⏩ Em Comum

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– Esse é o novo modelo e ele é um sucesso de vendas! – As palmas foram acentuadas naquela reunião no refeitório com todos os funcionários. – Parabéns a vocês que trabalham com entusiasmo e por conta disso nossa empresa está crescendo ainda mais. – Dário terminou sua fala, agitando ainda mais a multidão de empregados, inflamando o orgulho do povo.

O lançamento da nova moto havia sido um momento memorial. Há meses toda a empresa trabalhava em cima disso e finalmente haviam recebido o retorno e ele era melhor do que pensavam. Depois desses dias de sufoco para o lançamento, os funcionários tiveram mais descanso e nem havia mais tanta correria. Era fim de expediente, quando foram dispensados e ainda haveria tempo de Selena comprar algumas guloseimas a fim de levar para sua especialização. Com os afazeres na empresa, ela não demorou muito para perceber que se identificava com a área administrativa, querendo assim se aprimorar mais. Ela aproximou-se do balcão e pediu chá de hortelã. Selena amava chás. Pegou seu pedido e sentou, tomou um livro nas mãos e começou a devorá-lo. Há tempos não lia uma história tão atraente como aquela que lia no momento.

– Posso me sentar com você? – a voz de Gustavo invadiu seus tímpanos, arrepiando toda a derme de seu corpo. 

Nesses dois meses de trabalho, procurou a todo custo se desviar do homem, que constantemente visitava seus pensamentos e queria fazer morada em seu coração, mas o olhando naquele momento a sua frente com aquele belo sorriso, não sabia se ainda queria lutar.

– Pode sim. – Consentiu, apesar de achar que devia fugir da presença dele.

– Está tão bonita hoje! – ele a elogiou, de repente.

Selena, ao ouvir aquelas palavras, não podia acreditar. Ele nunca havia a elogiado ou mesmo lhe dito uma palavra fora da formalidade. Aquilo era surpreendente!

– O-obrigada, eu acho. – Por um momento ficou gaga.

– Gosto do seu jeito, Selena. – Ele tomou o assento à frente dela. – Tenho observado você e percebido seus encantos. – Gustavo estava sendo bem diretos nas palavras, deixando-a com os olhos arregalados sem conseguir processar nenhuma de suas palavras.

Nesses meses eles trocavam alguns olhares, e ela sempre desviava e virava-se para o outro lado. Eles se encontravam em algum dos corredores da empresa quando ela levava alguns relatórios. Mas, dessa vez, ele parecia estar sendo bem invasivo.  Indo direto ao ponto.

– Me observado? – perguntou incrédula com o cenho franzido.

– Sim, Selena. – A atenção dele, agora, estava no menu, porém não parecia com a intenção de querer comprar alguma coisa.

– Acredito que não tenho nada de especial para que eu possa ser alvo de observação. – Ela fechou o livro em sua mão.

– Tem sim. – Ele deixou o cardápio de lado e a fitou com seriedade. – É diferente das outras meninas, não é fútil. – Sem pedir permissão tocou de leve o dorso da mão dela. O arrepio em Selena subiu dos pés a cabeça. – Você é tão pura!

As palavras dele fizeram borboletas despertar e voar dentro dela. Achou que seu sonho estava começando a virar realidade. Era como uma utopia.

– Obrigada... – Agradeceu tímida e levantou-se vendo que sua senha havia sido chamada. – Desculpe, mas eu tenho que ir. – Foi até o balcão pegar o chá gelado, batatinhas e pagar. 

– Para onde vai? – Ele levantou também e foi no seu encalço.

– Para minha especialização, tenho aula às 19h. – Tomou um gole do chá, na vã esperança de esfriar a queimação que sentia dentro de si. 

– Eu poderia deixá-la no local. – Gustavo se ofereceu com gentileza.

– Não é necessário, senhor. – Ela ia abrir a porta de vidro para sair, mas ele foi primeiro e deu espaço para ela passar.

Selena apenas olhou para o chão e passou. Ao seu lado, ele declarou:

– O que eu falei sobre me chamar de senhor?

– Perdão! Mas não é preciso, Gustavo – ela enfatizou, e apressou os passos, procurando se esquivar. Ela tinha medo de si mesma e dos próprios pensamentos acerca dele.

– Eu faço questão! – A segurou pelo braço, fazendo a parar abruptamente. – Vamos, meu carro está logo ali. – Indicou a garagem com a cabeça.

Selena soltou uma lufada de ar, sentindo suas pernas bambear. Ela não devia fazer isso, mas ele não a deixaria em paz. Ao fitá-lo novamente, percebeu o seu olhar intenso e cedeu, ambos entraram no carro.

– Conte-me sobre você – pediu ele, assim que deu partida.

Ela resolveu falar sobre sua família, enfatizando as sobrinhas e suas artimanhas, que apesar de tudo, traziam muita alegria para sua vida. Ele riu muito das travessuras das pequeninas. Selena expressou seus planos para o futuro, se Deus permitisse. Contou sobre o que mais gostava no trabalho e seus hobbies preferidos. A conversa logo no início parecia travada, mas com o tempo fluiu, assim como as águas descendo sem impedimentos de uma cachoeira. Gustavo também começou a compartilhar sobre sua paixão por escaladas e viagens. Os dois perceberam que havia muita coisa em comum, e entendendo isso, ele sorriu abertamente. Pensava que nunca encontraria uma menina que gostasse das mesmas coisas que ele. A conversa seguiu tão bem que quando perceberam já estavam perto do prédio no qual ela estudava.

Ele parou o carro devagar e olhou para o volante com calma. Selena não sabia direito como agir e então retirou o cinto de segurança. Gustavo percebendo a movimentação dela virou-se na mesma hora e lhe segurou a mão. As mãos de Selena estavam gélidas e os seus batimentos cardíacos acelerados. Aquela intimidade toda era nova em sua vida. 

– Foi bom te conhecer, Selena. Você é incrível! – Gustavo se aproximou, fazendo o coração dela palpitar quase saindo para a fora da caixa do peito. Ele lhe depositou um beijo na bochecha vermelha e o seu cheiro invadiu as narinas dela, deixando-a inebriada.

– O prazer foi meu. – Ela agradeceu ainda presa naquela bolha.

Ele sentou-se novamente no seu lugar e sorriu ao ver a expressão encantada da garota.

– Gostaria de poder conversar mais com você. Vamos marcar alguma coisa?

Selena não soube o que responder. Era muito bom pra ser verdade.

– Eu vou ver e aviso. Tudo bem? – Foi tudo o que conseguiu dizer.

– Sim, vou esperar. – Ela assentiu e abriu a porta do carro.

Ao descer ficou parada e observando ele se afastar. O que tinha acabado de acontecer?  Aquilo era real mesmo? Ela sorriu como uma criança que acabara de receber seu brinquedo favorito e, ao olhar no relógio, esse a despertou de seu tupor e a fez voltar à realidade e, neste momento, ela estava atrasada.

FIELOnde histórias criam vida. Descubra agora