Capítulo 04: P/2

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Cristian

Enquanto analiso os papéis que a Jhey acaba de deixar na minha mesa, ela fica de pé bem próxima a mim, não sei ao certo o porquê. 

- Se quiser ir, já pode. Não vou terminar de organizar esses documentos agora - falo sem tirar os olhos do papel.

- Antes de sair, posso fazer uma pergunta? - sussurra com a voz suave.

- Pode. - Volto o meu olhar para a mulher à minha frente. - Depende da pergunta. - Ela desvia o olhar, quebrando o nosso contato visual. - Pergunte o que quiser.

- Bem, eu gostaria de saber se...

Ouço meu celular vibrando. Tento ignorar a chamada, mas quando vejo que é o meu pai decido atender.

- Só um momento, Jhey.

- Tudo bem! - Sua inquietude deixa-me apreensivo. O que, afinal, ela gostaria de saber?
                    

*****
- Oi, pai. Não sei se posso participar de mais um compromisso hoje. A minha agenda está cheia - minto. Ele me ignora.

- Cristian, o assunto é urgente - avisa. - Não esquece. Reunião daqui a vinte minutos.

- Pode ao menos adiantar o motivo dessa reunião repentina?

- Suba até a sala 02 e saberá.

- Pai..

- Sem mais perguntas. Por favor.

****

- Desligou na minha cara. Eu não acredito. Era só o que me faltava. - Ponho o celular sobre a mesa. Faço algumas anotações e entrego-as à minha secretária. - Guarde-as para mim, por favor.

- Okay. Eu já vou indo. - Se encaminha para a porta a passos rápidos, como se tivesse fugindo de algo ou alguém.

- Jhey, o que gostaria de saber a meu respeito. Acabei interrompendo você. - Ela não parece muito interessada em compartilhar a dúvida comigo.

- Não era nada. Bobagem minha. Não se preocupe. - O constrangimento na face da garota de olhos verdes é nítido. - Eu posso sair, não é.

- Se não tiver nada pra dizer, pode.

- Não tenho - Se apressa em dizer. Seus braços apertam uma pasta verde, comprimindo-a com força.  Suponho que se esse objeto fosse uma pessoa estaria sufocada.

Meu celular vibra outra vez. Duas, cinco, dez mensagens. Todas do meu pai. Eu que fui ofendido, e ele que fica bravo?


Depois de checar a hora me dirijo até o local combinado. 

                      *******

Ao adentrar à sala de reuniões  encontro meu pai andando de um canto a outro do cômodo, bastante inquieto, e  seu velho e incognito amigo sentado numa cadeira, bem calmo. Vê-los juntos não me assusta, mas me incomoda.

- Onde você estava? - Passa um lenço no rosto pra enxugar o suor. Está tão frio, e meu pai está suando? Por Deus, o que está havendo?

- A pergunta certa é: qual o motivo desta reunião? E onde estão os demais sócios da empresa? Devo ter chegado cedo. - Tento parecer calmo.

- Quero que saiba Cristian que seu mal-humor não vai ajudar em nada.

- Meu humor está ótimo. Não está vendo?

- Muito bem. Nesse caso, poderia fazer a gentileza de se retratar com o Dalton, não é mesmo? - sugere.

- A palta é sobre o que ocorreu ontem? É isso mesmo? Pelo o que eu me lembro, não ofendi ninguém.

- Estávamos apenas conversando, não é mesmo, Cristian. Um diálogo bem agradável - pondera o magnata.

- Não foi o que eu vi, mas se você diz que está tudo bem. - Sua mão pousa no ombro do bilionário. - Está tudo bem!

Mais um candidato a me enlouquecer. Só que o monsieur vai ter de entrar na fila, porque a lista é extensa.

- Pois bem - Meu pai começa a falar. - Imagino que você já saiba porque está aqui, Cristian. 

- Eu esperava que me dissesse! - replico magoado.

- Conversei com os outros sócios da empresa, ontem, e endividados como estamos não vejo razões para continuar essa discussão. Vamos vender a GR pra poder liquidar as nossas dívidas.

- Como é que é? Repita o que disse, por favor! Tenho certeza que estou ouvindo errado ou meu cérebro não está processando as coisas como deveria. Falidos. O que aconteceu com os nossos bens?

- Os gastos com o Noah são altíssimos. E boa parte dos nosso patrimônio já não existe mais.

- Como assim? Não existe? Evaporaram?

- Quem você acha que bancava a boa vida do seu irmão, em Petrópolis? As centenas de viagens internacionais? Festas, estudos, o clube de tênis que ele frequentava, o de golf, bares, boates, entre outras coisinhas que investiguei. O estrago foi bem maior do que imaginei que fosse.

- E o senhor so me diz isso agora? Eu estive todo esse tempo trabalhando pra agora descobrir que estamos falidos? Por isso ele veio morar em Dalence. No fim de mundo que ele não suporta, não é, "papai". Tudo faz sentido, meu Deus! - Levo as mãos aos meus cabelos, atônito.

- Cristian, menos drama. Não estamos falidos. Ainda não. Mas não podemos ficar com a GR.

Isso não pode está acontecendo. Não comigo. Eu sei que sou azarado mas isso não é um azar é uma catástrofe.
             
- Preciso sair pra respirar um pouco. O ar dessa sala está me sufocando. 
          
- Cristian, não pode fugir agora que o caos se instalou nas nossas vidas. Preciso da sua assinatura. O Noah precisa de você!!

- Por que o Noah, pai. É sempre o Noah!! Como se não bastasse a Eloíse com os joguinhos de manipulação dela, agora você, pai? Isso é de mais pra mim. Me deem licença, preciso sair.

- É bom saber que não tem remorsos pelo o que acabou fazendo com o seu irmão, que consegue ficar tranquilo diante de uma situação tão delicada como essa, sendo que tudo o que ele queria era te impedir de cometer uma loucura no momento em que entrou no seu carro. - Fico de costas, parado, apenas ouvindo os insultos proferidos pelo homem a quem chamo de pai. - A sua mãe te chama de egoísta e ela tem toda razão. Não é hora pra você inflar o ego e deixar o orgulho falar mais alto. Nem bancar o adolescente fragilizado e massacrado pelo mundo.

- Ela não é minha mãe. É sua esposa. Mãe do seu filho mais novo, mas nunca substituirá Kizz Guiavila - brado. - E depois de ontem, não me peça mais nada.

- Sei que esse é um assunto de família e bem delicado, mas tenho certeza que há outros meios bem mais pacíficos de resolver situações como esta - Dr. Lacerda, que até o momento apenas observa a confusão, intervém.

- Você tem razão. Cristian, me perdoe, filho, vamos conversar como dois adultos civilizados. - Ele toca no meu ombro, o encaro com fúria nos olhos.

- Não encoste em mim. Pode acabar se contaminando com o meu egoísmo - falo com os dentes semicerrados.

- Cristian, volta aqui! - Seu chamado parece mais uma súplica.

- É melhor deixar ele ir. Não vai conseguir convecê-lo do jeito que ele está.

- O que faremos?

- Eu não sei ainda. - Só ouço até essa parte. Até porque estou irado demais pra perder tempo com conversa boba. 

ISA.

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