Em Nome do Pai

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União da Serra, Rio Grande do Sul

Chegaram à casa de Malu. Ela correu para o estábulo, precisava ter certeza de que seus cavalos estavam bem. Respirou aliviada, o pelo deles estava ótimo, bem cuidado. Contou para ter certeza de que não havia perdido nenhum. Não demorou para notarem sua presença, começaram a relinchar e trotar.

— Parecem felizes em te ver. — Bóris comentou

Ela não respondeu, mas também estava. Aqueles animais eram tudo pra ela. Começou a olhar em volta:

— E o guri fantasma?

Não demorou para aparecer. Negrinho do Pastoreio, o rapaz que em vida tinha sido escravo e teve a alma acolhida por Nossa Senhora Aparecida. Ainda trajava suas roupas meio rasgadas, o escapulário da santa em seu pescoço.

— Bem vindos de volta! — ele os cumprimentou

— Vejo que fez um bom trabalho, como me prometeu. — ela disse

— Onde... — Bóris começou, mas logo a garota lhe cutucou com o ombro, o fazendo lembrar que precisava abrir os "outros olhos" pra vê-lo — Ah, olá.

— Fico feliz em ter sido útil. — o rapaz sorria — Como foram de viagem?

— Melhor do que o esperado. — ela respondeu. Não tinha muita noção de quanto tempo havia passado fora. Foram meses com as deusas do fogo e mais meses em Fernando de Noronha tendo que lidar com mais fantasmas. — Eu agradeço por seus serviços, não sei se tenho que te pagar de alguma forma.

— Eu sou um espírito, não preciso de nenhum bem material. — ele riu — É um prazer cuidar desses equinos.

— Então se quiser pode ficar. — ela disse — Mas que seja escolha sua, não é mais escravo de ninguém.

— Como é? — ele ficou surpreso — Está falando sério?

— Não sei quando vou precisar sair de novo e não confiaria meus cavalos a mais ninguém. — ela concluiu.

Ele havia ficado realmente feliz.

— Muito obrigado!

Ela queria ficar mais um pouco em seu estábulo, mas tinha mais alguns assuntos pendentes.

— Bóris, preciso visitar minha mãe. Quer vir comigo?

Ele estava atônito com a pergunta:

— Você tem certeza?

— Eu vou precisar de ajuda pra convencê-la a fazer o que estou prestes a pedir. Você tem mais paciência do que eu.

— Acompanho sim, se é o que deseja.

Ela assentiu, entrou no estábulo e escolheu um de seus cavalos para montar, fazia muito tempo. A última vez que montou em algum animal era uma mula fantasma na Cacimba do Padre, praia de Fernando de Noronha. Sabia muito bem que podia correr até a clínica, pois sua velocidade era superior a de uma pessoa comum, mas precisava segurar as rédeas mais uma vez, cavalgar era relaxante. E além do mais, tinha um passageiro.

— Sobe aí. — disse ela — Eu ainda lembro o caminho.

Ele obedeceu, embora não tivesse muito costume. Se ajeitou atrás dela, ainda estava pensando em como se seguraria quando ela respondeu:

— Agarra na minha cintura.

Se lembrava de ter feito isso da última vez que andaram a cavalo juntos, mas era diferente agora. Ela revirou os olhos:

— Guri, a gente passou por mil coisas e eu até te beijei. Não venha me dizer que tá com vergonha de agarrar a minha cintura.

— Então não vou dizer.

Os Guardiões de TupãOnde histórias criam vida. Descubra agora