Capítulo 69: Olivier - A casca do ovo

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Pela segunda vez a mulher que Olivier amava saía de sua vida por vontade própria. Na primeia vez, ele implorou, chorou. Desta vez, não reagiu. O mundo em que ele vivia era uma casca de ovo e estava sempre quebrando. Ele pegava os pedaços e colava, mas alguém sempre pisava. Quem pisou desta vez foi Pierre. Quando fechava os olhos, Olivier via a silhueta do homem da Fronteira, emoldurada pelo céu azul e pelos olhos de Tuen. Olivier levou a mão ao ombro e se lembrou da força com que a moça dos olhos azuis o empurrou para fora do caminho. Maldita gente que deu a Thaila uma escolha. Malditos todos que arrancavam dele as mulheres amadas. Primeiro a esposa, agora Thaila.

Raiva ardeu no estômago de Olivier. Outro homem teria se jogado contra as grades, gritado para a escuridão. Olivier não era do tipo que entra em erupção. Veneno não explode. Ele sabia que não havia soldados. O capitão Gaul não deixou nenhum ouvido ao alcance da voz de Olivier. Homem esperto, esse Gaul, mas isso Olivier já sabia. Incompetende como soldado, mas muito inteligente. O homem perfeito para cuidar de Tuen ao lado de Maurice, incompetende como um todo, mas de grande coração. A cidade ficava calma com eles e nenhum tinha ambição. Como era frágil o equilíbrio das coisas. Bastava surgir um homem, um jovenzinho da Fronteira!

Um tremor percorreu a espinha de Olivier. Pierre tinha jeito de mistério. Qualquer coisa na voz dele lembrava o rosno de um lobo de Sátiron. A pele vermelha de Pierre lembrava a cor de um dragão, embora Olivier nunca tenha visto um dragão, mas não importava. Thaila importava. A última chance de Olivier ser feliz. Ele tinha esse direito. Ela tinha de ser dele. Olivier levaria Thaila embora dali, para o Anjário, para a Eslarina, para qualquer lugar. E ele seria feliz. Ele tinha esse direito.

Olivier ouviu o a fechadura mastigando uma chave, ficou de pé em sua cela. Doze eram as celas nos calabouços de Tuen, todas vazias, exceto a sua. Não havia janelas, mas Olivier já estava acostumado ao escuro. Apertou um pouco os olhos quando a luz da rua bateu no corredor. Reconheceu a sombra de Erla no chão de terra batida. A diferença entre Gaul, Maurice e Erla era que Erla Olivier tinha recolhido da rua. Vira-latas são as criaturas mais fiéis que existem, sejam elas gente ou cães.

Olivier observou a mulher negra lutar contra a escuridão e contra a ferrugem para destravar a porta de Olivier.

— Você está livre — disse Erla. — Vamos retomar Tuen.

Mas Olivier havia visto o próprio reflexo nos olhos do povo. Com Thaila fora do alcance, ele voltou a ser peçonhento e sem presas. Ele voltou a pensar sem o veneno da esperança correndo o cérebro. O poder de Olivier não passava de uma casca de ovo esmagada. Ele precisava de outro tipo de poder para combater Pierre.

— Vou a Debur — Olivier disse. Em seguida, ele falou algo que jamais pensou ouvir de sua própria boca: — Precisamos de Henrique.

Do lado de fora havia um cavalo para Olivier.

— Devia haver pelo menos um guarda. Onde ele está? — perguntou Olivier.

— Morreu — disse Erla.

Erla não tinha medo de morrer nem de matar. Não tinha medo da Guerra.

— Nascemos na Guerra — ela disse uma vez. — Ela é o nosso mundo, meu e seu. Tudo o que temos devemos a ela, nós a entendemos.

Erla acreditava que a Guerra falava, que dava instruções. Foi a Guerra, disse, que começou a Revolução em Debur, usando a voz de Erla como instrumento. Ela achava que Olivier também falava com a Guerra, mas ele só continuava na Franária por vingança e mesmo vingança perdeu importância. Ele pegaria Thaila de volta e iria embora para o Anjário.

— Parem! — Veio um grito no fim da rua.

Os calabouços de Tuen ficavam em um beco e Maurice de Tuen bloqueou a passagem com dez soldados. Estava alto, o prefeito, as costas endireitadas, ousadas. Nos prédios ao redor do beco, pessoas espiaram pelas janelas, crianças subiram nos muros. Pierre não estava ali. Maurice sozinho liderava aqueles dez homens.

Maurice avançou com seus homense Olivier ouviu um baque atrás de si, no fim do beco.    

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