Lua 51, noite para o dia 22

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Eu e Tavaras saímos rindo da sala de reuniões, tropeçando um no outro e nos divertindo feito dois adolescentes.

- Me conte algo sobre você que eu ainda não saiba. – Eu a desafio, ela cerra os olhos tentando fazer mistério.
- Eu já namorei uma das nossas mulheres. – Ela diz e depois corre pelo convés, eu corro atrás dela.
- Você é muito ruim guardando segredo! – Eu digo, me dobrando de tanto rir.
- Mentira! Você sabia? – Ela me pergunta incrédula.
- Todo mundo sabia! – Eu digo, erguendo os braços para o céu coberto de estrelas. O convés está vazio, apenas os marujos de plantão e o menino segurando o timão estão ali. Rindo da nossa notória embriaguez.
- Então me diga você, algo que eu não saiba. – Ela me desafia. Eu a encaro, estalo os lábios e faço uma dancinha.
- Eu já beijei um homem. – Eu digo e levanto as mãos em rendição, ela explode na gargalhada.
- Eu não sei qual de nós dois, é mais idiota. – Ela fala aos berros, eu me sento de tanto rir. – Eu estava junto com você quando o marquês te beijou. – Ela chora de rir. Eu a encaro perplexo. Eu podia jurar que aquilo era um segredo, mas me sinto aliviado por ter contado. Dividir com alguém é bom. – Além do mais, você conta essa história sempre que bebe cerveja. – Ela finaliza. Minha cara vai no chão do convés, arrastado pela humilhação. – Não tem nenhum marujo nesse navio que não saiba disso. – Ela finaliza, eu apenas desisto, volto a rir e bebo mais do rum que eu carrego.

As risadas vão acalmando, eu encaro a paisagem, o céu negro nos guiando através das estrelas, a maré calma, embalando nossas histórias, nossa esperança e nossos sonhos.
Tavaras repousa sua cabeça em meu ombro, olhando para o mesmo horizonte que eu.

- Tavaras, eu escrevo no diário de bordo. – Ela confirma com a cabeça, mas não diz nada. – Eu escrevo todos os dias, cada passo do meu dia, cada pensamento, cada informação. Esses diários são meu legado. – Eu termino de falar. O silencio nos beija, não um silêncio desagradável, um silencio de cumplicidade.
- O que você quer que eu faça com eles? – Tavaras questiona. São tantos anos juntos que nossa ligação parece desumana.
- Se algo acontecer comigo... – Eu começo, ela balança a cabeça, negando. Eu continuo. – Eu quero que você entregue esses diários a Linda. – Eu finalizo. Tavaras me encara. – Eu quero que Linda saiba quem foi o seu pai e porque o cretino não a viu crescer. – Eu volto a encarar o horizonte. Tavaras volta a repousar a cabeça em meu ombro.
- Nada vai acontecer com você meu duque. Você tem homens leais, e mulheres fatais. Não me admiraria se chegarmos em Torunta e Linda estiver empunhando a própria faca.

Eu tento segurar a risada, mas voltamos a nos deixar levar pelas piadas.

- Lembra aquela vez que você estava com a filha do rei? – Eu cambaleio de rir, ela faz sinal de silencio, como se o rei pudesse ouvir nossas confidencias no meio do oceano.
- Eu tive que sair pela janela do palácio! – Ela complementa. – Eu acho que ainda tem cactos na minha bunda. – Eu explodo em gargalhadas.
- Eu fiquei uns trinta minutos fingindo estar cego, para você fugir do quarto da garota! – Eu digo, Tavaras me segura pelos braços, rindo de faltar o ar.
- Eu acho que nunca te agradeci por isso. – Ela diz, eu balanço a cabeça.
- Você já fez tanto por mim... – Ela me abraça.
- E você por mim.

Maré BaixaOnde histórias criam vida. Descubra agora