⏩ Intentos

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Por que te abates, ó minha alma? E te comoves, perdendo a calma? Não tenhas medo, em Deus espera, porque bem cedo Jesus virá”.

O louvor ecoava da caixa de som posta em frente de uma igreja. As letras do hino declaravam com nitidez o pesar do coração de Selena. Havia umas três semanas desde que sua fé tinha sido posta em dúvida. A confiança não era mais a mesma. Tudo parecia perder a cor, os olhos pareciam não refletir mais a vivacidade de antes. Por que tinha se afastado tanto? Ela apesar de todos os dilemas instaurados na alma ainda orava e lia a bíblia, no entanto, nada parecia fazer efeito.

A raiz da incredulidade estava se alastrando cada vez mais fundo dentro de seu coração. Queria a mesma confiança de antes, o mesmo caminhar com Cristo de outrora. O sentia tão perto nos seus dias. Era como um amigo que andava ao seu lado na ida para a escola, para o mercado, para a igreja, em todos os momentos, mas Ele estava desaparecendo. Se tornando como uma imagem borrada. Todos os seus conhecimentos acerca da vida tinham a ver com Deus. Ele não poderia simplesmente ser tirado dela. Contudo, onde estava a sua fé?

***

Na hora do almoço, Selena começou seu trabalho. Ela havia informado sobre sua necessidade em acompanhar a mãe pela parte da manhã no médico.  Estar com sua mãe ajudava nos seus momentos de crises, podendo expor toda a sua angústia. Sua esperança a cada dia se esvaía.

Acompanhada de Pilar ao seu lado no refeitório, Selena visualizou o Sr. Berilo se aproximar da sua mesa e então seu coração se agitou ainda mais.  O homem ao ver o rosto cansado da jovem sabia que seu intento havia sido alcançado com êxito. Desde sua juventude colocara no seu coração a ideia de derrotar cada cristão que aparecesse na sua frente. Era quase sua missão na terra, segundo ele. E para sua alegria, boa parte dos crentes que conhecera não tinham argumentos suficientes para defenderem a sua fé. Por isso, sempre vencia em seus debates e quando seu propósito de enterrar a dúvida no coração de cada um tinha êxito, o mesmo se vangloriava. 

Ele se pôs a frente da jovem e sentou-se.

– Selena, por que está tão triste? Parece que seu Deus não lhe ajuda muito, não é? – Ele engoliu seu pedaço de carne com um sorrisinho malicioso.

– Não quero falar sobre isso, Sr

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– Não quero falar sobre isso, Sr. Berilo – Ela respondeu, rispidamente.

– Ora, não fique com raiva! Mas, eu me pergunto: onde está esse Deus que ver os filhos dele entristecidos e não os ajuda? Onde está esse Deus que diz que é tão poderoso e não acaba com essa maldade na terra? Onde está esse Deus de amor que não ampara os indefesos e permite que até mesmo cristãos morram por causa de sua fé? – ele bravejou e quando Selena o viu, o mesmo estava com a aparência endurecida.

A cabeça de Selena dava voltas. Cada pergunta mutilava sua fé. Porque também não sabia respostas para nenhuma delas. Onde? Onde? Onde?

– EU NÃO SEI! – gritou para o homem e todos ao redor a olharam assustados

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– EU NÃO SEI! – gritou para o homem e todos ao redor a olharam assustados.

– Deixe-a em paz! – defendeu Pilar, se metendo pela primeira vez naquela discursão religiosa. A menina sabia que há tempos Berilo perturbava a colega com suas constantes indagações.

– Eu quero que ela seja livre dessas crendices insanas! – ele rebateu para Pilar e desviou o olhar para Selena, que começava a derramar suas lágrimas ali mesmo.

– Quem é o senhor para determinar o que ela deve crer ou não? Estamos num país livre. Podemos crer em quem quisermos – a voz de irritação de Pilar ficou clara.

– Estamos num país livre, portanto, posso falar como eu quiser – retrucou o senhor com o olhar faiscando de raiva para a jovem.

– Não pode, não! – Uma voz grave ressoou no meio da discursão, calando-os imediatamente. 

O Sr. Berilo olhou para o lado, vendo os olhos mortais de Gustavo em sua direção. Devin avaliou a situação de todos na mesa, percebendo como estavam com os ânimos alterados e Selena no canto com os olhos vermelhos.

– Mas o que está acontecendo aqui? – perguntou Gustavo com a voz firme para o homem ao lado.

– Nós só estávamos discutindo sobre alguns assuntos, Sr. Devin. – Berilo declarou, já levantando.

Berilo passou ao lado de Gustavo que o segurou no braço e disse no seu ouvido:

– Não vou esquece mais essa briga. – Soltou o braço do homem e Berilo partiu de cabeça baixa.

Gustavo seguiu para o lado de Selena e ao vê-la naquele estado estendeu a mão.

– Venha comigo. – A menina sem demorar segurou em suas mãos e se levantou.

Devin olhou para Pilar e informou:

– Diga ao Sr. Dário que precisei ter uma reunião com Selena. Logo ela voltará para suas funções. – A jovem apenas assentiu com a cabeça.

***

Com as mãos na cintura de Selena, Gustavo a conduziu até sua sala. Ela estava tão desprotegida e desolada, ele sabia bem o que precisava fazer nesses momentos.

– Sente-se aqui – disse ele para a jovem a acomodando no sofá preto de seu escritório.

Ela sem ao menos dizer uma palavra apenas obedeceu, ainda com seus olhos distantes e sua mente cansada que não se atentava a nada. Gustavo sentou-se próximo e abraçando-a de lado, declarou:

– Descanse aqui um pouco. – Ele escorou-se no encosto do sofá com ela em seus braços. – Não se preocupe, eu vou resolver o problema com Berilo. Não é a primeira vez que ele me dá trabalho. – Começou a acariciar os cabelos ondulados da jovem.

Selena conseguia sentir o sinal vermelho dentro de si, mas naquele dia não queria o ouvir. Gustavo era quem estava sendo o seu auxilio em meio a sua dor e ela só desejava se aninhar ainda mais em seus braços, aparentemente tão quentes e protetores. Ela se encolheu um pouco mais ao lado de Devin e ele a puxou para si.

Ao vê-la ali, ele teve a certeza de que logo conseguiria alcançar seus intentos.

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