Corpo em combustão

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Gwyn acordou num quarto enorme, não era o seu. Abriu os olhos bem lentamente com a claridade que estava no ambiente, Nestha e Emerie estavam um de cada lado da cama, sentadas em poltronas para acomodarem asas de illyrianos. Já estavam sentadas desconfortáveis um bom tempo, pelas feições cansadas e a cabeça tombando para o lado.

A jovem sacerdotisa se ergueu um pouco, o corpo todo dolorido, por dentro era como se tivesse queimado todos os órgãos. A boca estava seca e com gosto de cinzas, ou era sangue, ela não sabia dizer. Deu um gemido de dor conforme se sentava mais érea na cama e as duas amigas despertaram, preocupação e carinho nos olhos.

-Oi! -Nestha se aproximou sorrindo. -Como você está?

-Preciso de água. -Gwyn tentou soar o mais calma possível, mas estava difícil falar e respirar com a garganta seca.

Emerie levantou rapidamente e encheu uma taça de água e entregou para ela.

-Ficamos com tanto medo e preocupadas com você. -Emerie disse baixo e depois serviu mais água na taça.

-Eu acho que estava delirando lá. Elain, acho...acho que ela me envenenou. Por um momento achei que estava lançando fogo por todo o canto. Só me lembro de derrubar Tamlin e Graysen.

Nestha e Emerie trocaram um olhar de medo, engoliram seco com medo de proferir as próximas palavras.

-Gwyn, você não estava delirando ne sonhando. Madja disse que tinha veneno no seu sangue, mas era pouco. E... o fogo...-Nestha engoliu seco novamente.

-...foi você que fez aquilo. Você tem poder da Outonal, conseguiu fugir porque causou uma explosão de labaredas por toda a propriedade de Graysen. -Emerie completou sem olhar nos olhos da amiga.

Gwyn arregalou os olhos e os direcionou para a colcha esticada sobre ela. De repente sentiu o corpo formigar de novo. Aquela sensação de estar queimando por dentro e o fogo saindo, tentou controlar o pavor instalado dentro dela. Respirou fundo uma, duas e três vezes.

-Você sabe não sabe? -Gwyn perguntou a Nestha.

-Sei o que? -Ela se fingiu de desentendida.

-Quem é? Quem é meu pai?

Nestha contorcia as mãos apertando a dobra da colcha. A garganta oscilando.

-Nestha! Me conte. -Gwyn se esforçou para a voz sair firme, mas não foi mais que um sussurrou exasperado.

-Sei. Eu sei quem é seu pai, mas você não precisar saber agora, pode esperar ate estar pronta. Você tem que se recuperar completamente.

Gwyn fechou os olhos e encostou a cabeça na cabeceira, inalou forte.

-Por favor, me diga que não é Beron. -Ela disse triste, sem forças.

-Não. Não é ele. -Nestha disse firme com certeza, pelo menos isso devia ser uma coisa boa.

Se Gwyn fosse filha do desgraçado do Beron não aguentaria de vergonha, se mataria antes da noticia que o grão-senhor da Outonal era seu pai. Ela sempre soube que tinha parentes naquela corte, seu avô era de lá...

-Espere! Se ele não é meu pai...então, não pode ser -Gwyn resmungou e Nestha confirmou com a cabeça para a pergunta silenciosa da amiga.

-Beron é avô de Gwyn? -Emerie perguntou com a mesma surpresa da sacerdotisa.

-É, ele é o avô dela. Eris...-Nestha fervilhava. -Ele é o seu pai.

Gwyn não sabia se ficava feliz ou triste ou ate mesmo com raiva. Todo esse tempo ele podia muito bem saber que tinha uma filha e que era ela, mas nunca a procurou, ele tinha tido duas filhas e nem se importou. Seu único consolo era que pelo agora Eris era aliado de Rhys e Feyre, e não um inimigo. Mas ela soubera o que foi feito com Mor, o que seu pai fez, ou melhor, que deixou de fazer. Largou a linda e alegre Mor presa numa árvore somente com um recado no corpo.

