Duquesas das Águas

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Saio da quitanda com Madalena ao meu lado, ela segura uma pequena trouxa de pano com alguns pertences. Antes de sairmos ela me questionou se passaríamos em seu casebre para que ela pudesse pegar algumas roupas, eu neguei dizendo que tudo que ela fosse vestir e comer a partir de agora seria por conta da casa que a compraria, ela concordou com os termos e seguiu meus passos. Deixando tudo que conhecia para trás.
Assim que coloco o rosto para fora dos panos da quitanda dos vinhos sou recebido com duas carrancas. Engulo em seco.
- Não podemos lhe deixar sozinho por alguns instantes que você já arruma um rabo de saia. – Antonieta esbraveja tomada pelo seu ciúmes juvenil. Não consigo abrir a boca para explicar antes que Berenice me ataque com xingamentos. Os insultos nem são aquilo de pior, o olhar fulminante é sem dúvida, mais mortal que suas línguas.
- Nos deixou sozinhas em meio a uma feira repleta de homens nojentos! E para que? Para aumentar ainda mais seu nicho de admiradoras – Berenice queima Madalena com o olhar.
- Não é o que vocês estão pensando. – Eu digo por fim, tentando retomar o fôlego, temendo onde isso pode dar. Vejo de relance Antonieta colocar a mão sobre a coxa onde sei que ela guarda sua adaga. – Esperem! Ela é mercadoria! – Digo por fim. Berenice parece voltar para seu estado natural de dama quase que de imediato. Antonieta segue seus passos alargando o sorriso em seu rosto e tirando a mão que pousava sobre sua coxa. Assustadoras! Completamente assustadoras!
- Seja muito bem vinda meu bem! – Ambas dizem em uníssono, transparecendo a falsidade feminina. Madalena pisca várias vezes assustada, eu não a culpo, eu mesmo já vi desgraças acontecerem por pura falta de comunicação entre nós.
- Conversaremos sobre isso mais tarde! – Eu digo mirando minhas donzelas que agora sorriem de volta como se nada tivesse acontecido. – Madalena, estas são minhas damas pessoais. Antonieta e Berenice. – Ambas fazem uma mesura - O que vocês compraram em minha ausência? – Troco de assunto para amenizar a situação. Madalena continua imóvel, com medo de em um passo em falso ficar sem pescoço. Minhas mulheres, por outro lado, engancham seus braços nos meus, deixando Madalena alguns passos atrás de nós, enquanto me carregam até a quitanda dos sapatos onde eu as tinha deixado.

Ao chegarmos a quitanda mostram-me alguns pares, desta vez não tão pavorosos quanto os que costumam comprar. Alguns repletos de bordados, já outros com pedras grandes. Separaram quatro pares todos combinando com os respectivos vestidos que adquiriram pouco antes, e um quinto par próximo, elas dão risinhos quando pego o sapato vermelho de salto alto em mãos todo desenhado com contas. Meu rosto transparece aprovação.
Berenice solicita ao dono da quitanda que embrulhe todos os pares. Pago a quantia final pronto para ir embora quando elas me arrastam até a quitanda de joias. Eu começo a negar mais duas horas naquele calor infernal, quando elas me alertam que já escolheram as peças basta buscá-las.
- Você não pode ter uma nova dama sem presenteá-la com uma joia! Onde estão os seus modos? – Berenice me censura.
- Que tipo de homem horrível seria você? – Antonieta debocha. Revelando um colar de ouro com uma pedra azul no centro. A joia é linda, a pedra é do tamanho de uma uva e sei que deve custar uma fortuna. As encaro. Elas garantem que desta vez não vão querer joias, os vestidos e sapatos já estão de bom tamanho. Eu concordo com suas exigências e compro o colar. Madalena nos observa atônita com a quantidade de ouro que eu disponibilizo as minhas damas e o tratamento de rainha que faço questão que elas tenham. Percebo seu olhar, aquilo em baixo de suas pálpebras é pura inveja.
Pouco antes de sairmos da quitanda um objeto chama minha atenção. Trata-se de um prendedor de cabelo em ouro envelhecido, entalhado com o formato de uma rosa. Aquele tom de ouro torna aquela presilha, que mais parece uma coroa, o objeto mais belo que eu já vi em todos os anos de viagem! Ali, no mostruário de uma feirinha em uma cidadezinha esquecida pelos deuses. Questiono o vendedor sobre o valor do mesmo e o senhor confirma sua preciosidade? Minhas damas observam o objeto maravilhadas e um tanto enciumadas. Peço que embrulhe a presilha em um pacote especial e acrescento a mesma a pilha de presentes. Uma rainha merece uma coroa.

Maré BaixaOnde histórias criam vida. Descubra agora