Confronto direto

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            POV CAMILA

Quando tirei os fones, pude ouvir um recado vindo da caixinha de som do quarto. Era um homem — o reitor, acredito — pedindo para que fôssemos ao pátio central. Preferiria ter ficado no quarto, e acho que teria sido a melhor decisão. Meu dia estava maravilhoso? Estava, mas, é claro, tratando-se de mim, isso era muito suspeito. Dito e feito.

No caminho até o pátio, decidi comprar uma bebida, já que estava sonolenta por ter acordado tão cedo. Lá se foram sete dólares no lixo, graças a uma roqueira louca e distraída que se esbarrou em mim. Que desperdício,  todo aquele copo de perfeição em formato de café pingando no look de motoclube da estressadinha. Ela anda por aí com a cara dentro do celular e ainda quer gritar comigo? Isso não.

O reitor, que agora sei que se chama Simon, queria dar boas-vindas e nos desejar um bom ano letivo, além de nos informar sobre a "First Party" que, como o nome diz, é a primeira festa do ano realizada no segundo dia de abertura dos portões. Já tinha lido sobre a tal festa na internet, e estava ansiosa. Além disso, o homem também informou que as aulas começariam em quatro dias.

Voltei ao quarto ouvindo um barulho de chuveiro aberto. Horário estranho para tomar banho — disse para mim mesma em voz baixa. Sentei-me na cama e peguei meu violão.

Para dias ruins, música; para dias bons, música — disse novamente em tom ameno. Falo muito sozinha; é uma mania de família, creio eu. A presença de outra pessoa ali não me incomodava. Comecei a cantar.

> Am I out of my head? (Será que eu perdi a cabeça?)

Am I out of my mind? (Será que eu estou ficando louca?)

If you only knew the bad things I like (Se você soubesse as coisas más que eu gosto)

Don't think that I can explain it (Não acho que consigo explicar)

What can I say, it's complicated (O que posso dizer, é complicado)

Don't matter what you say (Não importa o que você diga)

Don't matter what you do (Não importa o que você faça)

I only wanna do bad things to you (Eu só quero fazer coisas más com você)

So good, that you can't explain it (Tão bom, que não dá para explicar)

What can I say, it's complicated (O que posso dizer, é complicado)

Nothing's that bad, if it feels good (Nada é tão ruim, se o sentimento é bom)

So you come back, like I knew you would... (Então você volta, como eu sabia que você faria...)

Você?!

Parei imediatamente de tocar quando vi quem era. Mas não é possível que minha vida vai se tornar uma sequência de cenas de filmes adolescentes.

__O que você está fazendo aqui? — perguntei com a voz firme, mas já sabia a resposta.

__Bom, como você já deve estar imaginando, esse é o meu quarto! — a garota também se alterou. Eu que não vou abaixar a cabeça; me levantei e fiquei frente a frente com ela.

__Em primeiro lugar, o quarto é nosso; em segundo lugar, abaixe o tom para falar comigo! — a garota sorriu de canto e se aproximou.

__Ou você vai fazer o quê? — disse, chegando mais perto. Parou na ponta de minha cama, e apenas dois palmos separavam nossos rostos. Eu não conseguia pensar em nada para responder; senti algo muito estranho dentro de mim, uma mistura de raiva com admiração por aquele par de olhos verdes. Como eu não os tinha visto antes?

__Belos olhos... — soltei sem querer e tive a sorte de ela não escutar com clareza.

__O que disse? — mexi a cabeça negativamente na tentativa de disfarçar minha fala anterior. Semicerrei os olhos diretamente aos seus e respondi a primeira coisa que veio à minha mente.

__Só fica longe, roqueira. — Ela gargalhou. Apesar da raiva, não pude deixar de notar o quanto sua risada e seu sorriso eram bonitos. Foco, Camila!

__Em primeiro lugar — disse, me imitando. __É sério isso? Eu não sou roqueira, e, em segundo lugar, pode ficar com esse quarto. Eu vou falar com o Cowell. — virou-se em direção à porta. Impressionante como essas riquinhas metidas pensam que podem conseguir tudo.

__Vai perder seu tempo. — Sem entender nada, ela se virou.

__Como é? — questionou. Caminhei de volta até minha cama e sentei-me.

__Trocar de quarto. Se tivesse ficado para ouvir o recado do reit...

Eu teria ficado se você não tivesse me dado um banho de cappuccino. — interrompeu em tom de deboche, mas eu já não estava mais com tanta vontade de trocar insultos com esse ser humano.

__Posso falar? - finalmente se manteve em silêncio.

__Simon disse que pedidos para troca de quartos seriam negados, se quer ir lá, fique à vontade, mas vai perder tempo. - respondi enquanto procurava o contato de Dinah em meu celular.

__Não pode ser. - essa foi a última coisa que consegui escutar antes dela sair batendo a porta.

__Dai-me paciência. - supliquei aos céus enquanto iniciava a tentativa de chamada com DJ.

Dinah é praticamente uma irmã para mim; apesar de ter um parafuso a menos na cabeça, é a pessoa mais maravilhosa que eu tenho em vida. Nos conhecemos no início do colegial e, desde então, não nos desgrudamos mais. Estou ansiosa, ela também está vindo estudar aqui, e a ligação é justamente para saber quando chega.



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[Ligação on]

-Dinah: Beyoncé falando, quem deseja?

Sempre com uma forma criativa de atender ligações...

-Camila: Idiota, eu estou com saudades, quando você vem?

-Dinah: Owwnnt, logo estarei por aí. Antes que eu me esqueça, não marque nada para quinta, vamos sair.

-Camila: Como assim sair? Para onde? Dinah, não dá para ficar saindo assim.

-Dinah: Camila, se eu estou falando que vamos sair, é porque dá. Você faz perguntas demais, relaxa, little girl, deixa comigo.



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Conversei com Dinah por quase duas horas. Depois, a pedido de minha mãe, desfiz minhas malas, ocupei meu lado do armário, estabelecido por uma divisória, e as duas gavetas grandes que ficam abaixo da cama. Tenho muitas meias e pijamas, precisava desse espaço para eles. Também aproveitei meu tempo sozinha para organizar meus horários de aulas, e confesso que isso me cansou bastante. Decidi sair para comer, já que estava com o estômago praticamente vazio o dia todo, e, quando voltei, simplesmente tomei banho e apaguei.



Um brinde ao nosso anjo - CAMRENOnde histórias criam vida. Descubra agora