24 Não pode ser o Fim

6.3K 785 151
                                    

Mike

Abri os olhos, mas não vi nada, tentei respirar, mas minhas costas mal tinham espaço para se expandir minimamente. Tentei mexer minhas pernas e só aí percebi que meu joelho estava a alguns centímetros de meu rosto. Meus braços estavam presos, torcidos atrás do corpo. Tentei erguer a cabeça, e me deparei com um pequeno buraco por onde um fiapo de luz entrava. Com um pouco de esforço, percebi que meus tornozelos também estavam amarrados. Minha boca tinha gosto metálico, e ao passar a língua pelos lábios senti o sangue seco ali.

Tentei me movimentar, mas qualquer mínimo esforço, deslocava minhas costelas quebradas. Ouvi um trovão, ele estava incrivelmente próximo, como nunca ouvira antes.

Minha barriga roncou, e minha garganta doeu de sede. Não fazia ideia de há quantas horas eu estava ali. Mas tinha certeza de ter passado a noite.

Depois de algumas horas, consegui levantar a cabeça e perceber pelos fios ali, que eu estava no porta malas do meu carro. Eu me lembrava dele muito mais espaçoso. Mas também percebi que ele tinha sido amassado, a tampa pendia sobre mim, com uma barriga afundada na lataria. Juntei os pontos na hora. Mas não tinha como eu sair dali. Fechei os olhos me lembrando de que meu celular ficou sobre a mesa da lanchonete.

Quem perderia tempo me procurando? Ninguém perceberia a minha ausência...

Provavelmente, Ge faria uma denuncia anônima por causa do carro. Mas até alguém se dispor a procurar, eu já teria morrido de fome ou sede. Ou um desses ossos soltos perfuraria alguma coisa importante em mim. Era o fim... Era o fim e dessa vez, eu não podia fazer nada. Que droga!

Fechei meus olhos, e me concentrei no som do vento do lado de fora do carro. Mais alguns trovões, e depois o barulho pesado de água caindo sobre a lataria acima de mim. Rezei para que aquela água entrasse por algum lugar e chegasse a minha boca. Seria minha única chance de aguentar aquilo, e ter a chance de alguém me encontrar.

Alguns minutos depois, algumas juntas amassadas cederam e a água conseguiu passar para dentro. Virei meu rosto para cima, enchi minha boca com água cheia de poeira. Mas ela aliviou minha sede. Agradeci a qualquer um que tivesse me ouvido. Nunca acreditei em Deus, mas aquela água... Aquilo era um presente de alguém.

Mas antes da gratidão ser completa, percebi que um buraco de uns cinco centímetros se abrira próximo ao meu pé do lado direito. Foi preciso cinco minutos de chuva torrencial, para a água me encharcar naquele porta-malas. E se ela não tivesse vazão, eu morreria afogado.

O carpete se encharcou, e virou uma esponja fofa sob meu quadril machucado. Trinquei os dentes e dei um impulso no banco atrás de mim com os pés, lutando contra a dor nas costelas. Consegui ouvir o barulho do banco se afastando, mas precisaria de mais força.

Mais um, dois, três, e o banco finalmente se dobrou, e me arrastei para dentro do meu carro. A situação ali, também não era boa. As janelas estavam quebradas e toda a lataria estava retorcida para dentro. Como se tivesse sofrido batidas de todos os lados.

Quando estiquei as pernas tentando chegar á frente do carro, a lataria do porta-malas cedeu sobre mim. Soltei um grito ao sentir meus joelhos sendo virados para trás, e ergui a cabeça vendo pelo buraco do que antes era o vidro traseiro que o peso era de outro carro, que desabara sobre onde, até segundos antes, eu estava encolhido.

Olhei para minhas pernas, meus joelhos pressionados por um peso contrário, quebrando-os, enquanto a lâmina de metal do porta malas sedia milímetro a milímetro.

Soltei o corpo sobre o encosto do banco. Estava preso. Não havia como eu sair dali sem ajuda... E apesar da dor que me fazia tremer. Aquele seria um bom fim para mim...

AudazOnde histórias criam vida. Descubra agora