentei, calmo, como se ele ali fosse meu mero funcionário, e cruzei as pernas.

- Mike, eu tenho que começar essa conversa dizendo que sinto muito. Eu tentei, juro. Mas infelizmente o agente do proprietário, deu até o fim de semana para você desocupar o imóvel.

Descruzei as pernas, tenso. Não esperava por essa.

- Mas Henrique, tem dez anos que moro aqui, eu deveria ter algum tipo de concessão, eu vou pagar. Até o final do mês consigo quitar minhas dividas de aluguel e condomínio. Só preciso de mais algum tempo.

Ele cruzou as mãos sobre a mesa - Eu sinto muito, mas já são nove meses de condomínio, e oito aluguéis atrasados, demos mais tempo a você do que a qualquer um...

Me levantei, mantendo minhas mãos em punho. - Tudo bem. Diga ao proprietário, que sábado, retiro os móveis.

Ele apenas baixou a cabeça. - Por que não conversa diretamente com ela?

Pensei um pouco - Prefiro ir morar no bueiro. - Respondi e saí da sala. Passei pelo saguão sem olhar para Wes e voltei para meu apartamento. Eu queria me socar por ter deixado isso acontecer. Aquele apartamento... Aquelas paredes... Eu não queria deixar as lembranças para trás, não queria sequer pensar em não voltar para aquele canto. Meu canto. Meu refúgio.

Abri a geladeira, nada além de água, tomei até que a fome se transformasse em sede, e meu interior se acalmasse.

Respirei fundo, peguei minha carteira, meu carro na garagem e fui para onde eu menos deveria ir. Para um lugar que por muito tempo, bati no peito, orgulhoso de nunca ter colocado os pés.

AudazOnde histórias criam vida. Descubra agora