-Gwyn, por favor se acalme, depois nós resolvemos essa questão. -Emerie se apressou.

De repente percebeu o quanto a sala tinha ficado quente, ela aquecera o ambiente com seu poder. O poder que herdou de seu pai. Se perguntou se Catrin também tinha aquele mesmo poder, e se ela tivesse o descoberto.

-Melhor esquecermos isso, se ele nunca nos procurou antes não vai procurar agora. É melhor deixar do jeito que está. -Gwyn disse firme sem emoção nenhuma na voz. -Preciso da ajuda de vocês para voltar à biblioteca.

-Não quer descansar mais um pouco? -Emerie perguntou.

-Não, estou bem preciso ir para a Casa. -As duas a ajudaram sem dizer nada, cada uma de um lado, os braços de Gwyn apoiado nos ombros de Nestha de Emerie.

Seu corpo doía, sua mente estava destruída, não conseguia pensar em nada, nem andar pelo visto. Desceram as escadas muito devagar, passaram por um corredor que estava com uma porta grande aberta. Olhou para dentro, não conseguiu impedir os olhos, Rhys, Feyre, Cassian, um macho perfeitamente lindo, e Azriel...

Culpa e dor brilhavam naqueles olhos de avelã. Ele firmou o olhar, no entanto, Gwyn desviou e seguiu seu caminho acompanhada de suas amigas.

~

O encantador de sombras estava quieto durante toda a reunião, não tinha uma palavra sequer depois que voltara com a sacerdotisa entrando em combustão na Primaveril.

Eles tinham demorado demais para irem busca-la e Gwyn acabou tendo que fazer todo o trabalho sozinha. Sendo um Valquíria, com todo o seu treinamento, conseguiu derrubar um grão-senhor e um homem sozinha. E para a surpresa de todos menos de Rhys, Feyre e Azriel, mostrou seu poder de fogo e se libertou. E quando ela passou pelos corredores e pela porta da sala de reuniões onde eles estavam, dirigiu um olhar de tristeza para ele.

Quando suas sombras lhe disseram que Mor já tinha atravessado com as três para a Casa do Vento, Cass disse.

-Ela já sabe, sobre Eris. -Olhou para Azriel. -Nestha acabou de me dizer.

-Merda! -Rhys xingou baixo. -Por que ela já foi embora? Precisávamos conversar sobre tudo o que aconteceu na propriedade de Graysen...

-Deixem-na em paz, pelo menos por enquanto. Já não conseguimos liberta-la de lá, Gwyn fez isso sozinha, merece descansar na sua casa. Não vamos ficar pressionando.

-Azriel precisamos de informações, a guerra está vindo de novo...-Helion disse grave.

-Depois! Não vamos ser atacados durante pelo menos nas próximas horas. Ninguém vai interrogar Gwyn agora. Ela acabou de descobrir que Eris é seu pai, não acham que ela merece um tempo para pensar ao invés de ficar respondendo às perguntas de vocês? -Azriel disse com aquela voz ameaçadora que fazia qualquer inimigo morrer de medo.

-Az está certo, Gwyn deve estar muito mal. Amanhã falamos com ela. -Feyre lhe lançou um olhar de compreensão e Azriel agradeceria todos os dias por tê-la como sua grã-senhora, e como sua amiga.

O mestre-espião saiu sem dizer nada e voou sem rumo, buscando alguma coisa de errado, algum inimigo. Ficou de vigia por Velaris a noite toda, esfriando a cabeça e implorando aos deuses para que no dia seguinte Gwyn pudesse explicar tudo o que tinha acontecido e que eles pudessem resolver aquela merda toda.

Corte dos Sonhos e PesadelosOnde histórias criam vida. Descubra agora