Os Guardiões de Tupã

Os sete espíritos

Manaus, Amazonas

Carol e Manoel adentraram a floresta para meditar, ele percebeu que ela estava um tanto alterada:

— Como... Como foi seu treino?

— Não espere que eu confie em você pra te contar. — ela disse num tom seco

— Eu... Eu sinto muito... Eu só estava...

— O pajé me disse para não julgar, mas sempre te vejo tímido, encolhido. Que tipo de poder alguém tão mole como você pode ter? 

— Eu... Bem, eu realmente prefiro não falar disso...

— Então como espera que eu fale algo sobre os meus poderes pra você?

Ele engoliu seco, ela tinha razão. Ao contrário de Beto que adorava sair espalhando sobre a própria vida e a família, percebeu que Iago e Carol eram muito mais fechados. Respirou fundo:

— A verdade é... O meu guardião é muito assustador... Me dá medo, sabe? Não é como se eu não quisesse falar sobre... Mas eu não sei o que dizer... Eu não espero que confie em mim tão rápido, eu não confio em mim mesmo...

A expressão de Carol mudou, já não era tão séria, parecia sentir pena. Suspirou.

— Eu não devia descontar minhas frustrações em você. Deve estar tão perdido quanto eu aqui. 

— A que se refere?

— Eu sempre tive Sara, e somente ela. Não tentei qualquer interação com vocês, e agora que ela está longe, eu simplesmente não sei como devia me comportar. Preferia ficar sozinha na floresta com animais do que conversando com você. Sem ofensas.

— Eu compreendo. — ele suspirou — Eu me acostumei a companhia de Beto como se fosse um irmão mais velho, embora ele tenha me dito que Iago também é gentil... Talvez só esteja cedo demais, acredito que teremos tempo de nos conhecermos melhor...

— Acho que tem razão. De qualquer forma, é preciso estar atento. 

Manoel sentiu que havia quebrado um pouco daquela resistência, quem sabe poderiam ser amigos.

Enquanto isso, Moangá falava para o rapaz de cabelos esverdeados a respeito da sereia Iara. Para a surpresa do rapaz, o pajé havia a conhecido pessoalmente:

— Com certeza é uma mulher encantadora. — dizia ele — Seu treino será a respeito de sentimentos. Sua voz é realmente bonita, mas como já deve saber, a emoção ajuda a conduzir a música de forma correta.

— E o que devo fazer?

— Primeiramente, se acalmar. Seu coração está cheio de rancor, desejo de vencer, pressa. Para atingir o auge dos seus poderes, deve ser mais calmo.

Iago levantou a sobrancelha, cruzou os braços:

— Como assim?

— Pesadelos do passado te atormentam, a vontade de vencer Japiim. Tudo isso tem que ser deixado de lado, precisa limpar sua mente e se concentrar na emoção da música. Com isso poderá ter mais controle no canto hipnótico. Após isso, te ensinarei como quebrar seu próprio encanto. Não vai querer correr o risco de deixar alguém nesse estado pra sempre, certo?

Se lembrou da primeira vez que fez em casa, com um de seus pais. Aquilo fazia muito tempo, quase não se lembrava mais. Sempre teve muito auxílio de Anhum, deus da música, Picê, deusa da poesia, Arapé, deusa da dança, Graçaí, deusa da eloquência, e Piná, deusa da simpatia. Elas nunca confiaram o bastante para falar sobre Japiim, e analisando seu comportamento, não poderia culpá-las. A convivência com Beto e os treinos com Juruti o ajudavam a relaxar sobre as águas.