Capítulo XXIV

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REINO DE ARTENA



Já passava do meio dia, Afonso e a esposa haviam conseguido, enfim, depois de tantas horas de cavalgada, se afastar da fronteira de Artena, ele ainda podia ouvir o barulho das águas agitadas do Rio Mirdes ecoando ao longe, sabia que ali, próximo aquelas águas, se encontrava o Aqueduto, a poderosa construção idealizada por ele, que fora apoiada por sua avó e aprovada pelo Rei Augusto, a personificação do progresso de Montemor.

Tudo parece ter acontecido em outra vida, pensou. Tanta coisa mudara desde então, Afonso jamais imaginaria se encontrar na posição que estava nesse momento, o Comandante de um Exército que não o de seu próprio reino, em meio a uma guerra que poderia destruir o que ele agora passara a chamar de lar. Era quase irreal.

Mais de uma semana havia se passado desde que partira de Artena, a viagem a Montemor se estendera mais do que esperava, e ao sair da Aldeia Real, após horas na estrada, eles se depararam com um incêndio em um dos muitos campos de trigo da região, os camponeses corriam aflitos de um lado para o outro, carregando baldes tentando apagar o fogo. Amália desceu imediatamente e se pôs a ajudá-los, Afonso foi logo em seguida, mesmo sua consciência lhe dizendo que devia se apressar em retornar, precisava saber o que se dera com o plano de Catarina, porém ele não tinha conseguido virar as costas para aquelas pessoas, em seu coração, mesmo ele não sendo o príncipe nem o herdeiro, ainda eram o seu povo.

Afonso sempre admirara a força e o altruísmo de Amália, mas nunca como naquelas horas em que ela se dispusera a auxiliar aqueles plebeus em momento de tal desespero, ela era teimosa e por vezes até arrogante, principalmente com pessoas com um status acima do seu, mas era algo inegável que tinha um bom coração, era um dos aspectos que mais o encantara desde que a conhecera.

Por conta do incêndio e do grande trabalho que fora extinguir o fogo e ajudar aquelas pessoas, eles perderam quase dois dias naquele vilarejo, isso fizera Afonso apertar o passo o restante do caminho, tentava compensar o tempo perdido, não conseguia pensar em outra coisa, tinha que saber o que se passara com o Exército e com Otávio.

Eles já tinham atravessado a Floresta de Artena, e agora seguiam na estrada rumo ao Rio Maurele, era onde Catarina tinha instalado a maior parte do Exército e também as armas de guerra, era onde ele dissera que a encontraria.

Enquanto seguiam, Afonso notara a esposa quieta e cabisbaixa, algo que se fazia notar, tendo em vista a personalidade extrovertida e expansiva de Amália. Ela parecia pensativa, por vezes o olhava com o canto dos olhos, ele se perguntava se a esposa o estava analisando, julgando-o, suspeitando dos sentimentos conflituosos que ele carregava, no entanto, porém, talvez isso fosse apenas a culpa de Afonso falando mais alto, ele ainda revivia em sua mente a conversa que tivera com a avó, rezando para que ela se recuperasse logo enquanto analisava o que tinha admitido em voz alta pela primeira vez, que sentia algo por Catarina.

Era um sentimento ambíguo, instável, mas também, ele tinha consciência disso, forte. Afonso não tinha certeza de qual a natureza desse sentimento, qual sua real intensidade ou quando aquilo se instalara dentro dele, mas de uma coisa tinha certeza, era errado, errado de todas as formas que poderia ser.

Eu tenho que esquecer tudo isso, pelo bem de nós dois, pensou convicto.

- Meu amor, veja, soldados de Artena. – disse Amália, tirando-lhe de seus devaneios. Ela apontava a estrada mais a frente, onde dois soldados reais cavalgavam a toda velocidade. – São da Guarda Real.

A Grande Rainha - Contos da CáliaOnde histórias criam vida. Descubra agora