União da Serra, RS
Capital Nacional da Fé Católica, assim a cidade era conhecida. Uma grande polêmica logo virou o maior assunto da cidade: A "mulher do padre".
Eles não foram casados, nem tão pouco tinham um caso, mas várias fofocas sobre ela corriam soltas na cidade. Como era possível uma mulher ter a audácia de seduzir um padre? Um dito "homem santo"! Era absurdo. Ninguém queria ouvir o lado dela, afinal, chamar um padre de mentiroso era uma grande blasfêmia.
A mulher se afastou da igreja, todos a julgavam, olhavam torto, só o que lhe sobrou foi o medo e a vergonha pelo ocorrido. Ao contrário do que muitos achavam, ela não era a "sedutora" que tentou atiçar o padre com desejos mundanos, muito pelo contrário, havia sido abusada por ele.
Ninguém acreditaria em sua palavra contra a do "homem santo". Um homem de Deus não faria tais coisas, já a pobre mulher com certeza era uma pecadora.
Por muitas vezes pensou em suicídio, mas uma coisa a conteve: Sua filha.
Maria Luísa, Malu, foi o fruto do abuso que sofreu. A pobre menina era filha de um padre, o que a fez ter ódio da igreja católica. Cresceu vendo a mãe se entupir de remédios, por vezes se culpava por ter nascido, mas sua mãe contestava:
— Sua existência é o único lado bom. Sem você, eu provavelmente não estaria mais viva.
Malu não sabia dizer se isso era mesmo um "lado bom". Aquilo que tinham não podia ser chamado de "vida", era uma tortura.
Moravam na área campestre, onde Malu pegou gosto por cuidar de cavalos, burros e mulas.
Tinha a pele branca, cabelos compridos marrons, como o pelo dos cavalos. Usava um lenço vermelho no pescoço, chapéu, botas, bombacha.
Preferia ficar com seus cavalos do que com as pessoas. Desde sempre aprendeu que os chamados "cidadão de bem" são as piores pessoas que existem.
Na escola, vários comentários surgiam a respeito de sua mãe, aos quais revidava com ódio. A diretora a chamava para conversar, Malu sempre de braços cruzados, emburrada. Ninguém queria saber o lado dela, era chamada de louca, cabeça quente, "cavala".
Sua mãe não comparecia as reuniões, era uma dependente química, várias vezes chegou perto de perder a guarda da menina, mas conseguia ficar com ela. Malu as vezes achava que sua mãe seria melhor sem ela. "Isso é falta de Deus", muitos comentavam. A garota odiava cada dia mais os religiosos que tentavam lhe empurrar suas doutrinas. Se aquele tal "Deus" fosse bom, não teria nascido filha de um padre, era só o que conseguia pensar.
Desde cedo aprendeu a cuidar da casa e se virar, sua mãe era a prioridade. A pobre mulher parecia estar com menos juízo a cada dia, Malu amadureceu mais rápido do que devia, não teve infância, virou uma "mãe" para a própria mãe. Foi com muito trabalho que a internou numa clínica de reabilitação, a visitava todos os dias depois da escola, os médicos já a conheciam:
— Boa tarde, Maria Luísa. — a recepcionista cumprimentava
— Corta o protocolo. E minha mãe?
— Está melhor. Lembre que é um passo de cada vez.
— Bando de lesmas. — disse irritada
— Nós conversamos sobre isso quando concordamos com a internação.
— Sempre vêm com a mesma história. Por que não me dizem logo que ela não tem jeito?
— Se pensássemos assim, ela não estaria aqui.
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Os Guardiões de Tupã
AdventureTupã, o criador de tudo e deus do Trovão, está em guerra com seu arqui-inimigo Anhangá, deus do submundo. Para encontrar o equilíbrio, os guardiões precisam ser convocados.