⏩ Repressão

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Aqueles intensos olhos verdes a fitavam dos pés a cabeça com uma aparência rígida e ao mesmo tempo saudosa. O coração de Selena acelerou a mil, sentindo a dor e a fraqueza voltarem como uma avalanche sobre seu corpo; as pernas sinalizavam que a qualquer momento poderiam não mais sustentá-la em pé; as mãos ficaram trêmulas e o suor frio começou a transparecer em sua testa. Aquele elevador ficou sem ar. O oxigênio tinha fugido de seus pulmões.

Gustavo estava de frente para ela com os braços cruzados no peito e nem um dos dois ousou dizer nada. Ele sentia-se humilhado todas as vezes que a via. Era pra Selena ser sua. Sua! Olhando-a naquela posição indefesa, percebeu como todas as suas noites de amores com outras mulheres – desde aquele dia em que ela não o aceitou – haviam se mostrado sem sucesso. O desejo por ela não havia recuado um mísero centímetro.

Selena engoliu em seco ao vê-lo tão compenetrado ao examiná-la de cima a baixo.

– E-e-eu... – Ela tentou formar uma frase e não obteve sucesso.

Ele simplesmente estendeu o braço e apertou no botão vermelho do elevador, fazendo-o parar. Selena suspirou com temor pelo que estava prestes a acontecer ali dentro.

Devin, a passos lentos, se aproximou da jovem, fazendo-a escorar na parede fria de aço. Ele apoiou a mão na parede ficando face a face com a mulher que toda noite visitava seus sonhos. Ambos sentiam a respiração quente um do outro e o ressoar da voz dele saiu quase como num sussurro:

– Não diz nada. – Acariciou com o polegar nas maças do rosto de Selena, sentindo a maciez da pele e o calor que emanava do corpo dela. Ele a queria com ardor!

A jovem sentia-se extasiada com aquela aproximação. Lá estava o homem objeto de todos os seus desejos e que lhe era proibido. Até cogitou em tocá-lo, mas seria perigoso, além do que já estava. Fechou os olhos, sentindo todos os seus ânimos sendo despertados com a carícia das pontas dos dedos dele. Oh, céus! Como gostaria de poder amá-lo sem reservas. De poder dar asas a sua paixão tão ardente, que invadia seu coração e a consumia por inteiro em um desejo que nem ela mesmo sabia explicar, mas lhe dizia nos ouvidos que deveria usufruir de tudo aquilo. Que mal havia naquilo se era recíproco para os dois? Seu coração perguntava.

Na verdade, poucas pessoas na vida tem a chance de se apaixonar e ser correspondido. Ela se lembrou de ouvir na televisão uma vez alguém dizer, "Se você achar uma pessoa que compartilhe do mesmo sentimento, se case". Aquele conselho parecia ser terrivelmente tentador e, se encaixava perfeitamente naquela situação.

No íntimo do seu ser, clamou: – Tenha misericórdia de mim!

Ela o afastou com as mãos e uma lágrima solitária desceu em seu rosto.

– Por que ficar sofrendo se você pode me ter? – Gustavo perguntou irritado ao vê-la lagrimar. – Droga! Eu não suporto mais esta situação! – Ele esmurrou o vidro do elevador, fazendo-o trincar pela tamanha força recebida. – Nós dois somos apaixonados um pelo outro e não podemos ficar juntos, por causa de uma FÉ! – vociferou na última palavra e Selena estava ficando com a respiração ofegante.

Ele apoiou as duas mãos na parede, abaixou a cabeça e respirou fundo, tentava quase em vão controlar seus ânimos. Selena não conseguia dizer uma palavra. O desejo do seu coração era o abraçar e ficar com ele. Essa era a verdade! E se tentasse pronunciar alguma palavra, provavelmente sairia: Fica comigo.

Enquanto ela pensava, o ouviu declarar:

– Você sabe quantas noites fico acordado pensando em você? – Ela desviou o olhar dele.

Gustavo podia se lembrar das altas madrugadas que esteve com uma mulher em seus braços e ele só pensava em querer que fosse Selena ali, dormindo ao seu lado, apoiando a cabeça em seu peito durante a noite. Desejava poder acariciar os cabelos ondulados dela, acordar com a visão do gentil sorriso da dona de seus pensamentos, tomar café da manhã na companhia de Selena. Queria compartilhar os seus dias com ela, até onde fosse possível.

– Todas as noites. – Uma lágrima desceu na face dele. – Eu tentei, Selena. – Andou na direção dela novamente. – Tentei esquecê-la! Bani-la da minha mente! Mas, tudo foi em vão!

Ela recuou para o lado, porém Gustavo segurou suas mãos finas e macias.

– Não fuja de mim! – disse desolado.

– Por favor – um nó se formou na garganta dela –, não torne isso mais difícil! – Ele pôde ouvir a súplica na voz da jovem.

– Nós dois estamos infelizes, Selena, será que é isso que o seu Deus quer?

– Ele antes de tudo deseja obediência a sua palavra – respondeu baixo, tentando a si mesma se convencer daquelas palavras. – E, por mais que seja doloroso, no fim, o caminho dele é sempre o melhor. – Selena se abraçou e deslizou pela parede do elevador, sentindo as suas forças faltarem. Um tremor começava a dominar seu corpo fraco e ela não sabia mais o que fazer.

– Que inferno! – vociferou Gustavo, batendo as mãos com força ao lado do corpo. – Será que não pode deixar o seu Deus por um dia e resolver a nossa situação sendo sincera consigo mesma, ao invés de se esconder atrás de uma bíblia! – A voz rude dele a fez estremecer ainda mais, sendo a razão para que ela afundasse seu rosto entre seus braços e deixasse as lágrimas descerem livremente.

Fraqueza.

Tremor.

Náuseas.

Seu corpo estava prestes a sucumbir.

– Jesus, me ajuda! – ela orou em meio a sua agonia.

"Porque a mim se apegou com amor, eu o livrarei; pô-lo-ei a salvo porque conhece meu nome"*. Aquele versículo bradou fortemente em sua mente.

Selena provando de um milagre pôde perceber suas forças voltarem o suficiente para se erguer daquela posição. Ela umedeceu os lábios e o fitou.

– Não, não posso deixá-lo por nenhum um minuto. Cristo não é apenas uma parte da minha vida, Ele me salvou para eu ser dele por inteira. Se você tirar a bíblia de mim, eu morrerei, porque só sobrará podridão!

Ela respirou fundo.

Gustavo como que paralisado não ousou pronunciar nenhuma outra acusação.

A jovem apertou o botão vermelho e as portas do elevador dentro de segundos se abriram e ela saiu sem olhar para trás. E, ao constatar em que corredor havia entrado, soube exatamente qual era a decisão que deveria tomar.

Andou até uma das portas, e inspecionou dentro da sala. Avistou apenas a senhora Solange sentada a frente do computador preto. A mulher sorriu para Selena e a chamou com a mão. Aquela sala com paredes brancas e nenhuma outra cor para se ressaltar fez a cabeça da jovem rodar. Ela estava certa do que faria ali. Absolutamente certa!

– O que deseja minha jovem? – perguntou a mulher.

Selena ao ouvir a pergunta fitou as mãos frias e entrelaçadas em frente ao corpo. Respirou fundo e com toda a sua coragem declarou:

– Quero pedir demissão!

FIELOnde histórias criam vida. Descubra agora