— Ele só lê livros sobre feitiçaria — disse Gregoire enquanto esperavam. — Fica pedindo ao pai de Pierre que traduza mais livros sobre reatores de trem.
A porta se abriu e Neville viu-se face a face com um homem negro corpulento, careca de barbas brancas.
— Menior — disse Gregoire — este é Neville de Baynard e precisa de sua ajuda.
— Não — disse o mensageiro. — Não.
Ele passou entre Neville e Gregoire, desceu o morro e Neville perdeu-o de vista quando Menior virou a esquina da uma casa.
— Ele está indo ver o pai de Pierre — disse Gregoire.
Eles seguiram o mensageiro negro e o encontraram parado no meio de caminho, as costas arqueadas para trás, o rosto voltado para o alto, para a copa da árvore negra. Neville não sabia como a árvore se movia, nem em que velocidade, muito menos como ela continuava segurando o cinzento mesmo à distância. Magia, ele pensou, tinha muitas nuances que ele nem imaginava.
Menior foi seguindo os galhos negros da árvore, que tremelicava as folhas aqui e ali como um cachorro secando os pelos. Na ponta de um dos galhos estava o cinzento tentando livrar o braço da madeira mágica.
Neville se aproximou do mensageiro, convsersou com ele, contou suas urgências, pediu que lhe ensinasse o caminho para Tuen. Menior pareceu não ouvir. Continuou com o olhar fixo no cinzento e na árvore.
— Encontrei esses dois nas trevas — disse Neville. — A árvore salvou minha vida e eu trouxe esse homem de volta, mas ele não quer ficar.
— Se não quer ficar, por que não vai embora? — perguntou Menior.
— Porque eu não deixo.
Pela primeira vez Menior encarou Neville. Mensageiro negro e arqueiro mulato se estudaram, se mediram.
— Você sabe quem ele é? — Menior perguntou.
— Não — disse Neville. Ele se aproximou um passo de Menior. — Ouvi dizer que você perdeu a família. Eu gostaria de recuperar o que resta da minha.
— Para isso você precisa ir a Tuen — disse Menior.
— O quanto antes.
— E ele? — Menior apontou o cinzento.
— Vai comigo.
Menior se afastou em direção à árvore negra e examinou o cinzento.
— Menior? É você? Consegue me soltar? — perguntou o cinzento.
Menior demorou a responder. Quando falou, foi uma pergunta:
— Se eu te soltar, o que você vai fazer?
— Vou embora, Menior. O que mais me resta?
— E você — Menior disse a Neville — não deixa ele ir.
— Não — disse o arqueiro.
— Vou pegar meu cavalo — disse Menior. — Arranje provisões para uma semana, roupas quentes, botas impermeáveis.
— Espere — disse Gregoire. — Você vai guiar Neville?
Menior repetiu apenas que botas, roupas quentes, uma semana. Gregoire obedeceu, voltou para a casa que não era mais dele e mostrou a Neville onde ficavam as provisões. Depois foi procurar botas impermeáveis para Neville e para o cinzento.
Gregoire voltou para casa com três botas. Quando Neville perguntou por quê, Gregoire se espantou. Não percebeu que tinha comprado uma a mais.
— É para você? — perguntou o arqueiro. — Você vem conosco?
Gregoire abriu a boca paradizer não, mas a estante de livros estalou, as paredes da casa mudaram de cor. Elenunca quis sair da Fronteira, mas a Fronteira não tinha mais lugar para ele.
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A Boca da Guerra
FantasíaUma guerra de rotina. O rei da Franária morreu sem deixar herdeiros. Aconteceu o de sempre: três primos que se achavam no direito começaram a brigar pela coroa. Depois de quatrocentos anos (e, sim, todos eles tiveram descendentes), a guerra continua...