Capítulo XXXIII

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REINO DE ARTENA



Dor. Assim que sua consciência despertara, mesmo antes de abrir os olhos, Afonso sentia a cabeça doer, como se algo a pressionasse com tanta força que fosse explodir, como se mil agulhas de ferro se projetasse pelas laterais, adentrando pele, osso, até o interior de sua mente, atrapalhando seus pensamentos. Quando abriu os olhos, teve dificuldade em lembrar onde estava, observou a cama, o quarto simples, estava em sua casa, em seu quarto. Ele levou as mãos até a cabeça, tentando apertar, emitiu um leve gemido, uma tentativa inútil de aliviar a dor.

- Isso se chama ressaca. – ouviu uma voz de mulher dizer.

A voz estava alta, alta demais. Ele olhou para a porta ao lado, onde Amália entrava trazendo uma caneca com uma substância fervente. Ela tinha o semblante sério, carregava uma mágoa nos brilhantes olhos verdes.

- Eu bebi demais ontem, não me lembro bem da noite passada. – disse ele, pegando a caneca que a esposa oferecia. Chá de gengibre com folha de louro, bom para dores e náuseas. – Dei muito trabalho para você? Me perdoe.

O pedido dele era sincero, e ia muito além de uma noite de bebedeira, ele ainda desejava pedir perdão por muita coisa. Amália o encarou, o rosto inalterado, mas nada disse.

- Eu tenho que ir à feira, mamãe está lá hoje, pedi pra ela ir para que eu pudesse cuidar de você, vou buscar ervas para fazer uma sopa reforçada, você vai precisar, já que mais tarde tem reunião com o Conselho. – afirmou ela, sem sequer olhá-lo nos olhos.

Antes que Afonso tentasse se levantar, Amália saiu do quarto, ele escutou os passos dela na cozinha e depois ouviu a porta bater. Ela já tinha saído quando ele, tonto e com a cabeça latejando, bebericava alguns goles do chá e tentava se levantar.

As lembranças da noite anterior voltavam aos poucos a sua mente, a imagem de Catarina, deslumbrante em seu vestido de noiva, entrando na igreja, a forma como olhou para ele antes de tomar a mão de Constantino, como ela hesitara brevemente ao dizer o "sim". Assim como ele, ela estava sofrendo por ter que se casar, ele era o responsável pelo sofrimento de Catarina, sabia disso, a pior parte era que sabia disso.

Depois da cerimônia, e de ter que assistir Constantino beijá-la e ostentá-la como um troféu, como sua mais gloriosa conquista, veio a festa, e depois que Afonso começou a beber taça atrás de taça, já não se lembrava de muita coisa, vagas imagens dos noivos dançando na pista de dança, Constantino levantando Catarina num rodopio e a beijando novamente, aplausos, mais uma taça de vinho, depois rum, depois vinho.

Por fim, recordava-se de encontrar o casal, lembrava do sorriso de Constantino e dele próprio erguendo sua taça, mas nada além disso. Poderia ter dito algo que irritara Amália, mas ele imaginava que apenas fosse descobrir quando ela decidisse jogar isso na cara dele.

Constantino era o marido dela, era o rei de Artena e o marido de Catarina. A noite já havia terminado, a manhã já se abrira com um céu azul e um sol brilhante, e ele sabia que a noite de núpcias já tinha passado, o casamento fora consumado. Saber disso fez ele se recordar da noite de tempestade, os dois naquele quarto da estalagem, lembrava-se do toque macio da pele dela e da sensação de tê-la em seus braços.

Não me sobrou mais nada, pensou ele.

Com a dor lancinante pressionando seu crânio, Afonso caminhou até o armário, ainda vestia as roupas da festa. Trocou por uma muda de roupa simples, prendeu os cabelos, suados e pegajosos, e finalizou seu chá, então foi até o armário novamente, observando a parte onde a esposa guardava suas roupas, se perguntava novamente se Amália havia notado alguma mudança nele, se tinha reparado que seus sentimentos haviam se alterado, e se enxergava que a paixão que ele sentia por ela, aquela fervorosa e avassaladora paixão, havia esmorecido e se apagado completamente, deixando apenas o respeito e a admiração que ainda continuava a nutrir por ela.

A Grande Rainha - Contos da CáliaOnde histórias criam vida. Descubra agora