As tropas deranianas retornaram vitoriosas. Não gostaram muito de encontrar um dragão confortavelmente instalado na colina, mas Luc apontou Pierre, sentado ao lado da criatura, acenando para eles.
— É louco — disse Germon.
— E a Mestra, nossa e de Lune, também está com a cabeça desregulada — disse Bojet.
Naquele momento, Vivianne e Líran subiam a colina em direção a Pierre e o dragão. Marcus esava consciente, mas ainda acamado. Líran movia-se com dificuldade. Seu andar era fluido, porém lento e ela tinha de se concentrar para terminar o mais simples dos gestos. Calculou mal suas capacidades mortais e por sua causa, Sáeril jazia ainda em risco na tenda de Fregósbor. Depois de muita persuasão por parte de Vivianne, Líran finalmente confessou seus remorsos.
— Você foi muito corajosa — disse Vivianne. — O poder que você coletou salvou Chelag'Ren. Ele é muito importante para Pierre.
— Entendo que são amigos de longa data — disse Líran.
— Se eu não tivesse tanto medo, iria até lá conhecê-lo.
— Vou com você — disse Líran. — Não sou Lucille, mas posso ficar ao seu lado.
— Vai contar nossa história um dia? Do jeito que contou todas aquelas aventuras na Pluma?
— Não sei. Minha própria aventura. Achei que fosse ficar eufórica, mas só dói. Se Sáeril viver, talvez um dia ela se torne um bom conto. Desculpe, Vivianne, não quero preocupá-la ainda mais. Venha. Vamos conhecer Chelag'Ren.
A felicidade de Pierre ao ver Vivianne e Líran. Correu até elas, ofereceu o braço a Líran. Cada dente de seu sorriso pertencia a Vivianne.
— Quer mesmo conhecer Chelag'Ren?
— Ele é seu amigo — disse Vivianne.
O dragão foi o motivo de Pierre deixar a Fronteira. Sem ele, Vivianne jamais teria encontrado Pierre. O cérebro de Vivianne se dispersou feito névoa sob sol de verão. A única coisa sólida era a mão de Pierre segurando a sua, a voz de Pierre dizendo palavras impossíveis de se interpretar. Então o próprio dragão falou — o quê? — e sua voz era tão suave, calmante, o oposto do que Vivianne esperava. Na sua frente, gigantesco em vermelho, graciosamente dourado, estava Chelag'Ren, não Guerra.
Vivianne experimentou tocar uma das plumas brancas na ponta da asa do dragão. Aproximou a ponta do dedo, sentiu cócegas, esparramou a palma da mão inteira e finalmente encostou o rosto, olhos fechados. Naquele exato instante, Pierre decidiu que a amava.
Eles levantavam acampamento para voltar a Chambert quando Clément chegou e Pierre reuniu todos em sua tenda. Clément abraçou Coalim, ambos choraram, de alegria, de dor, de saudades, por causa das queimaduras que haviam sofrido. O rei de Deran ouviu a notícia da morte de sua mãe.
— Suponho que agora nada me impede de fazer isto — tirou a coroa de sua mochila e entregou-a a Pierre. — Pertencia à minha mãe. Nunca foi minha.
Germon levantou a mão.
— Podemos confiar nele? Talvez seja melhor executá-lo, só para garantir.
— Clément não representa perigo — disse Vivianne.
— Talvez, mas ele pode ter filhos. Olhe só o que aconteceu à Franária só porque três indivíduos, que nem filhos de rei eram, decidiram tomar a coroa para si.
Antes que a discussão ganhasse vida, Clément declarou:
— Jamais terei filhos — e entrelaçou os dedos sãos nos dedos queimados de Coalim.
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A Boca da Guerra
FantasiaUma guerra de rotina. O rei da Franária morreu sem deixar herdeiros. Aconteceu o de sempre: três primos que se achavam no direito começaram a brigar pela coroa. Depois de quatrocentos anos (e, sim, todos eles tiveram descendentes), a guerra continua...