Jurupari, deus e demônio

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Pousada Recanto da Grande Paz, GO

Manoel acompanhou Guaipira, deusa da história e dos acontecimentos, uma indígena com o cabelo amarrado como uma trança, carregava vários livros nas mãos e usava óculos, e Ceuci, deusa protetora das lavouras e moradias, uma indígena com longos cabelos negros e pinturas sobre seu corpo. Chegaram em uma pousada muito bonita, era cercada por diversas árvores.

— Essa é a Pousada Recanto da Grande Paz. — disse Guaipira — É um ótimo lugar para meditar e encontrar paz.

Manoel respirou fundo, sentiu o ar puro do lugar, então se sentou. Estava um pouco nervoso, não fazia ideia do que seria seu treinamento, na verdade, se sentia realmente deslocado em comparação aos outros.

— Não se preocupe. — Ceuci sorriu — Por hoje vamos apenas conversar.

— E-Está bem...

As duas se sentaram, Guaipira  pegava seus livros, folheava as páginas, parecia procurar algo. Manoel suava frio, entrelaçava os dedos das mãos, tentava olhar a paisagem, se concentrar em outras coisas, mas nada parecia o acalmar. Enfim Guaipira sorriu:

— Achei! — ela olhou pra ele — Não se preocupe, seu treinamento será mais psicólogico do que físico nesse primeiro momento. — ela parou, olhou o livro, respirou fundo, olhou de volta pra ele — Pra começar, você é diferente dos outros. Cada um deles se conectou com o guardião para poder entender seus próprios poderes e entender o que há no interior. Infelizmente, você não pode fazer isso.

— O que quer dizer?

— Que não queremos que se encontre com seu guardião. Isso pode ser perigoso demais para sua mente.

— Então o que eu faço?

— Por isso fui a escolhida. Eu fui instruída a te explicar desde o início a respeito do que você é. Antes de falar de seu guardião, preciso voltar atrás e falar daquele que o criou, que será aquele que você terá de enfrentar no futuro.

— O tal do juru... Juri... Jiru...

— Jurupari. — disse Guaipira — Você está destinado a enfrentá-lo, pois ele está com Anhangá. 

— Então esse... Ju...ru...pa...ri... — repetia devagar — É o responsável pelo meu guardião?

— Isso mesmo. Ouça bem: A história de uma mulher virgem que sentou na sombra de uma árvore do bem e do mal que tinham um fruto proibido. A mulher comeu o fruto, o suco dele escorreu por entre suas coxas, então engravidou. Seu povo se revoltou com a gravidez indesejada, o conselho dos anciões se reuniu e ela foi exilada da tribo.

— Que coisa horrível...

— A mulher se viu obrigada a se virar sozinha. Seu filho nasceu longe de tribo. Seu nome era Jurupari, "o filho do sol".

— Espera aí! — disse Manoel — Como assim? Ele não nasceu de uma fruta?

— Jurupari era um enviado do sol para trazer ordem aos homens. Com 7 dias de vida, já aparentava ter 10 anos. Era um rapaz muito sábio, voltou a aldeia para trazer paz e ordem para os homens, ficou conhecido como "O Legislador".

— Então ele era bom? — Manoel perguntou, confuso 

— Por um lado sim. — disse Ceuci, que esteve em silêncio até o momento — Ele espalhava palavras de sabedoria, foi o responsável por mudar a sociedade matriarcal para patriarcal. Esteve tão ocupado que se afastou de mim, a própria mãe.

— O quê? — Manoel caiu pra trás na cadeira — Por isso está aqui? Você é a mãe dele? Mas não é a deusa da agricultura?

— Isso foi depois. — disse ela — Meu filho era ocupado. Um dia, Jurupari fez o Cerimonial dos Homens, que era proibida a entrada de mulheres. Eu estava inconformada com essa nova visão de mundo, decidi invadir o lugar e espiar. Eu só queria ver meu filho e entender o que tanto pregava e revestido com a pompa de tuxaua, de líder.... Infelizmente, a punição para a mulher que entrasse lá era a morte.

Os Guardiões de TupãOnde histórias criam vida. Descubra agora